21/05/2015 às 05h00
Por Camila Maia e Daniela Meibak | De São Paulo
O setor industrial conseguiu melhorar, com corte de custos e despesas, o desempenho operacional no primeiro trimestre, apesar do desaquecimento da economia e a desvalorização cambial. Um levantamento feito pelo Valor Data mostrou que as 92 empresas do setor industrial tiveram receita líquida de R$ 124,27 bilhões nos primeiros três meses do ano, alta de 8,7% na comparação anual. Ao mesmo tempo, o lucro operacional avançou 9,6%, para R$ 14,39 bilhões, indicando que houve um controle mais forte dos custos e das despesas. Essas medidas ajudaram a minimizar os problemas causados pela demanda menor, que prejudicou o faturamento da indústria de transformação, assim como as despesas financeiras, que foram significativamente maiores, devido à desvalorização cambial. Mesmo assim, os dois fatores corroeram a última linha do balanço dessas companhias. O lucro líquido das empresas da indústria de transformação somou R$ 2,90 bilhões no trimestre, queda de 56% na comparação anual. O resultado financeiro negativo quase triplicou, para R$ 11,66 bilhões, e foi um dos responsáveis pela deterioração do lucro. O efeito da variação cambial na despesa financeira cresceu mais de 8 vezes, para uma perda de R$ 18,16 bilhões. Com os esforços implementados, as empresas industriais conseguiram evitar uma queda mais drástica da rentabilidade (lucro líquido comparado ao patrimônio), que caiu de 9,4% para 8,5% no período. Numa amostra geral com 253 empresas de capital aberto não financeiras, a rentabilidade despenca de 6,8% para 0,9%. No mesmo período, a rentabilidade sobre o patrimônio líquido dos bancos, que sofrem com a desaceleração da economia com crédito, mas compensam em ganhos com tesouraria, subiu de 16,4% nos três meses iniciais do ano passado para 16,7% neste ano maior taxa em um período de três anos. Nesse intervalo, a rentabilidade patrimonial da indústria de transformação saiu de 7,6% para 8,5%, tendo atingido seu maior patamar no segundo trimestre de 2014, de 10,6%. No grupo da indústria de transformação foram excluídos os resultados de Vale e Petrobras, em razão das suas atividades diversificadas na mineração e na logística e distribuição dos seus produtos. Dentro da indústria, as companhias que tiveram os melhores desempenhos foram as que conseguiram cortar custos e despesas, além daquelas que aumentaram a participação fora do Brasil. A margem operacional (medida pela relação entre receita de vendas e lucro antes de impostos e tributos) dessas empresas subiu 0,1 ponto percentual no período, chegando a 11,6%. A fabricante da máquinas e equipamentos WEG é um exemplo de companhia que permaneceu resiliente mesmo com o cenário de crise, porque a maior parte do faturamento da companhia vem do mercado externo. No primeiro trimestre o lucro líquido ficou 20% maior e a receita líquida cresceu 19,4%. Segundo o Itaú BBA, a companhia conseguiu encontrar espaço no mercado externo para ganhos de participação e para buscar portfólio ainda maior de produtos, dadas as recentes aquisições na África do Sul e Colômbia e as melhoras de margens vindas da integração de operações, especialmente na China e no México. Outro destaque foi a metalúrgica Tupy, que dobrou seu lucro no trimestre. A empresa compensou a menor demanda no mercado doméstico com crescimento de receita no exterior, onde concentra 77% de suas vendas, sem contar a redução nos custos com matériasprimas e ganhos com operações financeiras. Mario Bernardes Junior, analista de indústria do BB Investimentos, destaca a Metal Leve por ter mostrado piora no volume nos meses de janeiro, fevereiro e março, ao mesmo tempo em que conseguiu elevar a margem operacional. “Em períodos de ciclos econômicos mais desaquecidos, naturalmente há queda de demanda e de receita. Ficou claro para os investidores que, por mais que o cenário esteja desafiador, as empresas estão fazendo a parte delas”, comentou o analista. Segundo Bernandes Junior, “as empresas se prepararam para um cenário mais adverso, com ajustes de custos e despesas feitos ao longo do ano passado. O trimestre deixou claro que as companhias estão eficientes”. Mas nem todas conseguiram escapar do aperto. A Randon, de implementos rodoviários, e a Romi, de máquinas, apresentaram os piores números do segmento. A primeira teve queda de 99% no lucro no trimestre, com redução das receitas no Brasil e nas exportações, baixa escala de produção. Após a publicação do balanço da Romi, o seu presidente, Luiz Cassiano Rosolen, classificou 2015 como um ano de demanda deprimida. Segundo ele, existe uma estrutura de custos fixos que não pode ser alterada, sob o risco de inviabilizar a capacidade da companhia de responder rapidamente ao mercado com uma reação quando a economia retomar. Mesmo com os problemas, o desempenho da indústria conseguiu ser melhor no trimestre em comparação com o resultado do grupo formado por todas as 253 empresas de capital aberto. Juntas, elas somaram um lucro líquido de R$ 7,29 bilhões, 76% menor que o apurado nos primeiros três meses de 2014, enquanto a receita líquida cresceu 4,3%, para R$ 391,12 bilhões. O resultado financeiro veio negativo em R$ 41,50 bilhões, com despesas financeiras de R$ 81,82 bilhões. O peso da variação cambial nas despesas financeiras foi negativo em R$ 45,91 bilhões, 9 vezes maior que os R$ 4,98 bilhões apurados no mesmo intervalo do ano passado. Ao mesmo tempo, os indicadores operacionais mostraram desempenho pior em relação à amostra que só considera a indústria de transformação. Houve queda de 0,4 ponto percentual na margem operacional, antes do resultado financeiro e dos tributos. Esse resultado foi fortemente influenciado pela Vale, que registrou um prejuízo de R$ 9,5 bilhões, refletindo a desvalorização cambial e a queda dos preços do minério de ferro dois fatores determinantes para a perda bilionária da mineradora. Nos três primeiros meses do ano, o real caiu 21% ante o dólar e, na média trimestral, a depreciação foi de 13%. Houve impacto principalmente na diferença da dívida denominada em dólar e os ativos sob a mesma condição, que levou a uma perda de US$ 3,02 bilhões no primeiro trimestre. Outros US$ 1,26 bilhão em perdas não recorrentes vieram da marcação a mercado do valor e liquidação de swaps cambiais de real e outras moedas para o dólar americano.
Valor Econômico – SP