Nos últimos anos, está sendo cada vez mais comum o lançamento de propagandas defendendo causas e levantando bandeiras sociais. Questão de gênero, raça, orientação sexual, desigualdade social… motivos não faltam.
Ao mesmo tempo em que essa exposição ajuda a aumentar o debate de casos importantes, é necessário tocar cuidado com o oportunismo que essas discussões podem gerar. Essa é a opinião de André Lopes, diretor de negócios da Ben & Jerry’s no Brasil.
“Os consumidores exigem que as marcas tenham esse lado social”, diz Lopes. “Mas o discurso precisa funcionar internamente para virar um ponto de vista externo”.
A sorveteria Ben & Jerry’s entende bastante do assunto. Afinal, desde 1985, sete anos depois da sua criação, a empresa mantém uma fundação que recebe cerca de 7,5% do lucro total da companhia. A meta é ajudar projetos sociais em todos os lugares do planeta.
E de lá para cá, a companhia fundada pelos americanos Jerry Greenfield e Ben Cohen após terem feito um curso de sorvete por correspondência, se engajou em todo o tipo de causa que julgava importante. Houve campanhas contra a utilização de hormônio de crescimento em vacas, a favor de um maior apoio à agricultura familiar, por investimentos na educação infantil e, principalmente, à causa gay.
Ações a favor dos direitos dos homossexuais foram, inclusive, tropicalizadas com o jeitinho brasileiro. Em junho de 2015, o casal de brasileiros formado por Nicolas Veras e José Antônio Freitas oficiou o matrimônio na primeira loja da marca no Brasil, localizada na rua Oscar Freire, em São Paulo. A Ben & Jerry’s organizou tudo e convocou até a cantora Gretchen para celebrar a festa.
A marca também vem acelerando a sua expansão no país. A Ben & Jerry’s estreou no Brasil em 2014 e deve encerrar esse ano com 21 unidades abertas. A meta, a partir do ano que vem, é inaugurar de 15 a 20 lojas próprias por ano.
Na entrevista a seguir, Lopes fala sobre o trabalho social da Bem & Jerry, que é controlada pela Unilever desde o ano 2000, e detalha os planos de crescimento para o Brasil. O diretor também debateu sobre os assuntos no fórum Futures, organizado pela WGSN.
Como você enxerga o atual momento da propaganda, que vem levantando diversas bandeiras?
Quando se importamos com uma causa, é sempre bom dividir com os consumidores. Há uma parte das empresas que busca proximidade com o consumidor, outras que realmente acreditam naquilo que propaganda, mas também existe a questão do modismo ou até mesmo oportunismo. Há um impacto nos negócios quando falamos a respeito do meio ambiente e do consumidor.
Por que você enxerga esse oportunismo nas marcas?
É uma realidade mercadológica. Os consumidores vêm exigindo que as marcas tenham o seu lado social. Aquelas empresas que não tinham esse costume, precisam adequar os seus discursos. Os clientes já estão com um nível alto de exigência. Mas o discurso precisa funcionar internamente para virar um ponto de vista externo. Anteriormente, as empresas pensavam que se tratava apenas de comunicação, mas agora elas estão buscando.
E quais são as dificuldades desse processo? Como a Ben & Jerry’s decidiu se posicionar sobre esses tipos de temas?
É até engraçado que muitos falam que é preciso cuidado para entrar em temas como sexualidade e meio ambiente. Muitos têm medo de abordar esses temas. Como a nossa bandeira é 100% legítima, não temos nenhum receio. A marca surgiu muito próxima do consumidor e a defesa das causas não foi algo pensado, mas consequência das decisões.
Como funcionou?
Os dois fundadores eram duas pessoas falidas, de esquerda e que não acreditavam no mundo dos negócios. Quando eles viram que a empresa estava dando certo, perceberam que o segredo não era o sorvete, mas a proximidade com o consumidor. E as causas foram uma questão natural do que eles acreditaram. Não somos uma empresa de bandeiras, mas de causas. Em 1988, por exemplo, eles já davam benefícios para casais do mesmo sexo. Para eles, todos os casais sempre foram iguais.
E qual o papel da iniciativa privada nesse progresso da sociedade?
Externalizar ainda mais essa demanda do consumidor. Enxergamos os nossos clientes como multiplicadores de ideias. Tentamos fornecer a nossa voz para que eles se tornem ativistas e demandem mudanças na sociedade. Acreditamos em uma causa maior, que é o progresso da sociedade como um todo. Também enxergamos um papel transformador que as pessoas e empresas possuem. Se eu começar a procurar melhores fornecedores, passar a produzir de maneira ecologicamente correta, o consumidor vai demandar mais por produtos assim.
A empresa foi comprada pela Unilever no ano 2000. Todos os ideais permaneceram mesmo após a aquisição?
Ben & Jerry’s sempre teve fins lucrativos. Sempre tivemos interesse em vender mais, pois temos certeza, com o nosso modelo de negócio, podemos impactar de maneira positiva o meio ambiente e a sociedade. Quanto maior o nosso lucro, maior o dinheiro investido. A Unilever tem a responsabilidade de expansão, mas os ideais são os pilares da marca. Temos a mesma essência desde sempre.
E como se posicionar em momentos tão intolerantes como os atuais?
Nossa principal fortaleza nesse quesito não é um posicionamento de marca ou de comunicação, mas de essência. Não temos outra forma de ser. A Ben & Jerry’s sempre trabalhou por ter um mundo mais justo. Falamos que todos precisam amar todos e acreditamos cada vez mais que esses “haters” vão mudar com o tempo.
Quais são os planos de expansão da marca no Brasil?
Em agosto, estamos inaugurando duas lojas em Brasília e outras duas em Belo Horizonte. Até o final do ano também estrearemos em Fortaleza, Curitiba e Salvador. Queremos fechar 2017 com 21 lojas e abrir cerca de 15 a 20 unidades por ano, sendo todas elas próprias.
A expansão será sempre baseada em lojas próprias?
Por enquanto, sim. Nossa ideia é lançar a sorveteria para ser um ponto de apresentação da marca em uma cidade, criar uma reputação e depois lançar as nossas embalagens em padarias e supermercados da região.
Fonte: Novarejo