25/09/2015 às 05h00
O Banco Central entrou em ação e fez claras advertências aos mercados de que não só não vai sancionar, como usará todos os instrumentos de que dispõe para debelar as estimativas delirantes em relação à taxa de câmbio e de juros. Os juros futuros dispararam, provocando um aperto de liquidez exagerado e rápido, pois neles se baseiam os empréstimos bancários de curto e médio prazo. Diante da instabilidade econômica, não há vitórias definitivas, mas o recado do BC teve o efeito imediato de fazer a cotação do dólar recuar 3,71% e cair abaixo dos R$ 4 (R$ 3,9916) e dissipar parte da extraordinária pressão sobre os juros futuros. Os contratos de janeiro de 2016 passaram a marcar 14,6% (ante 14,8%) com recuos ainda mais relevantes nos contratos com prazos mais longos. Os juros de janeiro de 2017 caíram de 17,2% para 15,7%.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, inesperadamente, passou as mensagens que mudaram o rumo do comportamento dos preços dos ativos ontem. Primeiro, afirmou que o BC tem meios à mão para reduzir “a volatilidade e a ansiedade dos mercados”. No caso do câmbio, foi explícito: “Reservas internacionais são um seguro, podem e devem ser utilizadas”. No caso dos juros, Tombini indicou que a forte elevação das taxas, refletindo aumentos do prêmio de risco, “não servirão de guia para a condução da política monetária nos próximos meses”. Depois, acrescentou que não há limites para a atuação da política monetária nesse cenário de estresse.
Ao mesmo tempo, em ação coordenada, o Tesouro anunciou uma bateria diária de compra e venda de NTN-F de amanhã até o dia 2 de outubro, para dar parâmetros aos juros, cuja referência decolou da realidade.
Os recados de Tombini ocorreram pouco antes da apresentação do Relatório de Inflação do BC, onde está delineada a estratégia da autoridade monetária e seus fundamentos.
Uma das questões de fundo da crise atual é a vacilação quanto ao ajuste fiscal, cuja sinalização cheia de erros e ruídos levou o país, primeiro a perder o grau de investimento da S&P e, depois, ao descolamento especulativo dos preços dos ativos. O presidente do BC e o relatório, porém, chamam a atenção para o fato de que o ajuste cambial e o aperto monetário existem e estão tendo efeitos corretivos bem maiores que o esperado.
Embora ambos não compensem a ausência do aperto fiscal, têm peso igualmente importante e estão fazendo seu papel. O ajuste cambial é importante, segundo o BC, mas deve ser combatida a “reatividade excessiva”, assim como identificadas as causas reais da volatilidade. Se leilões de linha em dólar e swaps cambiais não fizerem efeito, e tudo degringolar, como ameaçava acontecer nos últimos dias, há reservas de US$ 370 bilhões para essa finalidade.
O aperto monetário, porém, teve poder recessivo mais profundo do que o BC esperava. A capacidade ociosa da indústria, por exemplo, hoje é maior até do que a fulminante queda observada no auge da crise de 2008-2009. Os investimentos vão cair 12,3%, muito mais do que os 7% previstos antes. O recuo do consumo das famílias será bem superior a 0,5%, devendo chegar a 2,4%. O PIB cairá 2,7%.
Esse mergulho recessivo permitirá, segundo o BC, cumprir 80% do caminho para atingir inflação de 4,5% que se esperava para 2016. No cenário de referência, a inflação cederá até 5,3% no ano que vem, e estará abaixo da meta em 2017. Para atingir a meta em 2016, segundo o relatório, “falta a ancoragem fiscal”, mas ainda há esperança de que ela contribua com seu quinhão ao longo dos próximos meses.
O efeito recessivo está sendo mais forte que a desvalorização cambial no jogo dos preços, onde têm consequências opostas, segundo os exercícios do BC. Os choques de demanda são mais contracionistas que os choques cambiais sobre os preços livres à medida que a economia desacelera rapidamente. Com isso, o cenário para a inflação pode se materializar, com recuo forte de 3,5 pontos percentuais ou mais no IPCA até o fim de 2016, sem nova elevação dos juros.
Quando os mercados indicaram que a política econômica estava à deriva, o BC apontou que eles estavam se esquecendo da política monetária e que, no caso do câmbio, a autoridade monetária mal começou a usar o arsenal que possui contra expectativas exacerbadas. Isso não resolve os problemas de fundo, mas tem o poder precioso, nas crises, de limitar danos à economia e apontar padrões de atuação cujo poder os investidores conhecem.
Valor Econômico – SP