05/05/2015 05:00
O momento mais delicado para a economia brasileira aparentemente já ficou para trás, mas o país ainda tem um caminho muito longo a percorrer e precisa se aprofundar nas medidas para retomar o crescimento. Essa foi a principal avaliação colhida entre os convidados do evento que marcou os 15 anos do Valor, ontem, no clube Hebraica, em São Paulo. O evento contou com a participação de cerca de 500 pessoas, entre eles alguns dos principais empresários de todos os setores da economia, além de autoridades. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, representou a presidente da República, Dilma Rousseff. O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin e o ministro da Ciência e Tecnologia, Aldo Rebelo também estavam presentes, além dos representantes dos acionistas do Valor, Luiz Frias (Folha) e José Roberto Marinho (Globo). O presidente da Braskem, Carlos Fadigas, afirmou já ver sinais de melhora no ambiente econômico. O executivo ponderou, no entanto, que algumas medidas já sinalizadas pelo governo devem sair do papel para que a retomada da atividade se concretize. “O que vejo é todo mundo buscando uma agência positiva e uma forma de sairmos da situação atual, que não agrada a ninguém e já vem há algum tempo”, disse. O próprio o ministro Levy mencionou a necessidade de uma agenda “triplo A” para o país, na qual se destacam os temas de infraestrutura, da competitividade e da melhora de índices de educação e especialmente, disse, “o tema da mensuração da qualidade do gasto público”. Na visão do setor produtivo, o ambiente para negócios está um pouco mais ameno em relação ao fim do ano graças aos empresários, que passaram a lidar melhor com o cenário de indefinição do país, disse o presidente da construtora WTorre, Paulo Remy. O Brasil necessita de previsibilidade para retomar o caminho do crescimento, defendeu Luiz Fernando Furlan, exministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e membro do conselho de administração da BRF. Furlan acrescentou que tem a sensação de que muitos empresários acreditam que “já estamos próximos do fundo do poço ou já começando a colocar o nariz para fora do fundo do poço”. Segundo ele, há um grande volume de empresas aguardando para fazer investimentos tão logo haja o ambiente se torne mais claro. O ambiente de negócios está “bem melhor” em relação ao fim do ano passado após uma série de medidas que auxiliam na recuperação da confiança por parte dos investidores, disse o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto. Segundo ele, o mercado tem começado a dar mais crédito às iniciativas tomadas pelo governo para controlar a inflação, via aumento de juros e ajuste fiscal. “Os juros estão subindo, o câmbio passou a flutuar livremente. Isso tudo contribui para melhorar a credibilidade”, disse. Raul Padilla, CEO da Bunge, de maneira geral, classificou o ambiente de negócios como bom no setor do agronegócio, embalado por uma colheita recorde de soja e perspectivas otimistas para a colheita de milho. “Em commodities, comparado com o ano passado, estamos em um ciclo interessante”, afirmou. Já para o presidente do conselho de administração da Nokia, o pessimismo é maior do que o do ano passado. Aluizio Byrro avalia que esse clima está afetando a economia fundamentalmente devido a “questionamentos políticos”.
“Quanto mais rápida for a solução para a crise políticoeconômica, mais rápido as empresas ampliarão os investimentos”, disse. André Covre, diretor financeiro da Ultrapar, também disse que a crise não afetou os negócios do grupo, que abrangem os setores de distribuição de combustíveis e medicamentos. Para o presidente da AES Brasil, Britaldo Soares, “o governo está trabalhando para colocar as coisas no lugar”. Ele elogiou a iniciativa da presidente Dilma, em seu segundo mandato, de adotar o “realismo tarifário” para recuperar as defasagens de preços do setor elétrico eliminar os subsídios. “Foi a volta à racionalidade econômica, e é isso que assegura o fluxo de investimentos”, disse. O baixo nível de confiança do consumidor foi o que mais atrapalhou o desempenho da economia no início do ano, mas, depois de algumas medidas tomadas no início do ano, a expectativa é que o segundo trimestre seja “mais calmo”, afirmou Luiza Trajano, presidente do conselho do Magazine Luiza. Segundo a executiva, “os resultados das vendas estão mostrando isso” e “ninguém” do Instituto do Desenvolvimento do Varejo, do qual é presidente, “reduziu investimentos que iria fazer”. Para Luiza Trajano, o governo precisa aprovar as medidas no Congresso para impulsionar o crescimento. “Temos que tomar cuidado para não ter desemprego, não subir muito os juros e não ter inflação. É um quebracabeça grande”, afirmou. O presidente do conselho de administração da Camargo Corrêa S.A., Vitor Hallack, entende que hoje o cenário é “significativamente melhor” em relação ao começo do ano uma vez que é possível ver uma ação do governo para endereçar as contas públicas e garantir transparência, o que é vital, segundo ele, para resgatar a credibilidade. “A partir da credibilidade restaurada do país e do esforço para ter as agências reguladoras funcionando as nomeações nas agências começaram a ser feitas , poderemos ter um ambiente favorável com regras claras que assegurem a “regra do jogo”, disse. O presidente do Credit Suisse no Brasil, José Olympio Pereira, acredita que “baixou um pouco a fervura” da preocupação dos mercados com a economia brasileira nas últimas semanas, mas que os investidores estão antecipando uma realidade que não aconteceu. “Eu não vejo um progresso tão forte que justifique toda essa melhoria de ânimo”, afirma o executivo. “Houve um grande movimento de entrada de investimento estrangeiro na bolsa, principalmente, e os spreads se contraíram bastante também”, afirmou. “Mas ainda há um longo caminho a percorrer em termos de ajustes, para se ter alguma perspectiva de crescimento.”
Os juros elevados praticados pelo Banco Central no atual governo desestimulam investimentos, concentram renda e geram necessidade de um esforço fiscal enorme, afirmou o governador Geraldo Alckmin. Em sua avaliação, a Selic alta, em 13,25% ao ano, está esfriando exageradamente a demanda em um momento em que a inflação é resultado do reajuste de preços administrados. Após um início do ano mais turbulento, a expectativa para os próximos meses é de um clima mais otimista, refletindo, entre vários fatores, a perspectiva de aprovação do ajuste fiscal, afirmou Wilson Ferreira Júnior, presidente da CPFL Energia. “Estou sentindo mais otimismo”, afirmou Ferreira. Segundo ele, o novo patamar do câmbio em torno de R$ 3 também ajuda a animar a indústria brasileira de exportação e o agronegócio, resultando em perspectivas “muito boas daqui para a frente”. Entre as prioridades necessárias para impulsionar uma recuperação da economia brasileira estão as questões estruturais ligadas ao plano de ajuste fiscal, assim como as expectativas de um plano de investimentos do governo. “A economia chegou em um ponto em que é necessário, e acho que o governo está consciente, que precisamos de um plano nacional de infraestrutura”, afirmou. O expresidente do Banco Central Henrique Meirelles avaliou que a economia brasileira passa por um momento em que os compromissos do governo com a política fiscal estão “mais claros”. Em contrapartida, Meirelles ponderou que o desempenho da economia este ano está pior que o esperado. Assim como Meirelles, o presidente da Vale, Murilo Ferreira, analisou que houve uma melhoria no ambiente de negócios no país desde o começo do ano. “Naquele momento [começo de 2015], estávamos com ascendente de negativismo e hoje estamos em descendente.” Ferreira disse que um sinal dessa melhora pode ser visto nos títulos das empresas brasileiras no exterior. “O Brasil voltou a significar oportunidade para investidores”. O diretor de relações institucionais da Souza Cruz, Fernando Bomfiglio, disse que existem articulações no governo, incluindo a articulação política conduzida pelo vicepresidente da República, Michel Temer, que dão alento de diálogo e indicam que o ambiente de negócios vai prosseguir “de forma positiva”.
Valor Econômico – SP