Por Helena Benfica | A combinação de uma competição mais equilibrada no mercado on-line, maior assertividade nos estoques e melhor gestão do crédito surtiu efeito nos resultados das varejistas de moda no terceiro trimestre. O fato de as redes estarem adaptando suas coleções às mudanças climáticas também já começa a trazer números melhores no ano.
De julho a setembro, C&A e Guararapes — dona da Riachuelo — reverteram prejuízos do ano anterior, enquanto o lucro da Lojas Renner avançou por mais um trimestre consecutivo. Na avaliação de analistas, os resultados são sustentáveis e indicam uma tendência positiva para as empresas nos próximos meses.
O desempenho da C&A “novamente superou expectativas” e deve continuar positivo nos próximos meses, disse o Itaú BBA. A varejista de moda teve lucro líquido de R$ 42,8 milhões no trimestre, revertendo o prejuízo de R$ 42,2 milhões no ano anterior.
A performance das lojas conceituais e de alto padrão ajudou no resultado da companhia, avaliou o BTG Pactual. “Estamos impressionados com os investimentos estratégicos da C&A na cadeia de suprimentos, o foco no desenvolvimento de produtos e os serviços de crédito ao consumidor”, escreveram os analistas.
Na divisão financeira, a C&A Pay conseguiu reduzir em 33,2% as perdas líquidas de crédito, ao oferecer crédito para consumidores bons pagadores e recuperar empréstimos que estavam em atraso.
O resultado da área de serviços financeiros da Guararapes também foi destaque no período. A provisão para perdas de créditos da Midway caiu em 20,1%, totalizando R$ 275,3 milhões, fruto da redução na inadimplência e melhoria da qualidade da carteira de crédito.
“Mudamos bastante o perfil do cliente nos últimos dois meses”, disse Francisco Santos, executivo à frente da Midway Financeira, em teleconferência. “A carteira com atraso mais longo é menos representativa. Com esse nível mais ajustado, estamos fazendo o resultado subir aos poucos”.
Além disso, a empresa conseguiu reduzir a relação entre a dívida líquida e o Ebitda para 0,6 vez, ante 0,7 vez um ano antes, por conta da boa geração de caixa de R$ 91,8 milhões, destacou o Itaú BBA. O Ebitda indica a geração de caixa operacional da empresa, sem incluir despesas financeiras, impostos, depreciação e amortização.
“Atingimos uma estrutura de capital que nos permite voltar a investir em abertura e reforma de lojas”, disse o presidente André Faber, em teleconferência.A companhia encerrou o trimestre com 420 lojas, dez a mais que um ano antes. Essa combinação de fatores contribuiu para que a empresa revertesse o prejuízo de R$ 70,7 milhões de um ano antes em lucro líquido de R$ 45,1 milhões este ano.
Outras medidas que têm contribuído para os resultados das varejistas são as recentes reduções de estoques e a capacidade de vender produtos certos nos locais corretos.
Essas práticas, além de reduzirem o risco de perda de mercadorias e a queima de caixa, ajudam, especialmente, em períodos de mudanças climáticas. Isso porque, com muitas variações nas estações ao longo das semanas, as redes têm conseguido abastecer as lojas, mais rapidamente, com as peças mais versáteis.
A Lojas Renner afirma que consegue produzir hoje até 40% do volume de uma coleção durante a própria estação. A companhia encerrou o trimestre com estoques menores, com 13 dias a menos de prazo médio e maior giro de produtos, além de reduzir a quantidade de itens mais antigos.
O lucro líquido da empresa avançou 47,7% em relação ao mesmo período do ano passado, para R$ 255,2 milhões. Na mesma base de comparação, as receitas somaram R$ 3,4 bilhões, alta de 9,5%. Já as vendas nas mesmas lojas subiram 11,5%, frente a 0,6% um ano antes.
“A Renner reportou resultados fortes no terceiro trimestre, embora algumas linhas do balanço tenham ficado abaixo das previsões”, escreveu o Citi. As vendas líquidas subiram 9%, mas ainda ficaram 3% abaixo da estimativa do banco, assim como as vendas no varejo, cerca de 2% menores do que a estimativa, mesmo subindo 12% sobre 2023.
Apesar disso, o Goldman Sachs afirma que as tendências operacionais foram encorajadoras e devem sustentar “um sólido crescimento dos lucros [da Renner] até 2025”.
Além das medidas internas tomadas pelas redes, há efeitos da concorrência nos negócios. A partir de 1º de agosto entrou em vigor a cobrança de 20% de imposto em compras internacionais de até US$ 50, conhecida como “Taxa das Blusinhas”, que contribuiu para equilibrar o mercado no período.
Sem citar diretamente as plataformas asiáticas, Fábio Faccio, presidente da Lojas Renner, disse em teleconferência que “alguns concorrentes ficaram mais caros” nos últimos meses. Ao mesmo tempo, Faccio afirmou que a companhia conseguiu fazer uma melhor gestão de preços para ficar mais bem posicionada no mercado.
Em pararelo, os canais digitais das companhias nacionais têm ficado mais robustos, conseguindo fazer frente aos “marketplaces” (plataforma on-line com diversas lojas) e aumentando gradativamente sua contribuição para os negócios, dizem analistas.
O valor total transacionado pela plataforma da rede (próprio e de terceiros) da Renner alcançou R$ 656,1 milhões no trimestre, avanço de 23,8% no ano. A penetração desse canal chegou a 16,7%, ante 15,3% no mesmo período do ano anterior. Trata-se do chamado “GMV”, indicador geral de transações on-line.
Na C&A, as vendas feitas pelo site e aplicativo avançaram 50% entre julho e setembro, maior crescimento para um terceiro trimestre desde 2021. A Guararapes não informa o dado.
Esses desempenhos ajudam as empresas a montar sua estratégia para o fim de ano, data crucial para atingirem as metas de 2024.
Vendas nos shoppings avançam
Mesmo com a alta das taxas de juros, que geralmente pressiona as despesas financeiras das empresas e o bolso do consumidor, as vendas nos shoppings centers administrados por Iguatemi, Multiplan e Allos cresceram no terceiro trimestre.
Além disso, a receita com aluguéis aumentou, o que também ajudou a impulsionar o faturamento das empresas no período.
Na Iguatemi, o avanço das vendas nas lojas com mais de um ano (SSS, na sigla em inglês) foi de foi de 8,9% . O aluguel, por sua vez, subiu 6,3% no trimestre.
Para o BTG Pactual, os resultados são sólidos e “devem se traduzir em um crescimento mais forte da receita nos próximos trimestres”.
Em novembro a companhia concluiu a aquisição de uma parcela do Shopping Rio Sul, o que deve trazer receitas adicionais no próximo trimestre, segundo analistas.
Na Multiplan, o crescimento de 9,3% nas vendas em lojas com mais de 12 meses também foi destaque no mercado, bem como o avanço de aluguel em mesmas lojas de 4,4%. O resultado “reforça a perspectiva positiva para o aumento das vendas da Multiplan, ainda mais considerando que a empresa ainda está reformando 13 shoppings”, disse o Santander.
Já a Allos, formada a partir da fusão de Aliansce Sonae e BR Malls, teve vendas de R$ 9,5 bilhões entre julho e setembro, avanço de 8% em relação ao ano passado. O SSS subiu de 3,5% para 6,2%, ajudado pela melhoria do mix de lojas e gestão de portfólio, segundo a empresa.
Apesar do crescimento, o desempenho ficou aquém do de seus concorrentes. Para o Santander, isso pode ser resultado da maior exposição da companhia a consumidores das classes C e D, mais sensíveis a quedas no poder de compra após a alta dos juros.
A própria fusão das duas empresas foi uma tentativa de fortalecer o portfólio de empreendimentos voltados para a classe B, minimizando o impacto nos resultados em momentos econômicos mais desafiadores.
Em setembro, o grupo anunciou o investimento de R$ 216 milhões em investimentos na ampliação e repaginação de áreas do Shopping Campo Grande (MS), o maior desde a fusão.
O projeto vai adicionar mais 12 mil m² de área bruta locável (ABL) e repaginar outros 11 mil metros quadrados. Com essa expansão, o empreendimento ganhará aproximadamente 150 novas lojas.
Fonte: Valor Econômico