Plataforma digital cresce com produtos e serviços como a venda de crédito para celular, projeto já implantado no México
Por Raquel Brandão
Depois de crescerem com aquisições e se tornarem a maior fabricante de cervejas do mundo e do Brasil, a AB InBev e sua controlada Ambev estão mudando o jeito de operar o negócio. “A gente testa, aprende e investe pouco. Não deu resultado, não se apega e vamos para o próximo. Esse é o novo modelo da companhia de inovação”, diz o vice-presidente de tecnologia (CTO, na sigla em inglês) da companhia, Eduardo Horai.
O grupo cervejeiro quer crescer organicamente e se consolidar como uma plataforma de diferentes marcas, oferecendo não só produtos, mas também serviços e tecnologias para seus clientes e parceiros.
“Estávamos num jogo de aquisição, de crescimento inorgânico e eficiência. E esse jogo acabou, não temos mais para onde crescer com ele. A companhia foi muito esperta de reconhecer que isso deu certo, mas para os próximos 10 ou 20 anos esse modelo já se esgotou”, observou Horai. Como definiu o presidente da Ambev, Jean Jereissati, o “jogo de War” tradicional não tinha mais espaço, referindo-se ao jogo de tabuleiro cuja meta é conquistar territórios nas mãos de adversários. Os executivos falaram ontem ao Valor, durante evento da companhia para apresentar iniciativas com foco em tecnologia.
O comando da empresa enxerga uma “série de frentes digitais” no horizonte. Passando desde o aplicativo Zé Delivery, de venda direta ao consumidor e que já responde por 6% do volume vendido pela Ambev, até a oferta de um portfólio de produtos e serviços aos clientes comerciais por meio da plataforma Bees.
“É um negócio que vai crescer muito. A gente aposta muito no ‘marketplace’ ”, diz Horai, fazendo referência ao modelo de shopping center on-line. O Bees tem 3 milhões de clientes ativos globalmente, quase 1 milhão no Brasil. Desses clientes ativos no país, 60% fazem compras no ‘marketplace’ da Ambev, que já tem mais de 20 fabricantes cadastrados e 2 mil itens. A mais recente é a Pepsico Foods, dona das marcas Elma Chips, Rufles, Lays e Doritos.
A Bees também tem aumentado o potencial da Ambev de se posicionar como uma prestadora de serviços. Até junho, seu serviço financeiro Bees Bank tinha 121 mil contas ativas, com 37% dos pontos de venda fazendo pagamentos de forma digital por meio dele ou por pix e 58% utilizando a opção de extensão de prazo de pagamento. Também oferece serviços de terceiros, como a startup Lemon Energia, que conecta pequenos empresários a geradores de energia limpa e da qual a Ambev é investidora.
“Pode ser que venda de serviço dê certo, que alguns deem mais certo do que outros. A partir do momento que se tem essa conexão digital com os clientes, o aplicativo fornece essa possibilidade de assinaturas de coisas diferentes”, diz Horai.
No Brasil, a empresa vai começar a testar a venda de créditos de celular para os clientes comerciais, uma iniciativa da AB InBev no México que deu certo.
A empresa que tem Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles no quadro de acionistas foi sempre vista pelos investidores de mercado pelo viés da eficiência. Agora, mais tecnológica e de olho no crescimento orgânico, Horai diz que a companhia está em um modelo ‘test and learn’ (testar e aprender), “quase como uma startup”, mas sem deixar a eficiência de lado nem “jogar dinheiro” em projetos nos quais não acredita.
“Investidores estão de olho no que estamos fazendo, porque tem um potencial futuro. Temos que continuar entregando resultado e queremos continuar crescendo nessas iniciativas. E aí o resultado acho que vai ficar mais claro. Tudo que a gente faz tem que ter um racional por trás”, diz Horai.
No segundo trimestre, a Ambev registrou aumento de 6% no volume de bebidas vendido em todas suas operações, com a receita avançando 14,5%, para R$ 17,99 bilhões, e o lucro líquido chegando a R$ 3,06 bilhões, 4,6% a mais do que um ano antes.
Do ponto de vista de processos internos, o grupo vê potencial de ganho de valor com a adoção do 5G, mas não tem feito investimentos massivos, diz Horai. A expectativa é de que essa tecnologia permita obter e utilizar dados das 34 cervejarias com mais velocidade, se conectando aos sistemas de previsão de demanda e de análise de qualidade.
O principal esforço da AB InBev e da Ambev está na consolidação de sistemas. Hoje, são mais de 8 sistemas de gestão empresarial (ERPs na sigla em inglês) na operação global e dois nos negócios no Brasil. Hoje se gasta muito tempo conectando dados, diz o executivo. “O sistema centralizado de gestão vai permitir ter uma visão única de estoque e fazer com que eu consiga ter boa parte da minha logística mais eficiente e mais assertiva.”
Fonte: Valor Econômico