14 de Outubro de 2015 12:00
Por Marcos Caetano
Eu gostaria de propor um exercício definitivo para sabermos se as nossas vidas e, por consequência, as nossas carreiras estão caminhando na direção certa. O exercício é bem simples e consiste em responder a uma única questão: Como ficaríamos se, de repente, fosse retirado do nosso nome o sobrenome corporativo? Não sei se essa pergunta ficou clara. Talvez não. E é por isso que eu acredito que deva, antes de qualquer outra coisa, explicar melhor o que é um sobrenome corporativo.
Um sobrenome corporativo é algo fácil de identificar, até porque muitas das pessoas que o possuem fazem questão de ostentá-lo, mesmo nas mais impensadas ocasiões. Quem nunca topou num casamento com um sujeito que se apresenta assim: Tudo bem? Eu sou o Fulano da IBM. Oi? Como assim? Estamos num casamento ou participando de uma reunião de negócios? Por que diabos o convidado achou importante se apresentar dessa maneira? O nome de família dele é IBM? Eu nunca ouvi falar numa família IBM. Seria de origem sueca? Grega? Árabe? Outro dia topei com uma Adriana do Google. Sobrenome esquisito… O que leva as pessoas a agirem dessa forma? Quais as insondáveis razões que fazem com que um outrora orgulhoso Cardoso, um honrado Oliveira e um simpático Silva decidam adotar um sobrenome Bradesco, Facebook ou Pfizer?
A verdade é que não é difícil explicar o comportamento. Reflitam comigo: as pulseirinhas vips chegam com muito mais facilidade para quem faz parte de uma das poderosas famílias empresariais do que para o pobre de um Pinheiro, um Nunes ou um Fonseca. O mesmo se aplica a convites para almoços no Fasano, jantares no DOM, viagens para Cannes e outros mimos. Tente ganhar um grande prêmio como anunciante do ano, profissional de marketing do ano, liderança do ano ou qualquer coisa por estilo com o sobrenome Jatobá. Sem chance, amigo. Nem se o seu sobrenome fosse Rockefeller. Para ganhar esses prêmios, o cara tem de ter sobrenome de montadora, de empresa de telefonia, de banco, de gigante do varejo. Assim é a vida e é por isso que tantos profissionais, alguns até verdadeiramente talentosos, preferem se apresentar com o sobrenome PJ. Eles abrem portas. Alguns simplesmente arrombam portas.
Entretanto, o que precisamos entender é que, embora adotemos sobrenomes corporativos, nós não somos esses sobrenomes. Eu não sou o Fulano da General Motors eu estou o Fulano da General Motors. E só vou saber a minha verdadeira dimensão, o meu real tamanho, o tanto que as pessoas realmente gostam de mim, o quanto de fato sou brilhante e se sou mesmo relevante no dia em que deixar de usar meu sobrenome de marca. E, feitas as devidas explicações, acho que este é o momento de voltarmos à pergunta do primeiro parágrafo: Como ficaríamos se, de repente, fosse retirado do nosso nome o sobrenome corporativo?
Pode não parecer, mas a resposta a essa pergunta é decisiva para a trajetória de uma pessoa que escolheu trabalhar no mundo corporativo (embora o conceito se aplique a outros campos profissionais, já que também temos o Fulano da Filarmônica de Viena, o Beltrano da Bienal de Veneza e o Dr. Cicrano do Einstein). Eu conheço muitas pessoas que ficaram absolutamente transtornadas ao perder seus sobrenomes corporativos. Casos de depressão, de revolta, de perda de autoestima e até do sentimento de identidade. Um antigo chefe, dos tempos em que trabalhei em uma grande corporação no Rio de Janeiro, certa vez se queixou: Parece mentira, mas o Fulano da agência Tal todo ano mandava uma cesta de café da manhã no meu aniversário. Agora que eu saí da empresa não recebo nem um telefonema. Meu comentário: Amigo, a cesta de café não era para você, mas para o seu sobrenome corporativo.
A essa altura, alguns poderão dizer: Ora, mas eu sou um profissional de sucesso. Sou imprescindível. Jamais perderei meu sobrenome de marca. Não é verdade. Todos perderão. Esse dia chegará para cada um de nós. Alguns serão demitidos, outros passarão por um processo de fusão ou aquisição, outros mudarão de ramo ou de projeto de carreira e todos, absolutamente todos, se aposentarão. É por isso que já vi a depressão pela perda do sobrenome se manifestar até em fundadores de empresas de enorme sucesso, logo após vendê-las. Reparem: os caras ficaram riquíssimos, mas perderam o sobrenome e, consequentemente, entraram em parafuso. É por isso que muitos empresários continuam abrindo e reabrindo empresas, mesmo depois de já terem ganhado todo o dinheiro com o qual sonharam na vida e mais um pouco. Não é pelo dinheiro, é pelo sobrenome corporativo.
Felizes daqueles que mesmo após abdicarem do sobrenome PJ continuam sendo admirados e respeitados pelos colegas de profissão. Se as pessoas continuarem a convidá-lo para debates, eventos, aconselhamento, coaching e networking mesmo sem que você ostente um sobrenome S/A, isso significa que você conquistou o tesouro da relevância. Porque troféus de bronze e cristal podem ser conquistados por todo tipo de profissional que tenha um lustroso sobrenome corporativo mas troféus de respeito, honra e admiração são privilégios de pessoas que conseguiram ir além desses sobrenomes fugazes.
Marcos Caetano é sócio global da Bruswick Group LLC e escreveu na edição 1681 de Meio & Mensagem, veiculada no dia 12 de outubro de 2015.
Meio e Mensagem on-line – SP