Por Debora Almeida* | Homens e mulheres compram e consomem produtos de higiene pessoal, alimentos, roupas e carros. E também trabalham, dentro e fora de casa, e cuidam da família. Mas boa parte da publicidade veiculada no Brasil, e em outros países, não considera o homem como alguém que pode decidir como e o quê comprar.
Uma pesquisa feita pelo Kantar, intitulada “Conectando-se com os homens: como as marcas podem decodificar a masculinidade moderna”, analisou campanhas publicitárias de diferentes segmentos desde 2021 e investigou se os anúncios são direcionados para homens e mulheres ou para apenas um gênero. Em entrevista ao Valor, Miguel Vils, diretor de criativos e de análise de dados da divisão Insights da Kantar Brasil, afirmou que “existem diversas indústrias que ainda partem de uma lógica que o homem não é responsável por certas decisões e não deve ser envolvido no processo decisório de avaliação de comunicação”.
Na categoria de cuidados pessoais, por exemplo, 81% dos anúncios são somente para mulheres. Enquanto isso, 12% são para os dois gêneros e 8% são apenas para homens. Já no segmento de vestuário, 72% são para os dois gêneros, 24% apenas mulheres e 4% somente homens.
Nos anúncios de cuidados com a casa, 15% são para os dois gêneros, 85% apenas para mulheres e nenhum para homens. Ainda que as mulheres se dediquem mais às tarefas domésticas, os homens estão cada vez mais envolvidos nesse tipo de trabalho, conforme aponta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) de 2022.
De acordo com a PNAD 2022, as mulheres dedicam 21,3 horas semanais nas tarefas domésticas e/ou cuidados de pessoas. Entre os homens, a média é de 11,7 horas. No levantamento anterior, de 2019, as mulheres gastavam 21,6 horas por semana e os homens, 11 horas. Por mais que ainda exista uma grande diferença, a participação de homens na vida doméstica não reflete a presença masculina nas publicidades de cuidados com a casa.
A pesquisa da Kantar também analisou a publicidade de diferentes categorias no segmento de cuidados pessoais. Em cuidados orais, o público-alvo foi de 65% de mulheres e 35% dos dois gêneros. Para itens de cabelo, 84% somente mulheres, 8% somente homens e 8% os dois gêneros. Já em cuidados com a pele, 90% para mulheres, 3% para homens e 7% para os dois gêneros.
A Kantar fez uma pesquisa qualitativa com pessoas do Brasil, da Tailândia, da Turquia e dos Estados Unidos, em parceria com a Unstereotype Alliance, para avaliar como o público se vê representado na publicidade.
O estudo Brand Inclusion Index de 2024 revelou que 13% dos homens acharam que a representatividade masculina na publicidade foi negativa. Entre os homens LGBTQIA+, 20% se viram negativamente representados.
A pesquisa também investigou a percepção da representação negativa entre homens de diferentes gerações. Da Geração Z (18 a 27 anos) e dos Millennials (28 a 43), 16% se sentem negativamente representados. A percepção cai nas próximas gerações, sendo 7% entre os da Geração X (44 a 59), 3% dos “baby boomers” (60 a 78) e 1% da Geração Pós-guerra (79+).
A métrica de não estereótipo de gênero masculino do estudo mostrou que os anúncios que retratam homens em papéis progressistas têm melhor desempenho na construção da marca e nas vendas. Quando se trata de construir um valor de marca a longo prazo, o desempenho é de 37 pontos percentuais (p.p.) mais altos quando a representação é positiva. Quando consideramos a probabilidade de vendas a curto prazo, são 21 p.p. mais altos.
“As masculinidades plurais não são só uma questão social, mas também trazem benefícios financeiros para as empresas”, disse Vils ao Valor.
“A partir do momento que as marcas começam a explorar mais as figuras masculinas de maneira plural, a sociedade começa a ser mais aberta e refletir mais sobre isso”, disse Vils.
(*A repórter participa do Curso Valor de Jornalismo Econômico, sob supervisão de Cynthia Malta)
Fonte: Valor Econômico