28/01/2016 às 05h00
Por Rodrigo Polito | Do Rio
Quase três anos após ter sido conectada
ao Sistema Interligado Nacional (SIN), Manaus terá este ano a regularização de
seu primeiro consumidor livre de
energia. Mais do que um simples negócio,
o ingresso do shopping Ponta Negra ao
ambiente de contratação tem potencial
para desencadear um movimento de
migração em massa de grandes
consumidores da capital do Amazonas
para o mercado livre.
Prevista para ser concluída em abril, a migração do shopping está sendo feita
pelas comercializadoras Compass EIG e Sustenta Energia, da JHSF
Participações. O centro comercial firmará um contrato de aproximadamente
três anos de duração. Mas uma parte da demanda do estabelecimento será
negociada de forma diferente. A ideia é fechar novos contratos, aproveitando
o viés de baixa de preço da energia no mercado livre.
“O preço spot [de energia] está no piso há duas semanas e achamos que essa
tendência vai se repetir ao longo de fevereiro. A hidrologia está favorável, o
consumo está baixo e temos um volume de oferta maior. Essa conjunção de
fatores está fazendo com que o preço continue baixo e está influenciando a
curva de preços no mercado livre”, afirmou Marcelo Parodi, sóciodiretor da
Compass Energia. Segundo ele, as comercializadoras estão em conversas com
novos clientes.
“Há todo o polo eletroeletrônico e as fábricas de motocicletas. Há todo um
conjunto de empresas com demanda razoável. Estamos falando com outras
empresas. E o interesse tem sido grande principalmente nesse momento, em
que falamos da necessidade de redução de custos, da situação econômica
bastante delicada do país e do cenário de tarifa cativa [das distribuidoras]
alta”, disse.
A capital do Amazonas pode ser considerada um mercado promissor para a
migração ao mercado livre. Na região está localizada a Zona Franca de
Manaus, que abriga cerca de 700 indústrias. No total, a Amazonas Energia,
distribuidora controlada pela Eletrobras que atende o Estado, abastece mais
de 3 mil indústrias, de diferentes portes.
Um motivo de estímulo para a migração foi a recente decisão da Justiça de
aplicar o reajuste tarifário aprovado pela Agência Nacional de Energia
Elétrica (Aneel) para a Amazonas Energia, em 2015 Com isso, os
consumidores atendidos em média e alta tensão, onde estão os clientes
potencialmente livres, terão um aumento na conta de luz de 42,55%.
Segundo o diretor da Compass, o Brasil vive hoje uma segunda onda de
migração de empresas para o mercado livre. O primeiro ocorreu por volta de
2004, quando havia sobra de energia e baixa demanda, fruto da queda
compulsória do consumo, oriunda do racionamento ocorrido entre 2001 e
2002.
Esse cenário é parecido com o de hoje, devido à melhora do regime
hidrológico e à queda do consumo provocada pela retração da economia do
país. Além disso, há outros fatores que contribuem para a nova onda de
migração: o realismo tarifário aplicado em 2015, que fez as tarifas das
distribuidoras aumentarem mais de 50%, em média, e as novas regras que
permitem que consumidores de menor porte, com demanda entre 0,5
megawatts (MW) e 3 MW, possam se transferir para o mercado livre, desde
que consumam energia de fontes incentivadas (eólicas, térmicas a biomassa e
pequenas centrais hidrelétrica). É nessa regra que se enquadra o Ponta
Negra.
De acordo com Parodi, as empresas que estão migrando para o mercado livre
conseguem, em alguns casos, economia no custo de energia de 20% a 30%,
em relação às tarifas do mercado cativo. Somente a Compass prevê dobrar a
carteira de clientes com os processos de migração que está coordenando no
momento.
A retomada da migração de consumidores para o mercado livre foi
antecipada pelo Valor, em dezembro. Na ocasião, a Associação Brasileira
dos Comercializadores de Energia (Abraceel) havia informado que cerca de
700 empresas estavam em processo de migração.
Na terçafeira, a entidade apresentará ao ministro de Minas e Energia,
Eduardo Braga, proposta de mudança na regulação para permitir o livre
acesso ao mercado livre para consumidores industriais de qualquer porte.
Atualmente, apenas 15 mil das 330 mil indústrias do país estão aptas, por lei,
a acessar o mercado livre.
Valor Econômico – SP