O reajuste de contratos de aluguel com base no IGP-M deve ser mais uma razão para que o varejo se movimente neste ano, mas não a única
Por Paulo Gratão
O ano já começa com ainda mais desafios para os varejistas: fim do auxílio emergencial, aumento no desemprego e reajuste de aluguel com base no IGP-M são alguns deles. Qualquer previsão para 2021 é rodeada de incertezas, principalmente no que se refere a canais de venda e comportamento de consumo. Com a renda comprometida, é difícil prever se o consumidor manterá os hábitos adquiridos ao longo de 2020 – mas o cenário dá algumas pistas de como será o futuro do varejo.
O consultor Luiz Alberto Marinho, explica que, mesmo que os primeiros meses do ano ainda sejam difíceis, o varejista tem razões para esperar por um 2021 mais animador, com a iminência da vacina e a retomada da confiança do consumidor.
O especialista lembra que, em 2020, munido de crédito ou do auxílio emergencial, o cliente mostrou predisposição para consumo, principalmente em serviços considerados essenciais, como supermercados e farmácias, mas também no comércio eletrônico, que engloba o delivery de alimentos e teve resultados históricos. Esses fatores precisam ser considerados ao se pensar na reestruturação dos pontos de venda para os próximos meses.
A pandemia ajudou a acelerar algumas tendências que já eram apontadas para o varejo havia alguns anos, como a omnicanalidade e o avanço do uso de tecnologia nas lojas físicas – e não somente o e-commerce. “O melhor exemplo é o WhatsApp, o que chamamos de um CRM na palma da mão do vendedor”, comenta o presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra.
De acordo com Terra, o modelo de loja que abre e espera pela chegada do consumidor está fadado ao fracasso. “Ela tem que abrir e imediatamente ativar clientes por meio de recursos digitais. Trazer quem está em casa, na rua ou no trabalho. As lojas físicas vão virar bases de trabalho e de mercadoria para ativação de clientes.”
Dessa forma, a metragem dos pontos deve ser repensada ao longo do ano. Para negócios que tenham essa característica, não haverá mais necessidade de uma loja espaçosa para apenas armazenar produtos. No entanto, a experiência continua viva no setor, agora considerado questões de higienização e touchless (sem toque), principalmente em estabelecimentos que se mantiverem em espaços vistos como entretenimento, como shopping centers. Será preciso encontrar esse equilíbrio.
Valorização da proximidade
O home office mudou a rotina dos escritórios e de estabelecimentos que dependiam totalmente de fluxo em áreas comerciais. Isso também deve levar ao surgimento de novas operações em regiões mais residenciais em 2021.
“Veremos a valorização do comércio ou polo comercial que tem um entorno mais adensado. Isso favorece formatos como strip malls, galerias e algumas operações que estão em rotas de deslocamento, como terminais de ônibus e metrôs, ou postos de gasolina. Todos esses modelos tendem a ganhar espaço nesse momento”, afirma Marinho.
Shopping centers devem passar por mais transformações
O primeiro desafio do ano para muitos varejistas foi a correção em contratos de aluguel com base no IGP-M de 2020, que superou 23%. Apesar disso, os especialistas não acreditam que haverá uma “debandada” de lojistas dos shopping centers, que costumam ter custos de ocupação mais elevados, mas sim readequações. Terra diz que, passadas as vendas de Natal e início de ano, o que se espera é uma grande movimentação entre os pontos de venda.
Marinho explica que, há algum tempo, o shopping center deixou de ser um polo de compras para se tornar um espaço de lazer e experiência, que por acaso também tem opção de compras. “Nessa mudança de perfil e de função, para alguns varejistas talvez nem seja tão vantajoso estar no shopping center.” De acordo com o especialista, se o custo de ocupação for mais de 10% do faturamento da empresa, é hora de repensar a localização. Lojas menores e com faturamento focado apenas em vendas de produtos tendem a ir para espaços alternativos ou para pontos de rua, enquanto os shopping centers devem abrigar cada vez mais opções voltadas para o entretenimento. Na prática, fast-foods devem perder espaço para food halls ou restaurantes, por exemplo, de acordo com o especialista.
Por outro lado, os centros de compra serão ainda mais atrativos para empreitadas da indústria no varejo. Empresas que querem se aproximar do consumidor final, mas manter o filão de vendas no online, terão no shopping center uma opção viável para aumentar o cadastramento de prospects. “Nós vamos ver cada vez mais lojas focadas em experiência e uma predominância de operações que vão usar as marcas para, inclusive, ser um hub logístico avançado”, comenta.
A logística sempre foi apontada como um dos maiores gargalos para o avanço do e-commerce no Brasil. Em 2020, com o crescimento compulsório nas estratégias de omnicanalidade e no surgimento de novos operadores logísticos, essa barreira começou a ser vencida.
No entanto, na visão de Marinho, a pandemia tem aumentado a diferença entre as empresas maiores e estruturadas e os pequenos varejistas. O próprio omnichannel é uma prova disso, pois é uma modalidade que demanda volume para ter resultados financeiros significativos. “O pequeno, de alguma maneira, é quem está mais vulnerável em toda essa revolução que estamos assistindo, e será quem mais precisará de apoio.”
Fonte: PEGN