Operação deve ocorrer num momento que a rede cresce acima do mercado, mas acumula prejuízo há três anos e renegocia dívidas com bancos
Por Adriana Mattos e Nelson Niero
As redes St Marche e Empório Santa Maria, da holding Hortus, convocaram os sócios para aprovar, na sexta-feira, uma proposta de abertura de capital. A operação deve ocorrer num momento que a rede cresce acima do mercado em vendas, mas acumula prejuízo há três anos e renegocia dívidas com bancos, segundo relatório da auditoria E&Y que acompanha as demonstrações financeiras de 2020.
O parecer do auditor e os resultados anuais foram divulgados dias antes da chamada da assembleia para aprovar a oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês).
Haverá emissão de novas ações e oferta de papéis dos controladores, com desdobramento das ações na proporção de três para um. O prospecto da oferta também deve ser aprovado na assembleia da sexta-feira. Bernardo Ouro Preto e Victor Leal são acionistas fundadores do grupo – eles abriram o St. Marche em 2002.
Em 2016, os sócios venderam 52% da empresa ao fundo americano Catterton principalmente para reduzir endividamento e voltar a acelerar aberturas, numa operação de R$ 226 milhões. A empresa foi avaliada em pouco menos de R$ 500 milhões. Os acionistas brasileiros ficaram com a fatia restante. Naquele ano, eram 20 pontos do St. Marche no país e o plano era, após o aporte, atingir 60 lojas em 2022. Hoje, são 21 unidades, além de uma loja do Empório Santa Maria.
Segundo o relatório da auditoria da rede, a E&Y, publicado neste mês e assinado em 7 de julho, a companhia fechou 2020 com capital circulante negativo de R$ 228 milhões (ativo de curto prazo menor que o passivo) e patrimônio negativo de R$ 163,2 milhões, com prejuízos desde 2018.
A E&Y ressalta que a companhia concluiu haver “expectativa razoável quanto a sua continuidade operacional”, citando medidas já implementadas e em andamento. O auditor considerou “aceitável” o julgamento da administração.
Essas medidas são detalhadas, segundo o auditor, nas notas explicativas, que não foram publicadas junto com as outras peças das demonstrações financeiras. Um aviso informa que elas estão à disposição na sede do grupo.
A auditoria também chama a atenção – “ênfase”, no jargão – para a reapresentação das demonstrações de 2019 e 2018, para corrigir erros e aprimorar o material para que se possa avançar no registro da empresa.
Segundo as demonstrações publicadas, a venda líquida subiu 23% em 2020, para R$ 810,5 milhões, e o prejuízo foi de R$ 10,4 milhões, frente a perda de R$ 37,2 milhões em 2019 e de R$ 51,6 milhões em 2018.
Os empréstimos e financiamentos de curto prazo eram R$ 203 milhões, quase 19% acima de 2019. O caixa somava R$ 65 milhões, pouco mais que o dobro de 2019.
Nos comentários da administração sobre os resultados, a Hortus diz que, “pelo primeiro ano, no histórico recente, apresentou um resultado do lucro líquido ajustado positivo”, refletindo um “sólido resultado das entregas em 2020”, um ano em que a crise acelerou a venda de alimentos. A administração cita ainda que vem buscando reduzir alavancagem, e que o nível de endividamento havia diminuído no ano passado.
Ainda relata também que o conselho de administração aprovou, meses atrás, um plano para voltar a investir em lojas físicas e alcançar expansão “sustentável”. “Desta forma, esperamos adicionar 4 novas lojas, sendo 3 lojas da marca St Marche e a 2ª loja da marca Empório Santa Maria, atingindo 25 lojas ao final de 2021”, informou o comando em seus comentários.
Procurada ontem, a empresa não se manifestou.
No edital de convocação da assembleia, ao citar a Hortus, a empresa não menciona a operação do Eataly no país, negócio dos sócios brasileiros numa parceria com o grupo italiano dono da marca. A operação estava buscando outros sócios e uma nova capitalização, após o negócio – que inclui um braço de restaurantes – ter sentido o impacto do fechamento durante a crise, como relatou o Valor em abril. Os atuais acionistas fariam um aporte para dar algum fôlego financeiro e um novo parceiro injetaria recursos para a expansão.
Fonte: Valor Econômico