Por natureza, o varejo é um setor dinâmico, mas os últimos dez anos foram de muito movimento. É o que o relatório Retail Trends 2017, da Deloitte, chama de “período de agitação sem precedentes” no setor. As ondas de inovação promovidas pela tecnologia digital forçaram varejistas a se manter alertas, mas agora, segundo a consultoria, é hora de “priorizar investimentos em tecnologias que vão trazer valor verdadeiro para seus consumidores ou aumentar a eficiência de suas operações”. A tecnologia precisa, basicamente, resultar em um destes dois fins. Se nenhum deles foi atingido, problemas à vista.
É hora de focar em acelerar as mudanças dentro de cada operação. Cinco tendências principais guiam tais mudanças:
1 – O próximo ponto de inflexão digital – Impulsionado por planos ambiciosos dos grandes players do e-commerce, o varejo online continua avançando a taxas de crescimento superiores ao varejo físico, e isso tem um impacto. Os varejistas estão racionalizando o espaço físico, apostando em formatos mais flexíveis (loja conceito e loja pop up, apenas para citar dois), e intensificando sua presença digital. Por exemplo, pelo mundo, são cada vez mais comuns exemplos de lojas que reservam espaços para o Click & Collect, onde se retira produtos comprados online. Aqui no Brasil, o Grupo Pão de Açúcar está em processo de expansão do sistema Click & Collect. Iniciado em 2013, o projeto do Grupo vem ampliando o número de lojas em que está instalado, e já ultrapassou a marca de 200. O projeto é estratégico e com ele outros elos do negócio podem se beneficiar com o fluxo adicional nas lojas. Tudo ainda é aprendizado, mas o espaço dedicado ao serviço nas lojas de varejo pode se transformar em novas oportunidades de venda. A Deloitte avisa: estamos apenas no início do e-commerce, há muito por vir ainda.
2 – Visão única do cliente – A loja física vem sendo redesenhada de acordo com o comportamento de compra do consumidor digital. Na loja, um novo equilíbrio deve ser atingido para entregar ao consumidor omnichannel uma experiência de compra sem costuras entre os diferentes canais de compra. Ou seja, o consumidor passeia pelos diferentes canais e encontra a mesma proposta e atendimento. A experiência de loja vai cada vez mais se concentrar em duas coisas: inspiração e conveniência.
Por mais que o varejo omnichannel seja uma busca, ainda não é possível mencionar exemplos no Brasil. Em entrevista ao site “O Negócio do Varejo”, o renomado consultor Alberto Serrentino disse que “estamos muito longe ainda de caracterizar modelos de negócios omnichannel porque isso está se construindo por tentativa e erro, é uma grande e longa jornada”. Para ele, não há empresa no mercado brasileiro que tenha visão única do cliente, ausência de barreiras entre os canais e engajamento das pessoas para que os clientes possam se relacionar com as marcas, escolher produtos, comprar por vários canais, de uma forma transparente. “O discurso é muito lindo, mas a prática é árdua: vislumbrar um modelo de negócios sem fronteiras entre canais permite percorrer essa jornada, mas antes de pensar em omnichannel é preciso ser relevante no mundo digital. Se a empresa não for boa no comércio eletrônico, fazer omnichannel é um discurso vazio”, afirma.
3 – A maior presença de robôs – Diferentes abordagens de inteligência artificial, realidade virtual, internet das coisas, interfaces por voz já vêm mudando nossas vidas. Cada vez mais o varejo físico irá incorporar tecnologias que venham a tornar a experiência de compra na loja algo mais intuitivo e conveniente, eliminando barreiras para acessar qualquer tipo de informação sobre a marca e seus produtos.
Hoje já é comum a presença de tablets pelas lojas, seja na mãos dos vendedores, que passam a estar melhor preparados para fazer uma venda, seja em totens espalhados pela loja para que o consumidor acesse todo o sortimento da marca. Aplicativos, novos meios de pagamento, tudo está em transição.
E as possibilidades são tremendas. Na Suécia, a Ikea, gigante no comércio de móveis e acessórios para casa, desenvolveu um programa de realidade aumentada em que o cliente direciona a câmera do seu celular para o ambiente que deseja mobiliar, clica nas opções oferecidas pela loja, e o programa faz uma transposição de imagens dando uma noção de como o novo ambiente ficaria. É uma experiência de compra muito mais completa e fácil, e sem contar divertida também.
4 – Mas como acelerar a mudança? A Deloitte acredita que em 2017 varejistas do mundo todo estarão ocupados implementando mudanças em seus negócios para torná-los mais ágeis. Tais implementações de soluções tecnológicas são uma resposta à mudança estrutural do mercado, e a tentativa é melhorar a capacidade de reagir e a qualidade da entrega ao consumidor.
Veja o exemplo do conceito de pagamento Apple Pay, da empresa icônica: um prático sistema mobile de pagamentos, que usa a internet do celular do comprador para autenticar a transação a partir de um sensor biométrico. Ninguém falou em abrir a carteira aqui. Esse é um excelente exemplo de como o momento de pagamento está modificado, acelerado e otimizado. O Apple Pay quer ser uma plataforma global – já está presente em dez países. De 220 mil estabelecimentos que aceitavam o meio de pagamento, já são cinco milhões. Segundo a revista Novarejo, 90% das transações sem contato de cartão hoje são realizadas com Apple Pay. Além de mais simples e seguro, o meio de pagamento aumenta a lealdade dos consumidores e permite captar mais dados que podem ser usados para retomar uma conversação com os clientes. São novas formas de usar a tecnologia para gerar oportunidades antes não-vislumbradas.
5 – Redefinição do varejo – O “maker movement” (movimento que celebra o “fazer” aliado à tecnologia, à criatividade e à bricolagem), a economia compartilhada, e outros fatores tornaram mais difícil definir um varejista e o que ele faz. Varejistas não-tradicionais estão desenvolvendo novos modelos de negócios para atender as necessidades dos clientes, tais como serviços por assinatura e vendas-relâmpago. Observa-se também o triunfo de produtos customizados, negócios com capacidade para atender o consumidor que exige tudo sob medida.
Outro bom exemplo vem de fora. A tecnologia e um processo bem montado permite que a customização em massa (sim!) e a produção sob demanda seja uma realidade lucrativa. A Shoes of Prey permite que seus consumidores “construam” o design de seus sapatos usando ferramentas digitais que mostram diferentes materiais, formas (dos dedos do pé), saltos e outros componentes que podem ser combinados para criar um único item. Já falamos aqui no Portal da Abrasce sobre outro exemplo, a loja da Adidas em Berlim, onde é possível escolher a cor, material e criar uma estampa exclusiva para um suéter. O corpo do consumidor é escaneado para tirar as medidas e produzir a peça personalizada. Depois de uma hora e meia, o consumidor sai da loja com sua peça única!
Os Poderosos do Varejo Global 2017
A Deloitte divulgou também a 20ª edição do relatório que traz o ranking dos 250 maiores varejistas do mundo – a brasileira Lojas Americanas S.A. é a única rede do País no ranking geral, ocupando a 170ª posição.
O estudo também analisa o desempenho destas organizações com base em região geográfica, setor e existência de atividade online, entre outros fatores. “Nos últimos 20 anos observamos uma transformação sísmica no varejo e nos consumidores. O que antes era considerado futurista, hoje é esperado como usual pelo consumidor. Os varejistas inovadores sabem que a tecnologia não é mais complementar à experiência de compra, ela é fundamental”, argumenta Reynaldo Saad, sócio-líder da indústria de Bens de Consumo e Produtos Industriais da Deloitte no Brasil.
Como já falamos antes, a tecnologia, por si só, não é mais suficiente. Os clientes estão buscando produtos e experiências novas e surpreendentes. “É uma economia impulsionada pelo consumidor”, complementa Saad.
Fonte: Abrasce