Antes de finalizar a maior operação do mercado de cosméticos do ano e se unir à Natura, a Avon tem centenas de melhorias para realizar em sua operação. A gigante da venda direta de cosméticos tenta recuperar receitas, participação do mercado e confiança das consumidoras e consultoras.
A compra da Avon pela Natura forma a quarta maior empresa de cosméticos do mundo, com faturamento anual superior a 10 bilhões de dólares, mais de 40 mil colaboradores e presença em cem países. A transação foi anunciada em maio e amanhã, 13 de novembro, ocorrerá uma assembleia geral extraordinária para tratar da reestruturação societária do grupo e da aquisição da Avon. Na mesma data, também ocorrerá assembleia especial de acionistas da Avon.
Se o negócio é gigantesco, os desafios também são. Enquanto a Natura irá impulsionar sua presença global com a compra da rival, para a Avon a transação é uma chance de resolver antigos problemas e arrumar a casa. São quase 600 tarefas diferentes de transformação.
Por décadas, a Avon foi uma das companhias de beleza mais relevantes do mundo, mas perdeu o ritmo em um mercado em constante transformação. No Brasil, as receitas caíram por oito trimestres seguidos antes de se manterem estáveis no segundo trimestre de 2019. No quarto trimestre, no entanto, as vendas voltaram a encolher 4,6%.
A fabricante de cosméticos também precisa lutar por um espaço na carteira da revendedora, já que em média cada uma vende produtos de 3,5 companhias diferentes. O número de revendedoras caiu 10% apenas no terceiro trimestre do ano.
O plano de recuperação da Avon ainda não sofreu alterações com a chegada da Natura. Precisamos entregar os resultados de 2019 e fortalecer nossos fundamentos básicos. Depois podemos pensar em aumento da digitalização, novos negócios e até uso de dados, diz Fabíola Bezerra, diretora executiva do escritório de transformação, em entrevista a EXAME.
Centenas de ações
Para comandar as mudanças da Avon, Bezerra foi escolhida como diretora de transformação da empresa há cerca de onze meses, depois de passar 13 anos na Whirpool dona das marcas Brastemp, Consul e KitchenAid.
A recuperação da companhia não será fácil: a diretora criou 15 frentes de transformação, como novos negócios, cultura ou digitalização, e cada frente tem centenas de tarefas menores.
Para gerenciar as quase 600 iniciativas, Bezerra usa um sistema para acompanhar o status de cada uma delas e faz reuniões semanais com os líderes de cada um das frentes.
O acompanhamento de perto é essencial para que essas iniciativas não sejam esquecidas ou deixadas de lado, um dos maiores desafios da empresa hoje, segundo Bezerra. De acordo com ela, a cultura da empresa sempre foi aberta para mudanças e inovações, mas grande parte das novas ideias não era colocada em prática e, se era aplicada, o projeto não ia até o fim, com relatórios de resultado, e os aprendizados se perdiam no caminho.
Os projetos também passaram a ser pensados no curto prazo, ao invés de focar apenas na campanha seguinte e no próximo catálogo que seria lançado.
Novos projetos começavam o tempo todo, mas poucos eram finalizados, o que corrói a credibilidade perante funcionários e o mercado, diz Bezerra.
Mentalidade de startup
Um dos problemas de colocar os novos projetos em prática é o tamanho da empresa. Afinal, são 1 milhão de consultoras apenas no Brasil, 6 milhões em todo o mundo e vendas anuais de 6 bilhões de dólares.
Então lançar um novo projeto para toda a operação demanda tempo, planejamento e investimentos amplos. Agora, ao invés de lançar uma mudança para toda a base de revendedoras, a Avon está fazendo pequenos testes, que permitem investimentos menores e ajustes de erros mais ágeis.
Um exemplo é a parceria com a varejista Pernambucanas, para a venda dos produtos mais populares da Avon. José Vicente Marino, presidente da Avon no Brasil, queria implementar a parceria para todas as 355 lojas da varejista, mas Bezerra optou por iniciar o projeto em apenas cinco lojas. Essas lojas Pernambucanas também passaram a fornecer produtos para retirada de revendedoras recentemente.
Além da parceria com a Pernambucanas, a Avon lançou no fim de 2018 a entrega de produtos pelo aplicativo de delivery Rappi e, em setembro deste ano, uma parceria com o Bradesco para oferecer maquininhas da marca Stelo para as revendedoras.
Cortes
Além de ações para aumentar as receitas, a companhia também promove cortes de custo. No terceiro trimestre, a companhia cortou 71 milhões de dólares em todo o mundo.
A companhia também simplificou seu portfólio, reduzindo o número de produtos, ou SKUs, de 542 no fim de 2018 para 499. O número de funcionários caiu 15% desde o início do ano.
No Brasil, todas as requisições de compra que não impactam a produção, de novos materiais de escritório a ações promocionais, são analisadas para verificar a urgência e necessidade da compra. Assim, o corte de custos foi de 10% e o número de requisições por dia caiu de 50 para 10.
Apresentação de resultados
Para incentivar o andamento do projetos, a companhia criou um transformômetro, gráfico que mostra a receita ou a economia que são geradas com as iniciativas. Os principais projetos são reconhecidos e, até o momento, 48% desses objetivos foram implementados.
Perguntas como quanto custa um projeto, qual o tempo necessário e qual o retorno esperado não eram feitas na Avon. Chegamos para fazer essas contas e acompanhamentos, afirma Bezerra.
Como a divisão brasileira da Avon é a maior do grupo, as mudanças feitas por aqui são exemplo para outros países. Um exemplo é um treinamento sobre fundamentos da transformação e inovação, o Ability to Execute A2E. Até o momento, 2.300 funcionários brasileiros foram treinados e o projeto deverá ser replicado em outros países, como a África do Sul.
No terceiro trimestre do ano, a companhia já começa a mostrar sinais positivos: o preço médio dos produtos cresceu 9%, ao diminuir os descontos e melhorar a precificação dos produtos, e as vendas por representante cresceram 4%. As vendas digitais aumentaram 80%. As receitas, por outro lado, caíram 6% no trimestre, com queda de 10% no número de revendedoras.
Ainda há um longo caminho pela frente, mas os acionistas da Avon estão otimistas com as perspectivas: desde o início do ano as ações valorizaram quase 160%. A Natura, já envolvida na transformação da The Body Shop, adquirida em 2017, ganha novos desafios na sua ambição de expansão global.
Fonte: Panorama Farmacêutico