Acostumado a lidar com crises, o setor têxtil comemorou nesta semana bons resultados na balança comercial. Na região de Campinas, as importações diminuíram e a exportação aumentou nos primeiros seis meses deste ano em comparação com 2015. “O pior já passou”, diz o presidente do Sinditêxtil, Alfredo Bonduki.
Em entrevista ao LIBERAL, o empresário que dirige a entidade representante de empresas do setor no Estado, prevê que a recuperação das indústrias têxteis ocorrerá de maneira lenta. Dependerá, em grande parte, das variações cambiais e do tamanho do impacto que as mudanças políticas no país. “Os sinais que foram dados pelo presidente Temer foram bons”, afirma.
Segundo Bonduki, a sensação geral dos empresários é de que o pior já passou
Como foi o primeiro semestre do setor região em relação ao ano passado?
Estamos tendo uma queda de produção de 11% no acumulado deste ano, que vem depois de uma queda no ano passado no mesmo patamar. A sensação geral das empresas é que o pior passou e que já estamos no fundo do poço. A gente acredita que daqui pra frente, com uma estabilidade política e, consequentemente, econômica, você tenha uma retomada lenta da produção. Claro que isso vai depender muito também da demanda no varejo. O varejo tem apresentado queda devido à queda de renda causada pelo desemprego. Se a renda voltar a crescer, ainda que lentamente, o consumo pode puxar a produção da indústria.
No início do ano, o Sinditêxtil projetou o fechamento de mais de 12 mil vagas no Estado no setor têxtil em 2016. Já estamos na metade final do ano. Essa previsão vai se confirmar?
Sim. Infelizmente, a gente está com uma queda de produção, você não consegue manter o emprego. Muitas indústrias reduziram o turno de produção. As empresas têm que se adequar à capacidade de venda. Antes de contratar, elas começam a conceder horas extras. Depois é que ela vai se preocupar em criar um aumento de emprego definitivo.
Uma das grandes queixas do setor têxtil é a concorrência com os importados. A crise econômica levou o dólar às alturas, o que ajudou a frear as importações. Tem um lado bom na crise para os têxteis?
Tem. Em julho, a importação de vestuário caiu 55% com relação há um ano. Esse câmbio, talvez na retomada, ele possibilita um aumento da demanda mais rápido. Muitas empresas se tornaram competitivas na exportação, principalmente na cadeia do algodão. Isso já mostra uma reação, com aumento de 4% nas exportações da região. Essa queda da importação tem o lado ruim que é a importação de matérias-primas
No anuário de 2015 do Sinditêxtil, há um item que fala sobre a fiscalização de compras pela internet. Nos últimos anos, tem se tornado comum o brasileiro comprar em sites de fora do país. O Sinditêxtil cobra rigor e aprimoramento por parte da Receita Federal na fiscalização destas compras. Este tipo de comércio tem atrapalhado?
Tem sim. Existem três tipos de importações não mapeadas que nosso país tem. Essa é uma delas. Com o crescimento das redes sociais, da internet, é muito comum você comprar da China e receber em uma ou duas semanas. Esse é um risco muito grande. O segundo risco é a importação dos sacoleiros. Só no Aeroporto de Cumbica, chegou a entrar 50 mil toneladas de vestuário sem nenhum tipo de cobrança de imposto. A importação oficial de vestuário do ano passado foi ao redor de 100 mil toneladas. E o terceiro grande risco é o comércio ilegal, os standcenters – 25 de Março, o Brás. A Receita Federal tem intensificado o controle destas mercadorias, mas o volume é muito grande.
Nos últimos anos, o setor têxtil assistiu a uma desaceleração de investimentos, que, em grande parte, eram feitos com a ajuda de órgãos do governo federal, como o BNDES. Como o senhor avalia o tamanho e a eficiência dos investimentos públicos que são feitos hoje no setor?
O setor têxtil investiu no Brasil 2 bilhões de dólares, em média, nos últimos anos, entre importação de máquinas e financiamentos do BNDES. E São Paulo representa 40% desse investimento. O grande problema é que quando você tem uma indústria com ociosidade, você não tem o menor incentivo para se fazer novos investimentos. O BNDES devia seguir uma política industrial para o país traçada pelo governo, não só para alguns setores.
O setor têxtil se sente esquecido na agenda do governo?
Totalmente. A gente tem algumas coisas muito boas do governo, como o programa TexBrasil, mas são investimentos voltados para o segmento da exportação. Pela quantidade de empregos que o setor tem – 1,5 milhão de pessoas no Brasil –, acho que o governo deveria olhar com um pouco mais de carinho.
O Sinditêxtil e a Frente Parlamentar do setor, na Assembleia Legislativa, tentam implementar no Estado benefício relacionado ao ICMS para o varejo têxtil e de confecção, para tentar estimular compras de indústrias paulistas. Como funcionaria essa proposta?
Já faz 12 anos que o Sinditêxtil vem trabalhando na redução da carga tributária. O ICMS da indústria que já foi de 18% no Estado, foi reduzido para 12% e depois para 7%. A indústria conseguiu uma redução importante e ficou mais competitiva. Porém, no comércio não. O comércio recebe do Estado com um crédito de 7% e vende por 18% para o consumidor final. A carga tributária se deslocou para o varejo. A gente tem proposto mudanças na legislação que permitam que a indústria paulista fique mais competitiva na venda fora do Estado e iguale a competitividade dela para a venda no varejo no Estado.
Há temor de se perder indústrias paulistas para outros Estados?
Com certeza, principalmente na área de confecção, que é muito fácil e rápido de se mudar. E você tem ao nosso redor centros de confecção muito desenvolvidos e mão de obra disponível – o sul de Minas Gerais, o norte do Paraná, Santa Catarina. É muito fácil e conveniente ela sair do Estado e produzir em um Estado que tenha incentivos. O Estado tem apoiado, mas infelizmente os estados a nossa volta têm sido muito agressivos. São Paulo também terá que ser um pouco mais agressivo para diminuir a evasão de empresas do Estado.
A política atrapalha muito o setor têxtil?
A política atrapalhou muito o país, como um todo. O setor têxtil tem uma cadeia longa de produção e financiamento. Todo mundo fatura com prazos longos. Para você poder antecipar a produção você precisa ter uma expectativa. E a expectativa não foi boa nos últimos dois anos. A própria influência da Lava Jato, toda hora trazendo fatos novos, o problema do impeachment. A cada três quatro meses você tinha revisões piores para os números econômicos.
A efetivação da mudança de governo traz confiança ao Sinditêxtil?
Os sinais que foram dados pelo presidente Temer foram bons. Ele falava em não aumentar a carga tributária, porque as empresas não aguentam, tem falado em reduzir o tamanho do Estado, privatizar estatais ineficientes, melhorar a infraestrutura. Está faltando a sinalização de uma queda de juros, mesmo que seja a médio prazo.