Companhia nasce com 46 milhões de clientes, 1707 lojas e valor de mercado de R$ 77 bilhões; incorporação deve ocorrer em até 40 dias
Por Maria Luíza Filgueiras e Luiz Henrique Mendes
O trio Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira vai levar mais uma de suas companhias para o mercado americano. Desta vez, quem vai para a vitrine global é a que tem o nome de berço para isso – a varejista Lojas Americanas. Nos EUA, a listagem não será da companhia operacional, mas de um veículo de controle. No Brasil, a companhia listada reunirá ativos digitais (B2W) e físicos da varejista.
As companhias comunicaram ontem a estrutura proposta para integração de seus negócios, aprovada ontem pelos dois conselhos de administração, e em estudo desde fevereiro. A B2W vai ser rebatizada de Americanas S.A., para manter a marca mais forte do grupo, e incorporar as lojas físicas da Americanas. A BTWO3 passa a ser AMER3 na bolsa, listada no Novo Mercado.
Cada acionista de Lojas Americanas receberá 0,18 ação da AMER3, também mantendo seus papéis na companhia original, agora não operacional. As ações ordinárias e preferenciais da LAME terão a mesma relação de troca para AMER – uma vez que, na prática, a companhia está cedendo sua operação à B2W e os acionistas teriam um equivalente de tag along. Ou seja, quem tem 100 ações LAME3 ou LAME4, continuará com elas e mais 18 ações AMER3.2 de 2
“No fim, é uma transação de M&A, com uma parte sendo cindida e incorporada por outra companhia, que emite ações para pagar essa parcela de negócio que ela recebendo e essas ações pagam os atuais acionistas de Lasa, que eram os donos desses ativos”, explica Fábio Abrate, diretor financeiro e de relações com investidores da B2W.
A estrutura parece complexa à primeira vista, mas tem explicação simples. Numa incorporação total pela B2W, os controladores de Lojas Americanas seriam muito diluídos, perdendo essa posição de controle – ficando com cerca de 30% do capital. Com o veículo, conseguem mantê-lo.
Na estrutura proposta, Lemann, Sicupira e Telles terão, juntos, 14,43% das ações da ‘nova B2W’, além da participação indireta via Lojas Americanas. Com isso, ficarão com 53,4% do capital votante. Na listagem nos Estados Unidos, a estrutura terá super voting shares.
“A cultura de dono foi implementada pelos nossos acionistas de referência em 1982, quando entraram na companhia. Foi o que nos conduziu até aqui e é nosso norte para o futuro, acreditamos em companhia de dono e essa estrutura endereça isso”, diz Abrate.
A primeira etapa da operação, com a incorporação dos ativos operacionais da Americanas pela B2W, deve ocorrer em 40 dias. A segunda fase, com a listagem do veículo de investimentos nos Estados Unidos – a Americanas Inc – pode acontecer em até um ano, segundo as companhias.
As companhias somam valor de R$ 77 bilhões em bolsa. A Americanas S.A. já nascerá gigante, com 46 milhões de clientes ativos, 1.707 lojas, plataforma digital, a fintech Ame e uma plataforma de logística com capilaridade nacional. A companhia usará a grafia em letras minúsculas, americanas sa, na sua comunicação com o consumidor.
Como quem absorve a operação é a B2W, a companhia pode fazer uso de seus créditos fiscais, que somam R$ 2,8 bilhões. A estrutura será em duas etapas, primeiro com o arranjo operacional, que tem que ser aprovado em assembleia em 10 de junho, depois com a listagem do veículo americano.
A fusão deixa o negócio mais comparável à Magalu e Via (ex-Via Varejo), colocando a companhia resultante na liderança de volume de vendas e na projeção de crescimento de receita – as estimativas de ritmo de expansão de Ebitda, por enquanto, estão mais alinhadas nas projeções do mercado com Via, um pouco atrás de Magalu em ritmo. Mas os analistas ainda vão refazer as contas com os dados atuais de estrutura de negócio.
Os planos são continuar o crescimento orgânico, inclusive no varejo físico (as lojas estão hoje em pouco mais de 750 cidades e a empresa acha que tem espaço para estar em mais de 2 mil, além de manter o crescimento inorgânico também nas duas frentes, digital e físico. Na semana passada, por exemplo, a Americanas comprou o grupo de franquias Uni.Co, dono das marcas Imaginarium e Puket.
“A nova companhia será mais poderosa e mais valiosa do que a combinação das partes, pois representará o resultado de uma soma contínua, um novo ecossistema totalmente integrado para gerar valor”, disse a companhia em comunicado. A empresa defende seu novo modelo em cinco pilares: efeito de rede, tecnologia proprietária, economia de escala, marca reconhecida, e uma plataforma de fusões e aquisições mais forte.
Como empresas separadas, quando a Americanas vai comprar uma farmácia, por exemplo, precisa discutir com a B2W a operação digital – o que complica o processo. A integração também tira as limitações de partes relacionadas.
“A primeira etapa já endereça os três primeiros objetivos dessa operação e com entrega rápida, que a gente coloca de pé em 40 dias”, diz Abrate.
As companhias tinham anunciado o início de estudos para fusão em 19 de fevereiro – o que fez a ação ordinária da Lojas Americanas disparar 40%, pelo entendimento que a estrutura da fusão passaria por sua incorporação, aproveitando os créditos fiscais da B2W. A projeção do mercado é que seria uma incorporação integral – o modelo apresentado ontem não estava no radar.
O departamento de Abrate terá uma quinta-feira agitada – as ligações de analistas e investidores começaram ontem mesmo, buscando entender a estrutura para fazer seus cálculos e projeções.
Para chegar a esse formato e à relação de troca, as companhias criaram um comitê com sete executivos, sendo três conselheiros independentes, com assessoria financeira do Credit Suisse e jurídica do Yazbek Advogados. A proposta também foi submetida aos conselhos fiscais.
Fonte: Valor Econômico