07/05/2015 às 05h00
Por João José Oliveira | De São Paulo
As empresas que administram programas de fidelidade no Brasil ignoram a crise econômica, com aumento de lucro e receita e planos de expansão agressivos. Enquanto as duas companhias do setor cotadas em bolsa, Multiplus e Smiles controladas respectivamente pelas aéreas TAM e Gol , registraram no primeiro trimestre faturamento 25,7% maior que o apurado um ano antes, atingindo a marca de R$ 1 bilhão, as concorrentes Dotz, LTM e Netpoints anunciam investimentos. E ainda há a novata Livelo, que chega em outubro, resultado de uma sociedade entre os gigantes Banco do Brasil e Bradesco. Somadas, Smiles e Multiplus tiveram, nos primeiros três meses de 2015, um lucro operacional 21% superior ao de igual período do ano passado. O lucro líquido das empresas engordou 11%, beirando R$ 170 milhões. Uma parte desse crescimento é explicado por fatores conjunturais, como o câmbio. Multiplus e Smiles registram receita quando os participantes de seus programas trocam seus pontos por passagens aéreas, produtos ou serviços. Como os pontos são cotados em dólar, a valorização da moeda infla a receita. O mercado de fidelidade também cresce a taxas altas porque é relativamente pouco explorado no Brasil. Segundo cálculos da LTM, o setor movimenta cerca de R$ 11 bilhões por ano no país, mas captura menos de 20% do consumo nas praças em que está presente. Isso significa que uma parcela ainda pequena dos consumidores está atenta ao acúmulo de pontos e à possibilidade de obter descontos e outras vantagens ao comprar em determinados estabelecimentos. “Em mercados maduros, como o canadense, por exemplo, essa taxa [de captura] chega a 80%”, diz Emerson Moreira, presidente da LTM, que opera programas de fidelidade de uma centena de empresas, incluindo Cielo, Shell e Nestlé com 6 milhões de participantes. Só no primeiro trimestre deste ano, o número de participantes dos programas Smiles e Multiplus subiu 10,4%, para 23,4 milhões. A migração do uso de dinheiro e cheque para cartões de crédito principal instrumento por meio do qual os participantes de programas de fidelidade acumulam pontos é um dos impulsionadores desse avanço. “Mesmo em conjuntura econômica adversa, essa migração para cartão favorece o setor”, diz Roberto Medeiros, presidente da Multiplus. Em 2014, os cartões de crédito e débito movimentaram R$ 978,8 bilhões em volume financeiro no Brasil, 14,8% mais que em 2013, segundo dados da associação do setor, a Abecs. Para 2015, a entidade projeta crescimento de 12% a 13%. Mesmo assim, nos Estados Unidos a taxa de utilização de cartões é de 44%, ante 30% no Brasil. Medeiros diz que ainda há um grande espaço para atrair consumidores e ampliar o faturamento das empresas de fidelidade no varejo. A Multiplus investiu R$ 80 milhões entre 2013 e 2015 numa plataforma digital para estruturar um verdadeiro shopping virtual para troca de pontos. O Smiles, por sua vez, aportou R$ 25 milhões em 2013 por uma fatia de 25% da Netpoints, focada no varejo, do pequeno ao grande comerciante. “O programa de fidelidade permite ao varejista ser mais competitivo em ambiente de economia mais adversa”, diz o presidente da Netpoints, Carlos Formigari, que tem hoje um universo de 13 milhões de participantes, 50% mais que dois anos atrás. “Hoje, os varejistas conseguem entender esse discurso, e isso acelera o crescimento do setor”, aponta. Nesta semana, a Netpoints fechou acordo com a Smart parte do Sistema Integrado do grupo Martins, que reúne 900 lojas filiadas em 620 municípios brasileiros de 23 Estados para levar o programa de fidelidade a microvarejistas e cidades menores. Já a LTM obtém 70% dos R$ 450 milhões que fatura anualmente no mercado de fidelidade por meio da gestão de programas para o segmento corporativo. Caso da Bayer, que tem um sistema de benefícios para fidelizar empresários do agronegócio. Moreira, da LTM, diz que esse segmento ainda vai crescer a dois dígitos por ano, mas a empresa quer ampliar a fatia da receita na gestão de programas para o consumidor final, como o que opera para os bancos HSBC e Santander. A meta da empresa é chegar a um faturamento de R$ 1 bilhão até 2019, incluindo aquisições. “Haverá consolidação no setor já neste ano”, diz o executivo. A maior integração entre as pontas consumidora, de varejistas e da indústria também move a terceira maior empresa do setor de coalizão por faturamento no país, a Dotz. “A indústria tem comprado dotz e feito parcerias com os varejistas para levar melhor seus produtos ao consumidor final”, cita Roberto Chade, presidente da empresa. A companhia foi criada em 2001 e, desde 2012, tem como sócia a canadense Loyaty One, líder no maior mercado de fidelidade em taxa de penetração do mundo. Entre as indústrias que estão seguindo essa estratégia, de ampliar os laços com o varejo em campanhas de acúmulo e resgates de pontos por meio dos programas Dotz estão Unilever, P&G, CocaCola e PepsiCo. A Dotz, que tem carteira de 13 milhões de participantes e 250 empresas parceiras, lança no dia 14 uma campanha para aquecer a demanda das empresas parceiras e bater a meta de encerrar 2015 com crescimento de 20% em relação a 2014, com faturamento de R$ 430 milhões. “Na crise, uma empresa não pode apenas focar em redução de custo. Uma hora, as empresas têm que buscar atrair demanda, ir na contramão do mercado, gerar escala de vendas”, afirma Chade, que investirá R$ 10 milhões na campanha publicitária do programa Dotz ao longo dos próximos sete meses. “Vamos usar anúncios em TV, impressos e folheteria promocional”.
Valor Econômico – SP