Acostumado a crescer mais que a média da economia brasileira ao longo das duas últimas décadas, o setor de franchising, apesar do esperado retrocesso dos resultados de 2020 em relação ao ano anterior, ainda tem muito a comemorar. O balanço consolidado divulgado ontem pela Associação Brasileira de Franchising (ABF), revelou que o segmento manteve sua curva de recuperação no 4º trimestre de 2020, se aproximando dos níveis pré-Covid-19. Ainda segundo o levantamento, o setor apurou receita apenas 1,8% menor no período, comparado ao 4º trimestre de 2019, que foi de R$ 54,966 bilhões para R$ 53,976 bilhões. PUBLICIDADE Considerando o desempenho do ano todo, porém, o impacto da pandemia foi maior, com o faturamento geral recuando quase três anos. Em 2017, o faturamento foi de R$ 163,319 bilhões. No ano passado, foi de R$ 167,187 bilhões, contra R$ 186,744 bilhões em 2019. Queda de 10,5% no último exercício. De acordo com o presidente-executivo da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra, os resultados do quarto trimestre foram impactados por um momento em que o Brasil tinha melhores resultados no combate à Covid-19 do que no período anterior e o clima de confiança ficava mais forte. “Para o franchising, que é ainda muito ligado ao ambiente físico, a reabertura do comércio naquela época foi muito importante. Agora isso começa a piorar novamente. Temos que ficar atentos a esse movimento para analisar os dados. Entre os fatores que impactam a macroeconomia podemos destacar como importantes nessa retomada: o auxílio emergencial, a recuperação de parte da renda da população e a recuperação dos índices de empregos formais”, explicou Terra. Para o presidente da ABF, André Friedheim, o fechamento dos shoppings e a queda dos índices de confiança do consumidor e do empresariado ao longo do ano se refletiram fortemente no setor. A mudança de hábitos do consumidor, principalmente nas áreas de entretenimento e turismo, foram outros fatores importantes. “O franchising aprendeu rápido durante a pandemia, criando novos formatos, novos canais de venda, integrando os franqueados nesse novo formato. Por outro lado, segmentos importantes tiveram desempenhos muito diferentes entre si. Entre os que tiveram os resultados mais expressivos estão o de ‘casa e construção’, com 25,6% em faturamento; e ‘saúde, beleza e bem-estar’, com 5,4%, na comparação entre o quarto e terceiro trimestres do ano passado. Já entre os resultados negativos o destaque foi para o setor de ‘hotelaria e turismo’, que regrediu 39,2% em faturamento; e ‘entretenimento e lazer’, com -15,5%”, pontuou Friedheim. O segmento de alimentação, que é o mais importante para o setor de franquias, também sofreu bastante, mas conseguiu resistir e manter a representatividade. No 4º trimestre, registrou uma queda de 5%. O subsegmento ‘Bares, Restaurantes e Padarias’ registrou um desempenho de -9,9% em seu faturamento no período, efeito mais severo do que o resultado total de Alimentação registrado. Segundo o consultor e ex-presidente do Grupo Cherto, Marcelo Cherto, a inteligência coletiva característica do franchising foi o principal fator que impediu que os resultados do sistema não fossem ainda piores. “Todo brasileiro sabe ‘se virar’ e quando junta mais pessoas pensando sobre a mesma coisa, a gente aprende rápido e se torna muito criativo. No segmento de alimentação houve uma mudança de hábito do consumidor que adotou o delivery e nós tínhamos os aplicativos operando certo, no momento certo. Além disso, tivemos alguns franqueadores que se adaptaram muito rapidamente e foram imitados pelos outros. Tivemos queda, obviamente, mas era para ser muito maior se não fosse a capacidade de adaptação que o sistema de franchising brasileiro tem”, avaliou Cherto. Os resultados de 2020 divulgados ontem pela Associação Brasileira de Franchising (ABF) mostraram que, apesar de resiliente, o setor não escapou das amarguras trazidas pela pandemia. O número de empregos diretos gerados passou de 1,36 milhão para 1,26 milhão, queda 7,3% entre o penúltimo e último semestre de 2020. A diminuição está ligada ao fraco desempenho da economia como um todo e também à concentração do sistema, que encarou a diminuição no número de marcas franqueadoras e também no número de unidades franqueadas. O total de franqueadoras caiu 8,6% (de 2.918, em 2019, para 2.668, em 2020). Já o saldo entre unidades abertas e fechadas ficou negativo em 2,6% no ano passado. O número de repasses subiu 2,5%, contra 2,3% no ano anterior. A concentração do mercado, porém, pode ser analisada positivamente, segundo o ex-presidente do Grupo Cherto, Marcelo Cherto. “Temos franqueadores demais no Brasil, pra franqueado de menos. Sabemos que franquia requer escala. Muita gente se lança como franqueadora sem estar devidamente preparada. Passamos agora por um processo de maior profissionalização das franqueadoras. Sou favorável ao repasse para manter a rede viva. A questão é a quem repassar. Tem que ser para quem vai ter condições de conduzir aquele negócio. Assistimos à consolidação das redes com o aumento dos multifranqueados. Isso é normal e salutar”, analisou Cherto. Nesse processo, a relação de franqueados por marca no Brasil também vem crescendo. Atualmente, são 59 unidades por franqueadora. A média é ainda distante da norte-americana, por exemplo, que fica em torno de 300 unidades/marca, mas demonstra um amadurecimento do mercado nacional. Embora a crise seja global, as marcas brasileiras continuaram presentes no exterior, mantendo o número de 163 operações em 106 países, tendo como principais destinos Estados Unidos (61), Portugal (41), Paraguai (36), e Bolívia (24). Do outro lado, notícias da retirada de algumas marcas do País incomodaram o mercado, mas o resultado geral também foi satisfatório. Entre 2019 e 2020, houve uma diminuição de 214 para 205 marcas (queda de 4,3%). “A internacionalização das redes é extremamente importante. É um risco focar em um só país. Mas não dá para fazer a internacionalização de qualquer jeito, tem que buscar os parceiros certos, entender o consumo e quais adaptações devem ser feitas. Vejo a internacionalização como um caminho que as empresas brasileiras deveriam perseguir. E começar pelo mais fácil: Portugal e os nossos vizinhos”, alertou o ex-presidente do Grupo Cherto. “Devemos sempre que lembrar que o Brasil é um país grande e atrativo para a expansão de qualquer marca do mundo. Temos como dificultadores o câmbio e o ambiente de negócios. Apesar de o governo ter uma agenda liberal e de reformas, alguns movimentos têm afastado investimentos internacionais”, completou o presidente-executivo da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra. A pesquisa trimestral realizada pela Associação Brasileira de Franchising (ABF) trouxe, ainda, as projeções para 2021. Apesar do cenário complexo e incerto, marcado pelo início lento do Plano Nacional de Vacinação contra a Covid-19, as franqueadoras consultadas se mostraram otimistas. A expectativa para 2021 é de um faturamento 8% maior, 5% mais unidades, avanço de 2% em novas redes e uma alta de 5% no número de empregos diretos gerados pelo setor em 2021. Segundo o estudo, para 64% dos respondentes, o crescimento será superior a 10%; para 19% será entre 5% a 10%. Para o presidente da ABF, André Friedheim, permanecendo as bases para a retomada segura das atividades econômicas a partir deste ano, o setor de franquias levará cerca de dois anos e meio para retomar os patamares pré-Covid-19. “É preciso lembrar que a pesquisa foi feita em dezembro, quando não estávamos sob ameaça de um novo lockdown. O desempenho do franchising está intimamente ligado ao grau de confiança do empresário e também do consumidor”, ressaltou Friedheim. Maiores franqueadoras Como de costume, o estudo também trouxe as 50 maiores franqueadoras brasileiras (associadas à ABF) e, como novidade, as 10 maiores microfranquias nacionais. Entre as gigantes, o primeiro posto continuou com O Boticário, com 3.620 unidades. Na sequência vem o McDonald’s, repetindo a vice-liderança, com 2.567 operações de franquia. Já a Cacau Show subiu uma posição, alcançando o 3º lugar na lista, com 2.371 unidades. Neste ano, passaram a integrar as Top 10 três novas redes: Óticas Carol, que subiu da 11ª para a 8ª posição, com 1.394 unidades; Seguralta – Bolsa de Seguros, do 12º para o 9º lugar, com 1.325, e Burger King, que avançou do 14º para o 10º lugar, passando a integrar o grupo, com 1.302 franquias, e apresentando a maior variação, com 8% mais unidades entre 2019 e 2020. A mineira melhor ranqueada é a Help! Loja de Crédito (parte do Grupo BMG), que passou do 24º para o 19º lugar (variando de 700 para 855 unidades), seguida pela Localiza Hertz, que caiu do 29º para o 30º lugar, mesmo subindo de 522 para 528 unidades (crescimento de 1%). No rol das maiores microfranquias estão nos três primeiros lugares: Pit Stop Skol, com 1.866 unidades; Kumon, com 1585; e Aqio, com 1036 unidades.
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