Grandes redes, com centenas de pontos e maior poder de negociação – como Lojas Renner, C&A, Marisa, Via Varejo e Magazine Luiza – abriram conversas para rever o valor de aluguel de lojas de rua e de espaços em shopping centers. Em certos casos, há algum avanço inicial nas tratativas, mas em outros, há um endurecimento maior. A Via Varejo, por exemplo, inicialmente suspendeu pagamentos a locadores de suas mil lojas e de seus centros de distribuição, o que surpreendeu proprietários.
No caso de algumas cadeias do setor, como a Via Varejo (dona de Casas Bahia e Ponto Frio) e Marisa, as condições de pagamento são negociadas com o próprio sócio controlador, que na maioria das vezes, acaba sendo o maior locador das lojas. Michael Klein, principal acionista da Via Varejo, aluga 300 pontos comerciais à Via Varejo (entre lojas e galpões) e a família Goldfarb, fundadora e maior sócia da Marisa, loca algumas dezenas de pontos à rede de moda.
No início de abril, a Via Varejo informou proprietários de quase 1,1 mil lojas de suas duas redes, por meio de carta, sobre a suspensão do pagamento do aluguel do período relativo a março, com vencimento neste mês. E informou que ainda não há, no momento, previsão para regularização do pagamento.
“Contatamos a empresa e buscamos negociar, mas a advogada deles informou que era uma decisão geral. Não falam em parcelar ou postergar, dizem apenas que não vão pagar. Como é uma locação para vários membros da família, não podemos ficar sem esse recurso”, disse Alessandra Hilário, filha de um dos proprietários de um ponto comercial em São José dos Campos (SP).
Um segundo locador com quatro lojas da capital paulista afirma que foi informado no começo do mês sobre o congelamento nos próximos pagamentos e que isso é efeito da receita “zero” em vendas em lojas físicas nas últimas semanas. Cerca de 70% da receita da empresa vem das lojas, hoje fechadas.
A decisão sobre os aluguéis foi tomada semanas após a empresa dizer a analistas, em março, que tem uma sólida posição de caixa para enfrentar a crise (R$ 4,4 bilhões). Segundo uma fonte, a medida de suspensão inicial é etapa do processo de negociação, que ainda deve avançar, e que a rede mantém caixa confortável. Afirma ainda que tem conseguido migrar parte da vendas das lojas para o site em ritmo acima do projetado.
A Via Varejo já havia mencionado o assunto em teleconferência de resultados em março. “Obviamente, com as lojas fechadas, vamos, sim, tomar uma atitude em relação ao valor pago dos aluguéis. Já há vários shoppings sinalizando como isso acontecerá, e também estaremos proativos em nossa tomada de decisão”, disse Roberto Fulcherberguer, presidente da empresa.
O executivo afirmou que a empresa teria um posicionamento único tanto para as lojas da família Klein, quanto para aluguéis de outros proprietários. “E, sinceramente, tenho certeza de que a família estará muito atenta e participativa neste momento de dificuldade. Loja fechada não gera faturamento”, acrescentou, na ocasião.
Acordos de locação no varejo entram nos balanços no item “partes relacionadas”. Locadores ouvidos pelo Valor ontem esperam isonomia no tratamento entre os proprietários, sem eventuais favorecimentos, apesar de entenderem que há contratos de maior e menor volume financeiro. Há fundos imobiliários com lojas como ativos em carteira e atrasos ou adiamentos afetam diretamente os cotistas.
Diversas varejistas têm aberto negociações com fornecedores e locadores para rever condições dos contratos. Nesses caso, são redes com alto poder de barganha, e em certas situações, negociando com grupos imobiliários e de shoppings também líderes em suas regiões. Ontem, o Valor informou que essas conversas têm avançado no setor de shoppings, mas há variações nos acordos, a depender de cada companhia.
Os contratos podem definir o valor de locação como percentual da venda ou como valor mínimo negociado. Com lojas fechadas, o aluguel cobrando em cima da venda deixa de existir. Em linhas gerais, o Valor apurou que em São Paulo e no Rio de Janeiro há shoppings oferecendo descontos de 50% no aluguel nos meses em que os empreendimentos estiverem fechados e outras isentando 100%. Mas há shoppings de São Paulo que preferem negociar lojista a lojista.
Ao Valor em nota, a Marisa informa que “passou a renegociar todos os contratos”, que está em contato com os 100% dos fornecedores e diz que todas as decisões estão sendo tomadas em conjunto para que nenhum dos lados seja prejudicado”. A C&A diz que entende a fase atual e busca “opções para manter as relações comerciais saudáveis”.
A Renner afirmou que “sempre adotou uma postura de parceria com os empreendedores e proprietários, nunca deixando de honrar seus compromissos”. Acrescenta que há renegociações já realizadas ou em andamento, buscando novas soluções adequadas para ambas as partes.
Fonte: Valor Econômico