18/01/2016 às 05h00
Por Letícia Arcoverde | De São Paulo
Sem perspectiva de criação de vagas ou desenvolvimento de novos negócios, headhunters esperam um 2016 marcado por substituições em cargos-chave, especialmente em áreas relacionadas ao controle de custos e vendas. Com o impacto da crise chegando a quase todos os setores, a tendência é de movimentações executivas apenas naqueles que passam por processos de transformação, como educação e saúde.
Os especialistas em recrutamento executivo ouvidos pelo Valor esperam um 2016 similar ao ano passado, com algumas funções que registraram movimentações decorrentes da crise se mantendo em alta. O ano será caracterizado pela busca por mais eficiência e redução de custos, o que se traduz em demanda por executivos das áreas de finanças. As trocas do principal executivo financeiro - diretores, CFOs ou vice-presidentes - devem seguir forte, na visão de Sérgio Averbach, presidente da empresa de recrutamento executivo Korn Ferry para Brasil e América do Sul.
De acordo com Averbach, tem se tornado mais comum em empresas multinacionais americanas que esse profissional se reporte diretamente à matriz, ao invés de ao CEO da operação local. Mudanças assim têm ocorrido nos últimos anos, principalmente, como forma de assegurar o cumprimento das regras de compliance mais rigorosas no país de origem da empresa. “Isso passa a exigir dos profissionais habilidades de comunicação mais objetivas e alinhadas com a cultura americana”, afirma.
Trocas de CFOs também são naturais em tempos de crise pois o cenário negativo muda o perfil do profissional de finanças necessário, diz Luis Giolo, diretor-geral da empresa de recrutamento executivo Egon Zehnder. “Se antes era preciso um profissional com habilidades mais expansionistas, hoje a busca é por um gerente de caixa, eficiente em renegociar dívidas e cortar custos”, diz.
A busca por uma abordagem mais conservadora se estende a outras funções, como diretores de controladoria, posições seniores de RH e cargos na área de logística, tributária e contábil. Para Andre Freire, presidente da empresa de recrutamento executivo Odgers Berndtson, as organizações continuarão o movimento de se estruturar de forma defensiva para o cenário de recessão.
“As empresas estão buscando consolidar as áreas de controle da operação”, diz.
Além da crise, o clima de maior rigor em relação a irregularidades instaurado desde a aprovação da Lei Anticorrupção e do início da Operação Lava-Jato vai continuar a demandar profissionais de compliance e jurídico. “Há grandes empresas que não tinham o jurídico internamente, e agora criam novas posições nessa área”, diz Freire, da Odgers.
As trocas de executivos-chefes - presidentes, country managers ou responsáveis por unidades de negócios - seguirão motivadas pelo baixo desempenho e por aquisições. O alto índice de compras de empresas brasileiras por capital estrangeiro registrado em 2015, decorrente da desvalorização cambial, deve promover mais movimentações desse tipo.
Renata Filippi, diretora geral de recrutamento da consultoria de gestão de carreira Stato, percebe também que fundos de investimento estão buscando executivos com experiência em cadeiras de presidência para identificar potenciais aquisições, muitas vezes entrando no comando da operação após a compra.
Apesar do foco na redução de custos, a busca por resultados mesmo no cenário ruim aumentará este ano a demanda na área comercial, em funções de vendas e marketing. A busca será, no entanto, por profissionais com perfil mais inovador e capaz de pensar em estratégias alternativas para ganhar participação no mercado. A tendência atual de consolidação de funções - como a união das cadeiras de marketing e vendas - fará com que profissionais com perfil mais generalista também saiam na frente, diz Freire, da Odgers Berndtson.
Na opinião dos especialistas, a crise deve impactar a demanda por profissionais em diferentes setores da economia. “Todos os segmentos serão diretamente afetados pela questão econômica e a perspectiva negativa. Além disso, as empresas já fizeram ajustes nos últimos anos e começaram o ano sem gordura para queimar”, diz Rodrigo Vianna, diretor executivo da empresa de recrutamento de média e alta gerência Talenses.
Os headhunters destacam, contudo, perspectivas mais positivas em segmentos exportadores, que se beneficiarão da alta do dólar, como a indústria de papel e celulose e empresas do segmento alimentício voltadas para o mercado externo. Além disso, os recrutadores antecipam movimentações executivas em setores que continuam processos de mudança.
Para Freire, da Odgers Berndtson, o segmento de educação deve continuar a se profissionalizar como um todo na esteira de grandes processos de fusão e aquisição, o que cria demanda por executivos com um perfil mais estratégico.
O mesmo acontece com empresas de cosméticos, que ainda passam por mudanças no modelo de vendas.
Há expectativa também no chamado setor de “life sciences”, que inclui empresas farmacêuticas e de plano de saúde, também por conta de grandes processos de fusão e aquisição e da entrada de capital estrangeiro no setor hospitalar. “Pode haver diminuição no número de cargos, mas haverá oportunidades para trocas”, diz Renata, da Stato.
Embora o ano se desenhe para repetir as tendências de 2015, os especialistas apontam que há oportunidades no mercado para executivos competentes - ainda que o cenário exija uma mentalidade diferente e mais disposição para negociar a remuneração. “Há empresas que aproveitam a maior oferta de executivos qualificados disponíveis no mercado para promover trocas”, diz Giolo, da Egon Zehnder.
Valor Econômico – SP