Por Suzana Liskauskas | As passarelas de Milão, Paris e Nova York ditam tendências em duas temporadas: primavera/verão e outono/inverno. Mas, nos últimos anos, as mudanças climáticas estão quebrando o ritmo dessa dança das estações e, consequentemente, desorganizando os estoques no varejo de moda.
A Lojas Renner, no entanto, tem conseguido atravessar esse contexto difícil sem grandes sobressaltos. Apesar dos extremos climáticos e das piores variações de temperatura da história entre o início do outono e início do inverno neste ano, manteve os estoques enxutos e o crescimento da lucratividade, avalia Fabio Faccio, presidente da companhia.
A varejista encerrou o segundo trimestre de 2024 com redução de 3% nos estoques e aumentou em 2,3 pontos percentuais a margem bruta, consequência de remarcações menores de preço.
O executivo atribui essa resiliência aos investimentos da companhia, nos últimos anos, em tecnologia e inovação — com iniciativas como o uso de dados para acompanhar os hábitos dos clientes nas diversas regiões do país —, integração com a rede de fornecedores e desenvolvimento de produtos.
“Estamos mais ágeis, flexíveis e precisos no desenvolvimento de produtos. Conseguimos, então, ter mais maleabilidade para nos adaptar mesmo com os extremos climáticos. Tivemos as piores variações da história, no início do outono e no início do inverno, e ainda as enchentes no Rio Grande do Sul. Mesmo assim, tivemos um crescimento de lucratividade”, afirma Faccio.
Com sede no Rio Grande do Sul, a Renner pôde desempenhar um papel importante no apoio aos colaboradores afetados pelas enchentes deste ano em cidades gaúchas, graças aos bons resultados acumulados nos últimos anos.
“Pudemos dar um grande suporte ao Estado e vamos investir ao longo do tempo, porque agora virá a fase mais importante do apoio, mais de R$ 50 milhões”, diz Faccio. “Também ajudamos bastante toda nossa equipe que foi muito afetada pelas enchentes, com suporte sob o ponto de vista psicológico e financeiro”, relata.
Com otimismo diante dos resultados e as possibilidades geradas pela integração entre lojas e operação on-line, a rede pode rever para cima o plano de inaugurações. “Tem espaço para crescer no varejo físico”, afirma Faccio. “Quando fazemos uma inauguração em um mercado em que não havia uma loja da Renner, a venda do on-line naquela região aumenta entre 20% e 30%. A experiência integrada é mais importante para o cliente.”
Para 2024, a expectativa da companhia é investir R$ 800 milhões, mantendo o foco em tecnologia e inovação. A previsão é fechar o ano com 30 novas lojas (20 da Renner, 10 da Youcom e uma da Ashua), das quais 90% em novas praças, como Santa Barbara d’Oeste, em São Paulo, onde foi instalada a loja da Youcom; Araranguá, em Santa Catarina, e Rio das Ostras, no Rio de Janeiro, onde foram inauguradas lojas da Renner. Ao todo, o grupo tem cerca de 670 lojas.
Em 2023, o investimento total da Renner foi de R$ 889 milhões, e cerca de 65% deste montante foi aplicado em projetos de inovação. São investimentos em tecnologia, sistemas e equipamentos, softwares de análise de dados e ferramentas de inteligência artificial.
Os outros 35% foram destinados à abertura e remodelação de lojas. Desde o ano passado, todas as novas unidades da Renner seguem o conceito de loja circular. “Ela é planejada, pensada e construída, desde métodos construtivos até equipamentos e uso de tecnologia, para ser o mais sustentável possível, menos agressiva ao meio ambiente, usar equipamentos reciclados ou recicláveis e adotar tecnologia para evitar desperdícios e oferecer a melhor experiência aos consumidores”, diz o executivo. A companhia tem atualmente 39 lojas nesse modelo nas cinco regiões do país.
No âmbito da inovação, 60% das lojas Renner têm caixa de autoatendimento que combina tecnologias de RFID (do inglês “radio frequency identification”), que decodifica etiquetas inteligentes por radiofrequência, internet das coisas e aprendizado de máquina. Os clientes podem colocar todas as peças em uma caixa acoplada ao ponto de autoatendimento, e a tecnologia decodifica as peças e retira os alarmes após o pagamento, agilizando todo o processo.
“Tanto a leitura da peça quanto o sistema de ‘desalarmamento’ da etiqueta foram desenvolvidos por nós, com parceiros. No mundo, só a rede japonesa Uniqlo tem essa tecnologia, porém eles não conseguem ler as etiquetas de todos os itens. Já na Renner, todos os itens das lojas, inclusive cosméticos, são lidos pelo sistema”, afirma Faccio.
Outra iniciativa que traz expressão de orgulho à face do presidente da companhia é o novo centro de distribuição do grupo, que se tornou totalmente operacional em junho deste ano. Localizado em Cabreúva (SP), a estrutura foi digitalizada para permitir que as operações contemplem cada peça de forma única.
“Aquele vestido daquela cor e daquele tamanho é uma unidade para nós. O sistema informa o número de unidades necessárias que devem ser enviadas para cada loja, para cada mercado e para a casa do cliente, no caso de compras on-line”, conta Faccio.
A vantagem é a flexibilidade para enviar as peças. O CEO ressalta que elas chegam mais rapidamente, com mais eficiência e assertividade até as lojas e com um sortimento muito maior para o cliente on-line. “Agora a gente olha para todas as peças da empresa, disponíveis para lojas físicas e para o cliente comprar on-line. A operação é única”, diz.
Instalado em um imóvel alugado, porém projetado especificamente para a Renner, o novo centro de distribuição recebeu aproximadamente R$ 800 milhões em automação e tecnologia. “Nossa inspiração veio de um centro de distribuição instalado na Holanda, mas o nosso é mais avançado. Com certeza, trata-se do mais moderno centro de distribuição de moda da América Latina, talvez do mundo”, afirma Faccio.
Primeira colocada no setor indústria da moda no Valor 1000 pela sétima vez, a Renner assumiu em 2022 um ciclo mais ambicioso com relação à sustentabilidade. A varejista lançou 12 novas metas até 2030, desdobradas em pilares: soluções climáticas, circulares e regenerativas; conexões que amplificam; e relações humanas e diversas.
Uma delas é reduzir significativamente as emissões de CO2 e fazer a transição para uma economia de baixo carbono, com métricas baseadas na ciência, criando as condições de levar a Renner à neutralidade climática (net zero) em 2050. Como parte desse processo, a varejista pretende que 100% das roupas de suas marcas próprias tenham atributos de sustentabilidade (hoje o patamar já passa de 80%).
Fonte: Valor Econômico