20/04/2015 às 05h00
Por Sarah Nassauer | The Wall Street Journal
Gordura é bom para a saúde, adoçante artificial não é, e farinha de grilo e outros insetos é um alimento real vendido como uma fonte saudável de proteínas em barras de cereais.
Empresas de alimentos e supermercados contam com as nossas mudanças de um hábito alimentar para outro para lucrar com uma oferta constante de produtos feitos sob medida para novos gostos.
Mas prever esses hábitos é complicado. Alguns desses novos alimentos ou tendências de saúde se tornam parte do cotidiano, como o cappuccino, enquanto outros, como a goma de cafeína, são um fiasco.
Predizer qual vai fracassar e qual terá sucesso - e identificar uma tendência ascendente ou descendente - se tornou especialmente importante para grandes empresas de alimentos à medida que os consumidores estão trocando seus alimentos favoritos por outros considerados saudáveis ou “premium”. Nos Estados Unidos, por exemplo, no geral, as vendas de alimentos ficaram estáveis em 2014 ante o ano anterior, enquanto os alimentos contendo atributos saudáveis como “livre de glúten”, “orgânico” e “sem transgênicos” cresceram 13%, segundo dados de vendas da Nielsen.
Os consumidores recentemente começaram a beber leite integral quase tão frequentemente quanto o desnatado, de acordo com a Nielsen. A manteiga e os ovos voltaram ao cardápio depois de anos de vendas em queda devido a dietas de baixa gordura e receios quanto ao colesterol. Ovos agora voltaram a ser considerados uma fonte de proteína boa e barata.
Tendências de comidas normalmente avançam de forma previsível. Uma nova moda culinária frequentemente aparece primeiro na cozinha de um chef criativo, em um restaurante étnico ou são inventadas por proprietários excêntricos de pequenas empresas de alimentos, diz Kimberly Egan, diretora-presidente da CCD Innovation, uma empresa de estratégia para alimentos e bebidas que criou o modelo normalmente usado de linha de tempo para tendências alimentares com cinco estágios. Alimentos como açaí, kimchi (um condimento típico da culinária coreana), açúcar de coco, grãos germinados e hambúrgueres de alta qualidade ficaram populares dessa forma.
No estágio inicial, quase tudo pode ter seu dia de glória. A farinha de grilo está agora sendo vendida por um punhado de pequenas empresas como proteína barata que é melhor para o meio-ambiente do que os bois e as galinhas. Insetos são alimentos comuns em todo o mundo e transformá-los em farinha e disfarçados em barras de cereais, tornarão os grilos palatáveis para mais pessoas, dizem os fãs do ingrediente. É o “estágio zero” da tendência, diz Egan.
Se esse alimento passar para o próximo estágio, ele aparecerá, por exemplo, em blogs de alimentos e em lojas de produtos de cozinha de alto padrão. Mais tarde, ele pode entrar para os cardápios de redes de comida casual e em programas de culinária na TV, diz Egan. A tendência normalmente atinge os sites de receitas antes de finalmente terminar em redes de fast-food e nas prateleiras de supermercados, diz ela. A quinoa e a semente de chia são alimentos que já atingiram esse nível.
Para as grandes empresas, o truque é aderir às tendências rapidamente, mas não tão rápido para que elas não comprometam a linha de produção com uma moda que termina sendo passageira. Em empresas como a Campbell Soup Co. e a General Mills Inc., empregados analisam dados de vendas de alimentos, leem pesquisas de tendências e de saúde e buscam na internet indicações de tendências, um processo que chamam de “escuta social”.
A proteína é um exemplo da nuance necessária nas interpretações de tendências. O típico amante de carne consome bastante, mas mesmo assim muitos consumidores querem proteínas vindas de outras fontes, especialmente em momentos não tradicionais como no café da manhã e no lanche da tarde, dizem pesquisadores de alimentos. As empresas estão inundando as prateleiras de supermercados com barras de cereal, bebidas e cereais matinais cheios de proteína vegetal e ressaltando [a existência de proteína] nos rótulos de produtos como salsichas e doces. Os americanos
compraram no ano passado US$ 16 bilhões em alimentos com rótulos indicando a presença de proteína, uma alta de 5,3% no ano, segundo a Nielsen.
Mas consumir mais proteína vegetal de soja ou de ervilhas e menos proteína animal ainda não é um hábito amplamente aceito, diz Michael Goodman, diretor de inovação da Campbell’s. Os cientistas da empresa têm acompanhado pesquisas acadêmicas e orientações nutricionais do governo dos EUA que recomendam o consumo de menos proteína animal, na expectativa de que a pesquisa faça os consumidores migrarem para dietas mais a base de vegetais, diz Goodman.
Para aproveitar a tendência, a Campbell’s começou no ano passado a vender barras e “shakes” de proteína V8 Protein que contêm proteína de ervilha, de soja, de arroz integral, quinoa e leite. “Nós estamos apostando que parte dessa ciência vai trabalhar conosco” para tirar a proteína vegetal da periferia e levá-la para o centro [da alimentação], diz ele.
Para uma nova tendência de comida, sabor ou de saúde se tornar amplamente aceita é necessário que ela atinja comportamentos importantes como a dificuldade em fazer o jantar durante a semana ou o desejo atual dos consumidores de achar que o alimento é natural.
Na expectativa de interromper a queda nas vendas do iogurte Yoplait, a General Mills, dona da marca, gradualmente está alterando os ingredientes de algumas variedades, tirando os corantes artificiais, o xarope de milho e o aspartame, um adoçante artificial. Ela mudou a embalagem para ressaltar as mudanças. As vendas do Yoplait
começaram a se recuperar, provavelmente porque a eliminação daqueles ingredientes atende ao desejo das pessoas pelo que a General Mills chama de “bem-estar proativo”, diz Matt Wilson, gerente de tendências globais da empresa.
A ideia geral de ser saudável tem se afastado das dietas em favor de uma visão mais ampla, em que as pessoas agora se perguntam: “Estou comendo boa comida? Estou me mantendo ativo? Estou dormindo bem?”, diz Wilson.
Há três anos, a Campbell’s estava monitorando duas grandes tendências: consumidores mais jovens que queriam sabores mais étnicos e ousados e a necessidade de pratos mais fáceis de preparar para o jantar durante a semana. Para atendê-las, a Campbell’s lançou molhos para jantar que podem ser aquecidos em uma panela ou no forno com um tipo de carne e vêm em uma variedade de sabores como “curry tailandês” e “carne assada”. Os sabores mais vendidos são “diferentes daqueles
pelos quais [os consumidores] normalmente optariam, mas não tão diferentes a ponto de causar estranheza ou assustar [o consumidor]”, diz Goodman, diretor de inovação da empresa.
A companhia agora planeja parar de vender o sabor de molho de carne com bacon e cheddar. “Nós pensamos que o consumidor estava desejando esses sabores mais familiares”, mas certamente eles não são tão excitantes, diz Goodman. A carne de panela com molho marroquino também vai ser descontinuada, provavelmente porque é estranho para consumidor, diz ele. Os sabores de frango marsala, carne assada e curry tailandês estão vendendo bem. “Entre um ensopado marroquino e um curry tailandês você nunca sabe o que vai fazer sucesso”, diz ele.
Valor Econômico – SP