A estratégia da gestora Vinci Partners para a rede de pizzarias Domino’s no país deve seguir parte da cartilha do Burger King, cadeia de fast-food cujo um dos maiores acionistas também é a Vinci. Entre as táticas planejadas estão o aumento imediato na exposição da marca na mídia em São Paulo e a ocupação, com lojas próprias, de áreas com alto fluxo de clientes, apurou o Valor.
Por meio de um fundo, a Vinci concluiu na semana passada a transação para assumir o controle da Domino’s no país, até então nas mãos do Grupo Trigo, por R$ 250 milhões, segundo uma fonte a par da negociação. O projeto prevê abrir 500 unidades em cinco anos, com investimento total de R$ 250 milhões, apurou o Valor. A Vinci é a gestora e cotista do fundo.
A média projetada de 100 inaugurações por ano é cinco vezes maior que a atual, de 20 aberturas, em média, a cada ano. A rede tem 218 unidades no país.
O foco será a operação de entrega (“delivery”), instalada em lojas com baixa metragem e custos fixos menores. O plano prevê volume bem menor de unidades no formato de restaurante. Isso deve manter o investimento por loja na faixa de R$ 500 mil, em média.
O novo controlador definiu que Carlos Eduardo Martins, sócio da Vinci, comandará a operação como CEO. Procurada para comentar as informações apuradas, a gestora não se manifestou.
De acordo com o plano obtido pelo Valor, ao menos em termos de expansão orgânica, a Domino’s não deve bater tão de frente com a Pizza Hut, segunda maior rede de pizzarias dos Estados Unidos, atrás exatamente da Domino’s.
A Pizza Hut prevê abrir 700 lojas no Brasil até 2023, a maior parte franquias. A operação é administrada desde janeiro pela Mult-QSR, empresa do Grupo Sforza, do empresário Carlos Wizard Martins. O foco está em unidades de 120 m2 a 200 m2 e investimento inicial de R$ 750 mil, informou a companhia ao Valor em julho. São previstas apenas 35 novas lojas próprias em cinco anos, equivalente a cerca de 5% do total projetado.
Na Domino’s, a intenção é que entre 25% a 30% das inaugurações sejam de unidades próprias, em terrenos mais estratégicos, e entre 70% e 75%, de franquias.
Hoje a Domino’s obtém metade de suas vendas com o “delivery” e a outra metade com o consumo dentro das lojas. Com o foco em unidades menores para entregas, essa proporção deve mudar. A ideia é que entre 75% a 85% das vendas ocorram pelo delivery.
Uma das principais dificuldades, nesse caso, é reduzir as falhas no sistema de entrega. A venda pela internet sofre com instabilidades e há reclamações sobre qualidade do produto e do serviço, dizem franqueados ouvidos pelo Valor. A empresa deve importar o sistema usado pela rede nos EUA.
O fundo criado para os investimentos na Domino’s está em fase de captação. Foram obtidos até agora R$ 1,5 bilhão. A intenção é atingir R$ 3 bilhões, mas essa soma não será toda destinada à rede. Outros ativos de varejo e serviços, ainda em fase de prospecção, devem fazer parte do portfólio do fundo.
Nos últimos meses, a Vinci chegou a analisar assumir a operação de outras redes de alimentação no país, como Starbucks Brasil (da gestora brasileira SouthRock), Taco Bell e a própria Pizza Hut.
A Domino’s fica no terceiro fundo FIP aberto pela gestora. Além dele, há o Vinci Capital Partners II B FIP Multiestratégia, com 13,3% da BK Brasil, master franqueado da rede de hamburguerias.
No total, serão desembolsados para a rede de pizzarias R$ 500 milhões, que saem do fundo – R$ 250 milhões na aquisição e R$ 250 milhões nas aberturas em cinco anos.
Para melhor uso dos recursos, ficou definido que o investimento de marketing se concentrará na região das inaugurações – inicialmente em São Paulo, onde um terço das pizzarias do país estão localizadas, e depois no Rio de Janeiro e Minas Gerais. Atualmente, apenas 7 das 218 lojas são próprias.
O Valor apurou que o novo controlador conta com uma alta inicial de despesas e queda na margem Ebtida (referente ao lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização) devido ao ritmo mais acelerado de aberturas.
Com a entrada da Vinci na rede, a comparação com Burger King é inevitável, nas semelhanças e nas diferenças.
A gestora entende que a Domino’s terá, proporcionalmente, sempre mais franquias que a BK Brasil, até pela força do “delivery”. Além disso, se na BK existiram grupos franqueados relevantes, na Domino’s nenhum tem mais de 20% dos pontos.
Entre as similaridades, assim como na BK Brasil, na rede de pizzarias acredita-se que manter um volume de pontos próprios potencializa a força da marca.
Pesquisa com respostas espontâneas feita pela Domino’s mostra que só 30% dos consumidores conhecem a cadeia. A ideia é que lojas próprias em áreas de alto fluxo podem vender mais e contribuir para aumentar os recursos disponíveis no fundo de marketing – que é composto por uma contribuição de todos os lojistas.
Um encontro entre franqueados e o comando da Vinci ocorreu semanas atrás, com o intuito de tranquilizar os investidores. “Eles explicaram que não querem sair por aí comprando nossas lojas, e que a intenção é não abrir mão das franquias”, disse um franqueado.
Na negociação com o Grupo Trigo, em determinado momento a Vinci tentou comprar também a rede de massas Spoleto e a japonesa Koni, mas não houve acordo.
No Brasil, as lojas próprias e uma fábrica de massas da Domino’s faturaram R$ 120 milhões em 2017, e o sistema total (franquias, fábrica e unidades próprias), R$ 330 milhões. Em vendas “mesmas lojas” (em operação há mais de um ano), a rede cresceu 12% de janeiro a junho de 2018, e no acumulado de 2017, 3%. A previsão para 2018 é expansão na receita de 20%.
Gestores da Vinci não veem uma competição tão direta entre Domino’s e Pizza Hut, da mesma forma que há entre Burger King e McDonald’s. Não só porque a Domino’s deve focar no “delivery”, negócio menos representativo na Pizza Hut, mas também porque entendem que terão que competir mais duramente com redes de pizzarias regionais – mais consolidadas e com clientes fiéis.
De qualquer forma, as duas cadeias são referências mundiais e disputam um segmento pouco consolidado, com baixa barreira de entrada e agressiva disputa de preços. A Domino’s oferece pizzas grandes a R$ 39,90 (incluindo o litro de refrigerante). A Pizza Hut, por sua vez, está apostando na promoção de “superfatia” por R$ 7,50.
Não há dados sobre participação de mercado das duas cadeias americanas no país. Há 36 mil pizzarias no Brasil, segundo a Associação Pizzarias Unidas do Estado de São Paulo, com faturamento bruto anual de R$ 22 bilhões.
Fonte: Valor Econômico