O projeto-piloto de logística reversa do setor de eletroeletrônicos, iniciado em abril e que funcionará até dezembro, deve servir de base para um avanço nas negociações do acordo setorial, no âmbito da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
O ramo é um dos únicos dentre os englobados na legislação que ainda não assinou o trato.
A Lei nº 12.305/2010, da PNRS, institui a obrigatoriedade de que nove setores desenvolvam sistemas de logística reversa, assumindo a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. Para isso, as empresas da indústria e do comércio devem firmar acordos setoriais que definam como será feito o descarte e o direcionamento correto dos resíduos.
É diante dessas exigências que surge o projeto descarte On, que conta com a participação da Casas Bahia, Pontofrio e Extra – do Grupo Pão de Açúcar (GPA) -, da Lojas Americanas, do Walmart, e da Pernambucanas. A indústria também toma parte através da Associação Brasileira de Reciclagem de Eletrônicos e Eletrodomésticos (Abree).
Segundo o diretor de relações institucionais do GPA, Paulo Pompilio, depois do término do teste, a expectativa é de um avanço significativo no acordo setorial. “O projeto vai servir de estímulo para deslanchar as negociações”, afirma. O intuito é utilizar as informações coletadas durante os meses do programa – como o volume de descartes e o custo da operação – para balizar o pacto.
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, a proposta do setor foi enviada em janeiro de 2014, e, desde então, a cadeia produtiva está em fase de negociação. “Um acordo desse tamanho pressupõe muitas responsabilidades para todos os lados, então não dá para colocar uma previsão para a assinatura. Mas as discussões estão sendo muito produtivas para a melhoria da eficiência”, diz Pompilio.
Como funciona
O executivo conta que o acordo está segmentado em dois vetores: os produtos de pequeno porte, onde o cliente levaria o item a um ponto de coleta; e os de grande porte (de linha branca), em que seria feita a retirada na casa do consumidor. Após a coleta pelas empresas do comércio, os produtos seriam entregues para que as fabricantes façam a destinação correta ou o reúso dos materiais angariados.
Desenvolvido em parceria com a subprefeitura da Lapa, em São Paulo, o projeto-piloto funciona por essas duas frentes. Em abril deste ano, foram instalados pontos de coleta em dez lojas da região, e, em meados de outubro, o programa foi ampliado para o recolhimento dos itens de grande porte, com a cobrança de uma taxa de R$ 10.
O serviço pode ser solicitado no momento em que se realiza a compra de um produto novo em uma das unidades participantes. Em relação ao custo de R$ 10, Pompilio, do GPA, diz que o preço é subsidiado e que o custo real é muito maior do que isso. “Esse valor é para incentivar o consumidor a aderir ao programa. Depois que deixar de ser um projeto-piloto esse preço vai aumentar”, afirma.
A assessora técnica do Conselho de Sustentabilidade da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Cristiane Cortez, enxerga com bons olhos a iniciativa. “É um projeto-piloto muito interessante, principalmente por testar como seria a logística reversa dos produtos de grande porte”, afirma, completando que o descarte desse tipo de item é um grande desafio.
Segundo Pompilio, do GPA, nos eletrônicos de pequeno e médio porte é mais fácil equilibrar os custos porque na maioria deles é possível reutilizar parte do material, já nos de linha branca muito pouco pode ser reciclado.
Adesão do consumidor
Outro grande desafio para o sucesso do sistema é a conscientização do cliente. “Diferente das embalagens, que o brasileiro já tem consciência da necessidade do descarte correto, ainda não há essa percepção quando se trata dos eletrônicos. O primeiro passo é conseguir conscientizar o consumidor da importância disso”, diz Pompilio.
A assessora do grupo de trabalho sobre o meio ambiente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Cristiane Soares, concorda: “A mudança na cultura do consumidor e a sobreposição das legislações federal, estadual e municipal são os principais desafios”, diz.
Segundo Pompilio, um ponto demonstrado pelo projeto-piloto é a necessidade do trabalho com a comunicação com o cliente – através de banners, ações de marketing, e iniciativas constantes de conscientização e impacto do consumidor. “Quando se para de trabalhar com a comunicação se percebe claramente uma queda no volume de descartes”, diz.
Outros setores
Os outros setores englobados pela PNRS são: embalagens de óleo lubrificante, lâmpadas, embalagens em geral, medicamentos, pneus, pilhas e baterias, embalagens de agrotóxicos e óleo lubrificante. Desse total, os únicos que ainda não possuem o acordo setorial firmado são o de eletroeletrônicos e o de medicamentos – que já encaminhou sua proposta para o Ministério do Meio Ambiente.
O setor de embalagens de óleo lubrificante assinou o pacto em 2012, o de lâmpadas em novembro de 2014 e o de embalagens em geral em novembro do ano passado. Os quatro grupos restantes já possuíam sistemas de logística reversa anteriores a instauração da lei.
Para Cristiane, da CNC, é fundamental que os acordos sejam finalizados o quanto antes porque, além da logística reversa gerar um impacto positivo muito grande para o meio ambiente, ela “gera novas cadeias de negócios junto a reciclagem e reintroduzir insumos em novos ciclos produtivos, diminuindo a extração primária na natureza”.