Ele se formou em publicidade e jornalismo. Depois de trabalhar em incontáveis lugares, foi em um pós de marketing digital no Rio de Janeiro, sua cidade, que o carioca André Carvalhal se achou na vida. Hoje, além de coordenador e professor do curso de moda do Insituto Europeo di Design, é o cabeça por trás do marketing da FARM, marca carioquíssima e um case bem-sucedido de como imprimir uma nova maneira de trabalhar conteúdo nas redes sociais.
Ah, além disso, o livro do André, “A moda imita a vida” entrou para a lista dos 10 títulos de negócios mais vendidos de 2015. Dentro de todo esse currículo, a grande sacada do gerente de marketing foi associar à FARM um estilo de vida, compartilhar imagens produzidas pelas próprias clientes e, ainda, criar o primeiro blog feito por uma marca no Brasil.
Em uma passadinha por Porto Alegre, Carvalhal contou um pouco de como chegou até onde está em sua carreira, explica algumas dificuldades de se fazer social media e faz projeções para o futuro do branding:
Correio do Povo: Olhando para trás na sua carreira, qual foi o maior diferencial que fez você chegar até onde está agora?
André Carvalhal: Acho que foi quando eu fiz uma pós de marketing digital. Foi a primeira turma de marketing digital que teve no Rio de pós-graduação e isso há dez anos, quando a internet estava começando a surgir. Ali eu entendi qual seria a minha onda, que era trabalhar juntando conteúdo, tecnologia e a própria internet. Atuar na internet foi uma coisa que mexeu muito comigo. A partir dali eu comecei de verdade a definir o que eu ia fazer. Aquilo que definiu de fato o que que eu queria fazer da vida.
CP: Hoje é quase obrigatório que uma marca tenha presença nas redes sociais. Onde você acha que as marcas erram mais quando fazem social media?
Carvalhal: Ainda é um desafio muito grande. A gente ainda tá engatinhando nisso, a gente ainda tá aprendendo. A internet virou um lugar sem limites, onde as pessoas podem falar tudo, fazer de tudo – tanto as marcas quanto o público. Ninguém ainda conseguiu entender esse poder, como lidar com esse poder, qual o limite que existe. Porque de fato tem que ter algum limite. Eu acho que essa ainda é a grande dificuldade, sabe? O entendimento tanto das marcas quanto das pessoas do poder que elas têm no meio digital.
CP: Quando acontecem coisas que movem muito as pessoas, como foi a tragédia de Mariana, algumas marcas têm se posicionado e se envolvido. Como você vê isso?
Carvalhal: Quando isso é verdadeiro, é legal. De fato, apesar de toda a dificuldade, a internet traz muita facilidade com isso. Da sua casa, você pode agitar no Brasil inteiro pessoas para ajudarem Mariana. Ela [a internet] abre muitas possibilidades pra gente. Eu acho muito maneiro quando as pessoas usam essas possibilidades de uma maneira positiva, de uma forma transformadora. Mas eu acho que a transparência também que a internet proporciona acaba gerando uma responsabilidade das marcas fazerem com verdade, porque senão as pessoas vão criticar e enfim, tá muito exposto. A marca vai fazer achando que tá arrasando, as pessoas vão lá e vão criticar e o tiro sai pela culatra. A internet é esse lugar onde as marcas tão experimentando isso. Antigamente você fazia sei lá, um anúncio, que era uma mentira, com uma imagem toda “photoshopada” e aquilo ia para uma revista – as pessoas conversavam entre si sobre aquilo, não vinha a público. E quando você tá na internet com conteúdo as pessoas respondem ali imediatamente, então acho que tem que ter essa preocupação.
CP: E como essa relação entre marca e público vai ser feita daqui a dez anos?
Carvalhal: Cara, eu não sei. Eu espero que a gente esteja mais maduro, que a gente consiga desenrolar isso, entender melhor. Mas se eu fosse falar de movimentos, acho que as pessoas vão ter cada vez mais poder, acho que vai ser cada vez mais livre. As pessoas vão cada vez mais falar o que quiserem e acho isso bem desafiador. Estou bem curioso, na real, pra ver onde isso vai dar.
CP: Sobre a questão da moda sem gênero – na sua opinião, a divisão entre masculino e feminino está ficando obsoleta ou essas coleções que foram lançadas recentemente seriam uma resposta das marcas a uma pressão do público?
Carvalhal: A sensação que eu tenho é que a gente tá vivendo um momento de ruptura muito grande, onde todos os modelos e formatos, tudo que era padronizado, tudo que estava combinadinho e arrumadinho, tá quebrando, tá ruindo. As pessoas estão ansiosas e querendo novas formas, novas possibilidades. Com isso, vem uma série de mudanças de comportamento em relação à idade, à classe social, ao gênero… essa liberdade que a internet proporcionou pra gente vem pra vida real nesse sentido. E falando da moda, a moda masculina sempre influenciou muito a moda feminina. Isso era um reflexo de uma época onde as mulheres estavam sempre numa posição de receber tudo que era dos homens. O homem ocupava um lugar acima da mulher onde ele determinava tudo. Havia uma facilidade de receber isso. Em algum momento uma mulher usar uma calça era tão estranho quanto hoje um homem usar uma saia, e isso virou normal. Mas isso foi tão esquisito quanto hoje você pensar em ver um monte de homem de saia. Isso era reflexo de uma sociedade onde a mulher era mais submissa, nesse sentido de receber tudo que vinha do homem. Eu imagino no futuro que as marcas não vão ter mais uma separação de masculino e feminino. Trabalho com marcas masculinas que são muito usadas por mulheres. Acho que a barreira ainda é o contrário, o homem usar o que vem da mulher. Por outro lado, os homens estão se abrindo mais aos valores femininos também.
Quando você foi para a FARM, desceu de posição e diminuiu de salário por acreditar no projeto. O que você diria para essa nova geração que quer começar e já ganha posição de chefe?
Carvalhal: Eu vejo dois movimentos na verdade. Vejo também muita gente jovem muito corajosa, de topar fazer essas coisas também, sabe? Tem uma galera que sim, já quer chegar arrasando, que é uma coisa meio natural também. A geração dos anos 90-2000 já nasce com muito mais possibilidade e informação do que a minha. E isso dá muito mais ansiedade de você chegar em algum lugar. Mas eu acho que o caminho hoje, de como você vai chegar nesse lugar, é bem diferente do que na minha época. Na minha época você tinha três coisas que você podia fazer: ou você é advogado, ou você é médico, ou você é sei lá, arquiteto. Então você tinha ali poucas opções. Hoje as pessoas andam acreditando muito mais. As pessoas estão bem mais abertas a querer chegar em algum lugar, mas acreditando mais nos sonhos.
CP: Tem algo dentro da social media que você tenha muita vontade de fazer?
Carvalhal: Onde eu tenho vontade de atuar mais eu acho que é na parte de vídeo. Por conta da pressa, do pouco tempo, eu tenho acreditado muito no caminho do vídeo. Seja um vídeo curto, tipo um snap, ou um conteúdo, uma websérie, uma coisa maior. Já fiz algumas coisas nesse sentido mas isso seria uma coisa que eu desenvolveria mais.