Por Rebecca Crespaldi | Nos últimos quatro meses, a fundadora do Enjoei, Ana Luiza McLaren tem passado boa parte do seu tempo com a barriga no balcão – no caso, da primeira loja física da plataforma de venda de itens de segunda mão, na Vila Madalena, em São Paulo.
A unidade, que mantém as cores e o estilo despojado que consagrou o Enjoei no online, está com faturamento 30% maior do que o estimado, aponta a empresária, e os custos ficaram em linha com o plano de negócios.
Desde abril, a companhia abriu outros dois pontos próprios na cidade de São Paulo, um no Campo Belo e outro na Frei Caneca, nas proximidades da Avenida Paulista.
Agora, com o modelo testado, está pronta para partir para a expansão via franquias: o plano é chegar a 300 unidades em 2027. Para o próximo ano, a estratégia já está desenhada: concentrar a abertura das lojas no Sudeste, em cidades com mais de 300 mil habitantes.
“Nosso plano é bem ambicioso”, diz a empresária em relação aos planos para o offline. Os contratos para as 20 primeiras unidades já estão em fase final de negociação.
“Nos primeiros 90 dias da primeira loja, passaram pessoas de 400 bairros diferentes, sendo que São Paulo tem 450 bairros aproximadamente, além de mais de 150 cidades do Brasil. Isso mostrou como atraíamos público de todos os lugares”, aponta Joel Queiroz Júnior, chefe de operações da marca.
O Enjoei está seguindo o caminho de diversas marcas nativas digitais, que fazem a expansão da Internet para as ruas – nesse caso, desbravando um mercado endereçável de potencial multibilionário.
Um estudo encomendado pelo Enjoei ao Boston Consulting Group (BCG) apontou que o mercado de second hand total no Brasil pode girar em torno de R$ 80 bilhões em 2027.
Desse montante, cerca de R$ 60 bilhões será no offline, sendo que aproximadamente R$ 20 bilhões é referente ao mundo fashion.
“O BCG tem o número dele, mas eu digo o seguinte: o que está em todo armário no Brasil, é o tamanho do nosso mercado”, brinca McLaren.
Para fazer frente à concorrência crescente, com cada vez mais brechós aparecendo inclusive no formato de franquias, o Enjoei aposta no recall de marca e no tom de voz da companhia que foi construído ao longo dos últimos 15 anos.
“Nós nos perguntávamos se conseguiríamos levar a Enjoei para a rua de uma forma que não virasse qualquer coisa. Acho que conseguimos”, finaliza McLaren, brincando que só uma marca com um lado meio cômico como o Enjoei, conseguiria “bancar” a arquitetura ousada e superlativa como fizeram.
A ideia é fazer o online e o offline se conversarem. A fundadora vê a rede física também como uma “mídia pela cidade”, reduzindo o custo de aquisição de clientes.
“Se tivermos inteligência para usar esse canal, desenvolvendo ofertas específicas do aplicativo para quem está na loja física, conseguiremos cruzar os clientes. No longo prazo, só vemos vantagem em ter a mesma marca conversando no físico e no online”, pondera.
Inteligência de mercado
Uma diferença relevante em relação a modelos de franquias é que, no caso do Enjoei, não há um produto sendo fabricado – e portanto, não há o sell-in, apenas o sell-out.
“Diferente do Enjoei que a gente conhece, não é uma intermediação, a loja compra o item, paga o PIX na hora e revende. Então antes de abrir uma loja, temos uma fase em que a loja compra o inventário”, diz McLaren.
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A estratégia é que a taxa de franquia e os royalties somem hoje ao faturamento que a empresa tem no online – e que diz respeito principalmente à comissão e as taxas por cada venda.
Os projetos das lojas preveem espaços entre 200 e 300 m² e cada loja deverá operar com a compra e venda das peças de roupa levadas pelos consumidores.
Com estoque, obra e operação, uma franquia do Enjoei custará entre R$ 600 mil a R$ 1 milhão, a depender da metragem. Já o payback estimado é de R$ 250 mil de faturamento por mês, com um retorno do investimento estimado entre 20 e 26 meses.
Segundo o COO, o custo por metro quadrado do Enjoei está abaixo da média do mercado: em torno de R$ 2,5 mil a R$ 3 mil, enquanto a média é entre R$ 5 mil a R$ 6 mil.
Partindo da sua experiência e inteligência de mercado do online, o Enjoei tem uma plataforma própria de precificação, que será colocada a serviço dos franqueados – e que deve se traduzir em margens altas para os donos das franquias.
“Geralmente os markups [rentabilidade em relação ao custo de aquisição] do mercado de franquias são de 2,3 a 2,6 vezes, enquanto o nosso é de 3 a 3,5 “, diz.
O caminho para o azul
A ofensiva do Enjoei em direção ao varejo físico inclui também a compra de 25% da Cresci e Perdi, rede de brechós infantis, anunciada no fim do ano passado.
Na época, dos 550 contratos de franquia assinados, 434 já estavam em operação.
Agora, o número de contratos aumentou para 600, sendo que outras 66 começaram a operar, alcançando a marca das 500 franquias em atividade.
Desde o IPO em 2020, feito num momento de liquidez abundante e apetite por negócios digitais, o Enjoei ainda não conseguiu fechar no azul.
Mas os resultados vêm melhorando, com uma mentalidade mais voltada para rentabilidade do que crescimento da receita.
Nos últimos três trimestres, o EBITDA (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação) ajustado, desconsiderando efeitos de despesas de M&A e stock options, ficou no terreno positivo.
Segundo McLaren, tanto a expansão ao varejo físico como a aquisição da Cresci e Perdi (e também da Elo7), visam destravar valor para a ação.
O papel ENJU3 desvalorizou quase 85% desde a abertura de capital, saindo de R$ 10,25 para R$ 1,66 nesta sexta-feira, 30. Nos últimos 12 meses, contudo, avançou 5%.
“O que estamos fazendo é construir uma companhia muito saudável e perene. O valor para o acionista vai vir”, diz McLaren.
Fonte: Exame