25/11/2014
Por Gustavo Brigatto | De São Paulo
Quando entrou no curso de ciência da computação da Universidade de Campinas (Unicamp), em 1994, Fabrício Bloisi estabeleceu uma meta: queria montar uma empresa bem-sucedida para ter condições de comprar seu próprio helicóptero. Duas décadas depois, o sonho está bastante próximo de se tornar realidade. As aulas de pilotagem já somam o mínimo de 35 horas exigidas pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e, até o fim do ano, o executivo pretende fechar a compra de uma aeronave.
A concretização do objetivo acontece no momento em que a Movile, a empresa de aplicativos e conteúdo para dispositivos móveis que Bloisi ajudou a fundar em 1998, chega ao seu melhor momento. Operando no azul e com crescimento anual na faixa de 70% nos últimos cinco anos, a companhia pretende investir R$ 100 milhões na compra de oito empresas até o fim do ano e entrar em um novo ciclo de crescimento.
A meta, segundo Bloisi, é buscar uma expansão de 50% ao ano pelos próximos cinco anos. É um ritmo inferior ao registrado até agora, mas que acontecerá sobre uma base bem maior. A companhia não abre seus números, mas segundo balanço publicado em julho, no período de 12 meses encerrado em março deste ano, a receita da companhia chegou a R$ 174 milhões. Muito mais que os R$ 18,9 milhões do mesmo período de 2011. De acordo com a Movile, esse resultado se refere apenas a uma parte de seus negócios.
Na nova fase, o objetivo da Movile é fortalecer sua própria marca e ganhar espaço no mercado internacional. Hoje, o principal negócio da Movile é o desenvolvimento de produtos para operadoras da América Latina. Nesses contratos, conhecidos como “white label”, a Movile cria e abastece aplicativos que são oferecidos com a marca de outras companhias – como o Vivo Meu Ídolo, que levará vídeos, fotos e artigos sobre celebridades aos clientes da operadora. O lançamento acontecerá em breve. “Os produtos próprios são 15% da receita, mas são os que apresentam o crescimento mais acelerado”, disse Bloisi ao Valor.
A estratégia da Movile se divide em duas partes. Por um lado, a companhia vai reforçar o PlayKids. Lançado no ano passado, o aplicativo para smartphones e tablets é uma espécie de Netflix para crianças, com diversos conteúdos de vídeo, áudio e interatividade. Disponível em lojas de aplicativos de 20 países, é a principal arma da companhia em seu processo de internacionalização. Até o ano que vem a meta é que as receitas fora do Brasil representem metade do resultado da companhia, contra 35% hoje.
Em outra frente, a companhia investirá em uma tendência que vem ganhando muita força nos últimos dois anos, a venda de produtos e serviços por meio de dispositivos móveis – também conhecido como “on-line to off-line”, ou O2O. Em fevereiro do ano passado, a Movile comprou participação no iFood, o principal aplicativo de entrega de comida do país. De lá pra cá, as vendas por meio de dispositivos móveis passaram de 7% para 70% do total. A experiência deu tão certo que neste ano a companhia reforçou sua operação na área de comida. Além de assumir a participação restante no iFood, a Movile comprou o segundo colocado do mercado, o RestauranteWeb, consolidando a maior empresa do segmento no país.
Mas a área de comida não é a única que interessa à companhia. Este ano, a Movile também fez um aporte na LBS Local, dona dos serviços de localização Apontador e Maplink e na CinePapaya, de venda de ingressos on-line. A empresa lançou ainda o serviço de entregas Rapiddo. Segundo Bloisi, mais está por vir. “Nos próximos cinco anos, 30 categorias de serviços O2O serão muito fortes, contra apenas duas hoje [chamar táxis e pedir comida]. Queremos sair na frente nisso na América Latina”, disse.
As aquisições fazem parte da história da Movile. Desde sua origem – como empresa incubada na Unicamp, em 1998 – foram 11 operações. Os negócios anunciados nos últimos quatro meses estão sendo financiados com os R$ 125 milhões que a companhia captou junto ao fundo de investimentos Innova Capital, do empresário brasileiro Jorge Paulo Lemann e por meio de um empréstimo junto à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Para 2015, o executivo já prevê uma nova rodada de captação. “Temos metas agressivas e precisamos de recursos”, disse. Com quase 500 funcionários divididos em 10 escritórios na América Latina e nos Estados Unidos, a Movile é controlada pelo grupo sul-africano Naspers, que também tem investimentos na Abril e no Buscapé.
Ao contrário da maior parte das empresas de internet, a Movile é lucrativa. Na verdade, os resultados têm sido positivos desde 2012. Naquele ano, a empresa reverteu um prejuízo de R$ 3,7 milhões e apurou um lucro de R$ 6,3 milhões. No balanço publicado em julho, o resultado foi de R$ 12 milhões, alta de 5,3% em relação ao exercício anterior.
Se tudo ocorrer como o esperado, é possível que, em alguns anos, outro executivo da companhia realize um de seus sonhos. Diretor financeiro da Movile, o americano Arthur O´Keefe planeja uma oferta pública de ações da empresa em 2016. Questionado, Bloisi preferiu não se comprometer com o objetivo. “É o sonho dele”, desconversou.
Valor Econômico – SP