26/08/2015 às 05h00
Por Angela Klinke
Qual shopping center estaria disposto a abrir mão de quiosques nos corredores para aliviar a sensação de pressão sobre o consumidor? Ou qual companhia aérea estaria ansiosa para investir num atendimento customizado e promover um engajamento de verdade? “Enquanto a economia crescia, as empresas acreditavam na estratégia do gnu, ou seja, para onde um consumidor olhasse todos os outros iriam olhar. Agora que a situação ficou mais complexa, elas precisam digerir que não existe público, mas cada pessoa”, avalia Luis Rasquilha, CEO da Inova Consulting e Business School.
Pressionadas por metas, as empresas “80% do tempo olham para o passado, pensam pelo retrovisor, comparando com o que já fizeram; 15% dão uma olhadinha de lado para a concorrência e só 5% prestam atenção no caminho à sua frente. Enquanto isso, o consumidor faz o oposto. Ele está focado no futuro, na inovação”.
Por isso, Rasquilha trabalha na consolidação de um estudo para guiar os próximos dez anos. Nossa! E dá para pensar uma década? “É claro que pode haver atualizações, mas as linhas mestras estão ali. E para cada cliente traduzimos as tendências em ações que precisam ser implantadas.” O dossiê está dividido em três partes: as megatendências que vão impactar qualquer negócio até 2025, as tendências de relacionamento divididas em seis grupos de 31 comportamentos que podem ser pinçadas para cada companhia ou setor e as tendências que vão influenciar internamente as empresas, na humanização do ambiente de trabalho.
Por exemplo, uma megatendência como “ambiente e alterações climáticas” é transversal a qualquer área, mas pode pesar mais ou menos neste momento, em função do posicionamento da empresa. Já “globalização e a conectividade permanente” não poupam ninguém. “Estamos surfando na onda da conectividade agora. Enquanto a valorização da economia social, por exemplo, vai estar no auge em 2020. O que significa que quem ainda pensa no mundo como online e offline já está no prejuízo. E quem está incorporando soluções sustentáveis desde já pode ter uma vantagem. Desde que não comece só por uma estratégia de marketing. Se não for para jogar limpo, não jogue.”
Outra megatendência ressaltada é a do envelhecimento populacional e das relações inter-geracionais. “Os conflitos podem aumentar. É, por exemplo, o neto que briga com o avô para não gastar tanta água.” Há entre os mais jovens uma culpabilização das gerações anteriores por, digamos, entregarem o planeta nestas condições precárias. E que se torna visível também na “disputa” entre bicicleta e carro.
Interessante percorrer o mapa da Inova e perceber que não há indicadores de valorização do status ou da diferenciação social. Dentro dessa “previsão” para a próxima década, os atributos tradicionais do luxo deixam de fazer sentido.
Não há mais o reconhecimento do intangível num objeto. Nem mesmo nas tiragens limitadas feitas com matérias-primas raras, porque podem acabar se transformando numa armadilha. “Há outros complicadores no processo. Não é mais aceitável ter uma bolsa de couro de crocodilo caríssima quando os animais são tratados com crueldade.” O autêntico se torna mais importante que o exclusivo.
Para Rasquilha, é mais significativo que o luxo trabalhe pessoa a pessoa, como se dá com a comunicação no meio digital. Apostando na radicalização da customização, por exemplo. Ou ainda valorizando as experiências, claro, mas não mais dentro do contexto “Eu vi um pôr do sol em Istambul tomando champagne safrado e você não viu”. A vivência proporcionada pode funcionar como uma história para ser deixada como um legado. Ou seja, a fronteira entre experiência e memória. Por sinal, duas tendências destacadas no estudo dizem respeito às origens, às raízes e à nostalgia.
Uma das tendências emergentes de comportamento é a da instantaneidade e do imediatismo. Dentro das salas de aula das universidades, os alunos fotografam a lousa e gravam a aula. Pedem até para que a prova passe a ser oral porque não sabem mais escrever à mão. Querem atalhos que a “indústria de educação” terá de implantar. Este sentimento de urgência deveria incentivar as empresas a antecipar soluções antes que se tornem um problema. Os serviços de atendimento, desta forma, não podem mais se restringir ao horário comercial porque o consumidor precisa de ajuda antes de sair para o trabalho. Ou no fim de semana. O ideal seria que estivessem sempre disponíveis para evitar o desagrado, mas, por enquanto, já seria reconfortante ouvir “Eu vou estar cancelando seu serviço imediatamente, senhora”.
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Valor Econômico – SP