Para Eduardo Terra, pandemia mostrou que precisamos passar a estar confortáveis quando não temos controle sobre o que acontece
Uma das perguntas mais frequentes nas rodas de conversa (hoje em dia virtuais) é quando voltaremos à normalidade. Para Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), a resposta seria “nunca”, mas essa é a pergunta errada a se fazer. “Nos últimos anos, havia um sentimento de que era possível controlar o que acontecia. Discutíamos Inteligência Artificial, 5G, e aí aparece um vírus e vira nossas vidas do avesso”, diz.
Isso mostra que, na realidade, vivemos em um ambiente de incertezas cada vez maiores. “Precisamos nos perguntar como podemos aprender a navegar em ambientes incertos, que é uma competência cada vez mais importante para os negócios”, analisa. Em live realizada na tarde desta terça-feira (30/06), Terra disse que a pandemia acelerou uma série de movimentos que já se desenhavam e que, agora, viraram urgentes. “Já se fala em mundo Vuca [sigla para volátil, incerto, complexo e ambíguo, em inglês], por exemplo, há bastante tempo. E o fato é que estamos vivendo em um mundo que tem cada vez mais essas características”, afirma.
Para ele, então, o varejo precisa desenvolver uma cultura que abrace a volatilidade e a incerteza. Uma cultura que torne as empresas mais flexíveis e ágeis para lidar com rápidas transformações.
Também presente na live, Flavio Rocha, presidente do Conselho de Administração do Grupo Guararapes (controlador da rede de moda Riachuelo), acredita que o varejista de sucesso no futuro será aquele que entender que o controle, na realidade, está nas mãos dos clientes. “Ele é que define o quanto você tem que acelerar ou dar foco em alguma coisa”, diz. “Na Riachuelo, cobrávamos muito a aceleração das nossas iniciativas digitais, mas elas só aconteceram quando o cliente passou a demandar isso: quando a pandemia fez as lojas fecharem as portas”, afirma.
Em um momento como esse, é preciso estar atento ao movimento dos clientes e ser capaz de reagir rapidamente. O caso do Grupo Guararapes, que tem operações verticalizadas do tecido aos serviços financeiros, é um bom exemplo da flexibilidade necessária. Com uma estrutura logística que faz entregas diárias de produtos nas lojas, de forma bastante granular – o que foi vendido no dia anterior em cada ponto de venda -, a empresa conseguiu reagir rápido quando a demanda nas lojas físicas cessou e o e-commerce teve uma expansão de 500% nas vendas.
Além de passar a direcionar a logística para atender ao online, a empresa deu início a um projeto que estava em planejamento: o ship from store. “Hoje, usamos o estoque de dez lojas para a logística de última milha. Até agosto, todas as nossas 320 unidades estarão nesse modelo”, diz Rocha.
A ressignificação da loja física
Para Eduardo Terra, esse tipo de movimento realizado pela Riachuelo, em que a empresa usa a loja física como parte da estrutura de atendimento online, é um caminho inevitável para o varejo. “O modelo tradicional de loja, em que o vendedor fica esperando o cliente entrar para atender, não tem futuro. É a loja que precisa ir atrás do cliente, no digital, e fechar a venda online ou no PDV”, explica Terra. Para ele, a partir de agora a loja física será um templo da marca, equipado com produtos e serviços e que ativa o cliente no digital para fazer negócios da forma como o consumidor desejar.
Esse é um desafio para empresas de todos os setores, especialmente no franchising. “Em redes tradicionais, a mudança de cultura já é intensa. Em redes de franquias, há uma camada adicional, que é o franqueado, que tem poder de decisão sobre o que acontece em sua loja e é um sócio da rede”, explica o presidente da SBVC. Para ele, é preciso fazer com que o franqueado seja parte desse processo, remunerado pelas vendas atribuíveis à sua loja. “Em um ambiente omnichannel, o cliente pode comprar online e buscar em uma franquia, ou a última milha pode ser feita pela loja. Tudo isso precisa ser contemplado na remuneração da rede e também nas questões fiscais”, analisa.
Segundo o especialista, este período de pandemia está acelerando não só a digitalização dos consumidores, mas também a demanda por um posicionamento mais claro das empresas. “É preciso reinventar o negócio para ir atrás dos clientes, e isso passa por atender ao que o consumidor quer: marcas com quem ele possa se identificar, por meio de valores, cultura e posicionamento. Isso aumenta a complexidade do mercado e o risco de ser ‘cancelado’ caso dê uma escorregada, mas é absolutamente necessário para o varejo do futuro”, completa Terra.
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Fonte: Redação SBVC