Tecnologia e distribuição representam a maior linha de investimentos da rede varejista para o segundo semestre
Por Victoria Ghiraldi
O empresário João Appolinário, dono da varejista Polishop, é um personagem conhecido no meio empresarial há pelo menos duas décadas. Mas sua figura se tornou mais popular nos últimos seis anos, quando assumiu uma cadeira no programa Shark Tank, no canal Sony — um game show que ensina novos empreendedores a ter sucesso nos negócios. Com a pandemia, mais do que ensinar, Appolinário teve de aprender a colocar em prática suas cartilhas de gestão de sobrevivência empresarial. Todas as suas 261 lojas físicas, 99% delas em shoppings, tiveram de fechar as portas por três meses. Quando reabriram, não havia clientes suficientes para manter a companhia em pé. Mas a reestruturação do modelo de negócio garantiu que a Polishop atravessasse o período mais turbulento da tempestade. Hoje, 34 das unidades ainda sofrem com restrições no horário de funcionamento.
Como em uma aula prática no Shark Tank, Appolinário teve de fazer a lição de casa, principalmente aprimorando seus processos de logística. Segundo ele, a entrega era o exigia mais atenção. Por isso, os investimentos foram direcionados ao aumento da capacidade dos dois centros de distribuição, em Jundiaí (SP) e Itajaí (SC). “Apesar de ter a estrutura digital, 60% dos nossos estoques estavam nas lojas e nem todos os shoppings permitiam a retirada dos produtos”, afirmou Appolinário. “Além disso, sempre incentivamos essa retirada em lojas físicas para gerar experimentação e upselling [técnica comercial em que o vendedor incentiva o cliente a levar um produto superior ao que ele procura].”
Para se adequar ao novo momento, ainda de instabilidade, a rede varejista cortou pela metade os investimentos previstos ao ano, para R$ 25 milhões. O foco maior está em tecnologia e logística, totalizando aporte de R$ 10 milhões. A mesma quantia é destinada à reforma e realocação de lojas, e o restante à nova sede da empresa na capital paulista.
Essa priorização da rede varejista em logística aconteceu após a movimentação óbvia do consumidor que, sem lojas físicas, migrou para o e-commerce. Nesse caminho, a Polishop se saiu bem. Enquanto grandes e pequenas varejistas aceleravam a transformação digital, a companhia de Appolinário utilizava uma estrutura já consolidada e responsável por ajudar a amenizar o impacto da pandemia nos resultados financeiros da rede. Prova disso é que, no ano passado, a receita da empresa ficou 6% abaixo de 2019, quando foi estimada em R$ 1 bilhão pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC). Uma situação confortável, na opinião do fundador da rede.
Appolinário acredita que a baixa queda no faturamento foi compensada pela inovação e exclusividade dos produtos ofertados pela companhia. “Nosso grande diferencial é não vender produtos normais, como todos os varejistas”, disse o empresário. “Vendemos produtos que se tornam categorias”, afirmou, destacando as famosas fritadeiras elétricas AirFryer, da Philips Walita, e o George Foreman Grill.
Além da aposta antiga no digital e nos produtos exclusivos, a Polishop também saiu na frente em outro ponto. Tendência irreversível do varejo, o conceito omnichannel, está dentro da estratégia da empresa desde 2003, quando sua primeira loja física foi inaugurada. Quase duas décadas depois, Appolinário vê a movimentação do mercado por esse mesmo caminho como positiva. “Agora o consumidor está realmente no centro do negócio, e ele quer viver uma experiência nova na hora do consumo”. Ao surgir digitalmente em 1999, a companhia apostou em uma forma de comunicação que surpreendeu o mercado e atraiu muitos consumidores, por meio da criação de um canal próprio de televisão. Hoje, a empresa possui três estúdios próprios.
O diferencial da Polishop vai além desses pontos. É o que afirma o especialista em vendas Vinicius Pessin. “Eles trouxeram o conceito de showroom à loja e a transformaram em um local de experiência”, afirmou Pessin. Para ele, uma consequência do portfólio de produtos ofertado pela varejista. “Falar na televisão que o produto faz milagre é fácil, por isso a importância de deixar o consumidor testar.” Essa experimentação ganhou ainda mais espaço no mercado varejista com o crescimento do omnichannel, principalmente pós-pandemia. Uma bola já cantada por Appolinário.
COMPETITIVIDADE Tardia, a chegada da concorrência em terrenos já conhecidos pela Polishop não assusta o empresário. Appolinário diz não se preocupar com a concorrência, principalmente do mercado chinês, porque só produtos de sucesso são copiados. “Preciso parar de me preocupar se pararem de me copiar.” Mas um ponto incomoda o empresário. Para ele, com a ampliação do e-commerce, o caminho que deveria ser de praticidade, conforto e informação acabou virando destruição do valor, do preço baixo e do desconto. “Hoje vemos sites brigando com lojas físicas da mesma marca, isso é destruição de valor”, disse o executivo.
Uma linha de pensamento que condiz com a avaliação do presidente da Associação Brasileira de Lojistas de E-commerce (Ablec), Rodrigo Nakagaki. “Foi um movimento mal condicionado ao longo do tempo, com opções de parcelamento, frete grátis e descontos que diminuem a margem para o lojista”, afirmou Nakagaki. Com a maior competitividade, mais alto fica o custo de divulgação on-line, conhecido como Custo por Clique (CPC). “Ao contrário do que propagam, o e-commerce acaba possuindo custos maiores em comparação ao comércio físico.”
Mesmo com a concorrência mais acirrada com a digitalização, a Ablec estima que o e-commerce brasileiro continue crescendo. No comparativo de 2020 com o ano anterior, a alta foi de 41%. Para este ano, a expectativa de crescimento está entre 15% a 20% em relação à 2020. Uma solução para reduzir o impacto da concorrência, segundo Nakagaki, está na aposta por produtos próprios. Uma lição de casa que Appolinário já fez.
Fonte: IstoÉ Dinheiro