A acelerada expansão de lojas da marca Swift, da JBS, incomodou o varejo e supermercadistas decidiram questionar a processadora de carnes a respeito dessa atuação direta no comércio. A Associação Paulista de Supermercados (Apas) recebeu reclamações de associados e iniciou discussões com a empresa. Os contatos foram feitos por uma comissão formada por diretores da Apas, mas as redes têm se organizado individualmente para negociar com a JBS acordos envolvendo a Swift que sejam “comercialmente interessantes para as partes”, diz um diretor de rede.
As discussões por intermédio da Apas começaram há cerca de um ano. Mas, considerando a sensibilidade do tema, medidas práticas só avançaram nas últimas semanas. Estão na comissão membros da diretoria da Apas, que inclui executivos do Grupo Pão de Açúcar, Carrefour, Walmart, Savegnago e Lopes. Redes médias, do interior de São Paulo, que têm sentido a concorrência da Swift, também fazem parte das negociações.
“Quem entende de varejo somos nós, somos 6% do PIB e abastecemos 85% dos lares. Não queremos interferir no negócio deles, e nem temos esse poder, mas a questão chegou à mesa diretora da associação e temos que levá-la adiante […]. É uma obrigação nossa defender o setor”, disse Omar Ahmad Assaf, vice-presidente da Apas.
A principal crítica envolve a expansão no comércio de uma marca de um fornecedor de peso, com longa parceria com as varejistas – a empresa inclusive opera com vans vendendo carnes em condomínios. Mas o que incomoda especialmente o varejo, já há alguns anos, é o fato de a JBS ter “isolado” a Swift como uma marca exclusiva para as lojas da empresa no segmento premium, sem venda aos supermercados. Há hoje uma oferta limitada de marcas para esse segmento para as classes A e B.
Na Swift, há um entendimento diferente: a expansão pelas lojas próprias foi uma forma de iniciar um trabalho com a operação de carnes congeladas, segmento pouco trabalhado pelos supermercados. “Era preciso apresentar a marca ao cliente, mostrar as características, explicar a diferença em relação à carne fresca. Não é algo que daria para se fazer nos supermercados. Hoje, com essa base maior de lojas da Swift, e entendimento melhor da marca, é possível olhar para o varejo e pensar em acordos”, diz uma fonte próxima à JBS.
Pode ser negociada, por exemplo, a venda de linhas da Swift em pontos estratégicos das gôndolas ou em estandes nas áreas dos açougues. Um modelo que começa a ser testado discretamente pelas grandes redes, fruto dessa negociação é a instalação de loja da Swift dentro dos supermercados, a chamada “store in store”.
Neste mês, o Carrefour começou a testar uma “store in store” da Swift numa unidade Express em São Paulo, confirmou a rede. No GPA haverá “store in store” da marca neste primeiro semestre em lojas do Extra e Pão de Açúcar. No momento, a Swift deve testar de 3 a 4 lojas pilotos com o novo formato até metade do ano, diz uma fonte.
O aspecto sensível das conversas com as redes hoje trata de como operar e distribuir o produto. A Swift propõe gerenciar toda a área usada para vender a carne nas lojas, por se tratar de um produto que perde qualidade caso descongele no processo de distribuição.
A proposta da empresa é administrar uma “área dedicada”, com funcionários contratados pela JBS e equipamentos próprios. “Se a rede entender isso, o acordo avança, mas se quiser só colocar a marca lá, não vamos ficar”, diz uma fonte ligada à Swift. E para isso, um contrato comercial específico precisa ser definido entre as partes – no passado, a loja alugava uma área às marcas que se instalavam nas lojas, mas esse não será o caso da Swift. Nenhuma das partes, mesmo sob sigilo, abriu detalhes desse contrato ao Valor.
No auge das discussões, o Valor apurou que a Apas levantou a hipótese de que a JBS fechasse os pontos da Swift e, se isso não avançasse, as redes poderiam reavaliar acordos de fornecimento das marcas da JBS. Parte da diretoria da entidade foi a favor e parte contra essa posição. A Apas não confirma a informação. “O que queremos é que eles internalizem nos nossos supermercados os pontos que pretendem abrir”, diz Assaf.
Segundo fonte a par do assunto, a JBS entende que deve haver uma natural redução de aberturas se os acordos com o varejo avançarem. Hoje há 87 lojas da Swift em cerca de 20 municípios – mais da metade estão na cidade de São Paulo. Só em 2017, foram abertas 30 lojas da marca. Para efeito de comparação, enquanto os supermercados Pão de Açúcar tem 100 lojas na capital paulista, com 100 açougues, a Swift abriu quase 50 pontos na cidade em menos de dez anos.
Segundo fontes, na JBS, é o ex-executivo do GPA, José Roberto Tambasco, há dois anos na JBS, à frente da operação da Swift, que vem participando das conversas.
Em março de 2017, quando as conversas estavam em seu início, lideradas pela Apas, aconteceu a operação “Carne Fraca”, que fragilizou a imagem das processadoras de carnes no país. Na época, o varejo foi questionado se manteria a venda de produtos da JBS e BRF. Questionada se esse episódio, e a manutenção das marcas da JBS nas prateleiras, entrou como fator de negociação com a empresa, a Apas nega. “Não trazemos questões éticas como ponto de negociação ou fazemos qualquer associação desse tipo”, diz Assaf.
Há uma relação de dependência entre o varejo e os processadores de carnes – o varejo é muito mais pulverizado, em parte pelo limitado número de marcas com capacidade de atender em grande escala.
O avanço da Swift no varejo ocorre ao mesmo tempo em que a empresa pôs na rua a estratégia para entrar na operação de açougue de supermercados. É um negócio diferente deste com a Swift. Nele, a loja dá um espaço específico para a JBS expor só marcas do grupo – que por sua vez dá suporte para a rede, ajudando na estratégia, como na exposição das marcas. Há um ano, a JBS disse que eram quase 600 lojas operando com esse acordo no país. Atualmente, GPA e Carrefour somados têm 635 supermercados e hipermercados (sem contar minimercados) e a maioria têm açougue.
Procurada, a JBS informou que que “tem como diretriz estratégica trabalhar em parceria com seus clientes para oferecer soluções inovadoras, com a mais alta qualidade de produtos e serviços”, diz. “Dentro da sua estratégia de inovação, a empresa foi a primeira do setor no Brasil a oferecer proteína bovina porcionada com congelamento ultra rápido e controle de ponta a ponta de toda a cadeia de frio.” E prossegue afirmando que “a marca oferece uma experiência diferenciada com uma solução completa de proteínas que alinha qualidade, padrão de cortes, serviço, conveniência e informação aos consumidores”. A empresa vê “alto potencial de expansão junto ao varejo supermercadista.”
Fonte: Valor Econômico