Um mês após uma inesperada troca de comando, a ordem na Natura é voltar às origens. A fabricante de cosméticos, que abriu suas primeiras lojas em 2016, agora se empenha para mostrar que o exército de revendedoras, que responde pela maioria esmagadora de suas vendas, não será deixado de lado. O novo presidente da empresa, João Paulo Ferreira, reforçou no Natura Day, evento em que a apresenta seus projetos a investidores, que a venda de porta em porta continuará a ser o centro da estratégia da companhia.
Essa apreensão se traduz em números. No primeiro semestre, o total de consultoras da empresa caiu 3,4% em relação ao mesmo período do ano passado. A companhia argumenta que a queda é pequena. No entanto, sua principal rival em vendas diretas, a Avon, anunciou a maior captação de consultoras de sua história.
A empresa americana ampliou seu time de revendedoras em 220 mil pessoas só em setembro e outubro. No terceiro trimestre, após várias quedas, as vendas da Avon subiram 14% em relação a 2015 – as receitas da Natura no País caíram 7%, na mesma comparação.
A retração do total de consultoras e das vendas têm origem em outro fator: o preço dos produtos, que subiu, em média, 9% no primeiro semestre. Como consequência, a Natura, que já praticava valores mais altos do que concorrentes como O Boticário e Avon, viu essa diferença aumentar, uma vez que os rivais seguraram reajustes em 2016. A expectativa é de revisão de preços e mix de produtos, segundo uma fonte próxima à empresa.
À frente do Natura Day, na quinta-feira passada, Ferreira, funcionário de carreira da companhia e nome de confiança dos acionistas, passou a mensagem de que o grupo deverá focar na retomada das consultoras. As lojas físicas, que saíram do papel sob a gestão de Roberto Lima, que ficou pouco mais de dois anos no comando, vão aumentar, mas não é a estratégia principal.
O total de lojas da Natura, por enquanto, se resume a cinco unidades em São Paulo e “outras dezenas” deverão ser abertas nos próximos anos, segundo a mesma fonte. Já o plano de maior internacionalização não está entre as prioridades.
Procurada pela reportagem, a Natura confirmou que existe a intenção de segurar preços e focar em itens mais baratos. “Passamos por um momento em que os consumidores intensificaram a busca por produtos de preços mais baixos e, diante desse cenário, já ajustamos nossas promoções e mix de produtos”, informou a assessoria de imprensa da companhia.
Por anos considerada uma empresa focada em inovação, a Natura agora quer ser inserida no mundo digital. A estratégia multicanal da companhia de cosméticos, que também inclui a venda por e-commerce, visa a segmentar os públicos por faixa de renda e idade.
O público-alvo das lojas, que têm aproximadamente 40% do portfólio vendido no porta a porta e se concentra em itens de experimentação, como maquiagem e cremes, são os jovens das classes A e B. A ordem é que a massa de consumidores fique nas mãos das consultoras. “No nosso plano estratégico, esse é o horizonte de longo prazo para Brasil e América Latina”, diz uma fonte ligada à Natura.
Apesar do renovado discurso da Natura, o analista Guilherme Assis, do banco Brasil Plural, disse, em relatório, que não vê melhoras significativas para a empresa em 2017.
“Os resultados recentes apontam para uma recuperação só de longo prazo”. No entanto, os ares de mudança com a troca de gestão, embora ainda não tenha surtido efeitos práticos, já fazem a diferença. “O time daqui se empolgou porque sabem que alguém de dentro foi promovido.”