Grupos como B2W, Magazine Luiza, Carrefour e Via Varejo começam a montar estruturas para fornecer serviços financeiros digitais ao consumidor final e a lojistas. Isso deve estabelecer uma disputa inédita entre varejistas e bancos tradicionais e digitais.
Esta nova área de competição no varejo on-line fica mais visível com a multiplicação de aplicativos que permitem pagar contas ou transferir dinheiro pelo celular. E tem como pano de fundo a busca de receita extra em negócios mais rentáveis.
A intenção das varejistas é oferecer serviços financeiros que se conectem com suas lojas on-line e, com isso, criar, em um único ambiente virtual, um grande shopping de serviços e produtos, dizem consultores. “O que se quer é que o cliente pague contas, faça transações financeiras e feche compras num único e grande ecossistema”, diz Roberto Wajnsztok, sócio da consultoria Origin5. “Isso pode resolver, em parte, um problema de conversão baixa na venda on-line no país [quando o consumidor entra no site, mas não conclui a compra]. E ainda deve gerar um volume maior de informações sobre o comportamento do consumidor, algo que vale ouro para as redes e impulsiona mais a venda de produtos e serviços”, diz o consultor.
Na semana passada, a Via Varejo, dona da Casas Bahia e Ponto Frio, anunciou acordo para comprar, em no máximo três anos, até 80% da startup de tecnologia Airfox. Há dois meses, a tecnologia da Airfox começou a ser testada em lojas da Casas Bahia.
O aplicativo permite que o cliente pague, pelo celular, o carnê da Casas Bahia. Também pode pagar boletos, e recarregar o celular e o cartão de transporte público. Até agora, são 10 mil usuários, uma base ainda pequena.
A Via Varejo poderá reproduzir iniciativas já tomadas pelo Grupo Pão de Açúcar, seu controlador. Este criou em 2017 o “Meu Desconto”, aplicativo para customizar promoções. “A empresa incorporará análises de dados e ofertas customizadas na reformulação de seu aplicativo [das redes da Via Varejo]”, disse, recentemente, Guilherme Assis, analista do Brasil Plural, após encontro com a direção da companhia.
A questão é que, na prática, hoje os serviços oferecidos pelas varejistas em geral rivalizam com qualquer aplicativo de banco, que muitas vezes faz operações básicas sem cobrar do cliente, como diz Wajnsztok. A “sacada”, diz ele, está em começar a montar uma estrutura mais “parruda” que traga tráfego de clientes ao aplicativo e, com um volume maior de usuários, desenvolva novos serviços, como seguros e linhas de empréstimos.
A Via Varejo, por exemplo, não descarta oferecer produtos de seguros em seus aplicativos futuramente, disse Felipe Negrão, diretor financeiro da empresa. “Parceria com alguma seguradora é algo que ainda será discutido”.
Duas outras redes, Carrefour e Magazine Luiza, devem anunciar novidades nos próximos meses. O Magazine Luiza irá lançar em outubro o seu sistema de pagamentos a lojistas de seu shopping virtual (marketplace), diz Roberto Bellissimo Rodrigues, seu diretor financeiro.
A estratégia do Magazine, apurou o Valor, também prevê que os clientes do seu cartão de crédito tenham contas digitais e sejam usuários dos futuros serviços do aplicativo da rede.
O Carrefour vai começar neste ano um projeto-piloto de pagamentos por meio do Carrefour Pay, aplicativo para pagamentos móveis (lançado na Europa no início do ano). Os primeiros testes começarão em postos de combustível e algumas lojas do Carrefour Express (de até 150 metros quadrados), disse Paula Cardoso, diretora executiva de clientes, serviços e transformação digital.
A B2W lançou há três meses o aplicativo Ame Digital. Por meio dele, o cliente abre uma conta digital e tem à disposição os serviços básicos (pagamento de contas, recargas). Também explora a estratégia do “cash back”, em que o cliente recebe 10% do valor gasto em compras feitas pelo aplicativo em créditos na conta digital. Nesse projeto da B2W, analistas têm mencionado que a Ame deve se tornar futuramente, quando ganhar volume em transações, um negócio separado da B2W. A empresa não confirma.
Algumas poucas redes vêm testando ferramentas mais usadas no exterior. O Mercado Livre começou a cadastrar lojas físicas para que clientes consigam fazer compras usando um código (o QR Code), usando o celular. Também neste ano, o Mercado Livre passou a oferecer crédito a lojistas através de seu site. “Foram liberados pouco mais de R$ 600 milhões em crédito desde início do ano”, disse Oliveira. A empresa está estudando estender as linhas de financiamento para consumidores.
Em relação à regulação, as varejistas precisam seguir exigências do Banco Central. A transferência de dinheiro, mesmo via aplicativo, precisa ser feita em ambiente regulado pela autoridade monetária.
Fonte: Valor Econômico