A Conductor, prestadora de serviços em pagamentos eletrônicos, vai lançar uma carteira digital que permite que os cartões distribuídos pelos varejistas aos clientes, chamados de “private label”, sejam usados em outros estabelecimentos comerciais. Chamado de Merci, o produto tem apelo para a população desbancarizada, que tem dificuldade de acesso ao crédito nas grandes instituições financeiras.
Esse é o primeiro anúncio da Conductor desde que se tornou, no fim do ano passado, a primeira empresa investida pela Visa no Brasil. A bandeira adquiriu uma parcela minoritária do negócio que é controlado pelo fundo americano de venture capital Riverwood desde 2014. A Conductor foi fundada há duas décadas como uma processadora de cartões, provendo tecnologia para os emissores se conectarem às bandeiras, mas se transformou em uma plataforma tecnológica para varejistas e bancos.
As estimativas da empresa são de que existem 210 milhões de cartões de loja emitidos no Brasil sem uma bandeira tradicional, como por exemplo Visa, Mastercard e Elo, ficando portanto limitados a uso apenas na rede do varejista que o concedeu. Exatamente por essa característica, poucos consumidores são incentivados a usar todo o saldo disponibilizado pelo lojista.
No total, a Conductor estima que existam R$ 40 bilhões de saldo de crédito nos cartões de loja. “Desse total, em média metade não é utilizada. O cliente não gasta mais no estabelecimento porque não precisa de mais produtos dali, mas também não tem a opção de consumir em outros lugares, portanto sobra saldo a ser gasto”, explica o diretor de tecnologia e produto da Merci, Pedro Milanez.
A Merci funcionará como um arranjo de pagamento, registro que espera obter do Banco Central nos próximos meses. O risco de inadimplência no crédito continua com o lojista, embora a Merci mantenha garantias exigidas pelo regulador.
A empresa pagará aos varejistas uma remuneração, correspondente a uma taxa fixa por operação, para que ele libere o limite do cartão do cliente para uso em outros estabelecimentos. Seis emissores já estão em fase de implementação, totalizando mais de 5 milhões de cartões, entre eles a rede de supermercados D’Avó e o varejo de vestuário Lojas Avenida.
As vantagens para essas redes, além da remuneração, são a ativação de mais cartões, já que o cliente terá mais opções de uso, e o fluxo em suas lojas, uma vez que as faturas são normalmente pagas no varejista. Os executivos dizem que um terço dos consumidores que se cadastrou na Merci durante o projeto piloto não usava o cartão de loja, mas passou a usar.
Os estabelecimentos credenciados, aqueles em que os consumidores vão gastar o limite do cartão de loja, vão pagar à Merci uma taxa conforme a quantidade de novos clientes conquistados. Empresas como Uber, 99, Netflix, Spotify e Google App Store já estão conectadas ao ecossistema.
Já o consumidor que tem a carteira digital usará um aplicativo no qual poderá cadastrar todos os seus cartões de loja. Com ele, será possível pagar via QR Code em lojas físicas ou pela carteira virtual no mundo on-line.
Os cartões de loja sem bandeira normalmente são direcionados aos clientes de classes mais baixas, que têm mais dificuldade de acessar os empréstimos bancários, enquanto quem tem renda mais alta costuma ser alvo de um cartão de loja com bandeira, podendo usá-lo numa rede mais ampla de estabelecimentos.
“Queremos ser um intermediário entre o cartão de loja com e sem bandeira, já que o crédito no varejo é muito importante para a base da pirâmide de renda, mas não está sendo usado amplamente”, diz Antonio Soares, CEO da Conductor. Os executivos reconhecem que, para o sistema deslanchar, é preciso criar um vasto ecossistema de estabelecimentos cadastrados, algo que bandeiras tradicionais fazem há décadas no exterior e no país.
Fonte: Valor Econômico