Por Sergio Ripardo | Dois meses após entrar em recuperação judicial com uma dívida declarada de R$ 352,2 milhões, a Polishop, do empresário João Apolinário, apresentou seu plano de reestruturação à Justiça, no qual propõe a aplicação de um deságio de 90% sobre o valor de face com uma carência de 20 meses e um prazo de pagamento de 10 anos, segundo o documento de 311 páginas visto pela Bloomberg Línea.
Entre os maiores credores financeiros da rede varejista de utilidades domésticas estão o Banco do Brasil (BBAS3), com R$ 24,5 milhões, o Bradesco (BBDC4), com R$ 11,3 milhões, o Itaú Unibanco (ITUB4), com R$ 7 milhões, e o Safra (R$ 5,1 milhões). A lista inclui ainda BV, Pine, Original e Banco da Amazônia.
A varejista, fundada em 1995 e que no seu auge chegou a contar com 280 unidades, tem agora 48 lojas físicas e sofre ações de despejos movidas por administradoras de shoppings centers. O grupo, presente no e-commerce e em televendas, tem atualmente 437 funcionários, segundo o plano.
O próximo passo do processo é a convocação de uma assembleia geral de credores (AGC) para deliberar a respeito de seus termos do plano de recuperação judicial, que detalha os possíveis meios de recuperação da companhia, com a demonstração de viabilidade econômica e laudo de avaliação de bens e ativos.
O processo de recuperação judicial da Polimport Comércio e Exportação Ltda, razão social da Polishop, aponta 17 de outubro como o prazo limite para a votação do plano em AGC.
Para credores sem garantia real (quirografários), como hipotecas ou penhores, a proposta consiste em efetuar o pagamento em tranches mensais até o encerramento da recuperação judicial. Depois, os pagamentos seriam trimestrais.
“As projeções demonstram que a recuperanda tem plenas condições de liquidar suas dívidas constantes na forma proposta, bem como os créditos não sujeito à recuperação judicial”, alegou a empresa no plano, com a ressalva de que reestruturou seu modelo de negócio, com a abertura de franquias.
Para os credores trabalhistas com créditos até o limite máximo de 150 salários mínimos, a proposta é a de pagamentos em até 12 meses após a data da publicação da decisão de homologação do plano.
Da dívida sujeita à recuperação judicial (R$ 352,190 milhões), a classe de credores trabalhistas representa 0,74% do total (R$ 2,616 milhões).
Os credores sem garantia (quirografários) respondem por 99,21% do montante (R$ 349,401 milhões), enquanto as micro e pequenas empresas somam R$ 171.683,15 (0,05% do total).
O plano de recuperação, sob os cuidados da Cabezón Administração Judicial, foi protocolado no Tribunal de Justiça de São Paulo na última quinta-feira (18). O caso tramita na 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central da Comarca de São Paulo (SP).
O juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho aceitou o processar o pedido de recuperação em 20 de maio. Isso significa que a empresa terá suas dívidas “congeladas” por 180 dias (stay period). O fim do prazo do curso da prescrição de ações e execuções contra o devedor (stay period) está fixado em dia 1º de outubro.
Proposta opcional
O plano traz ainda uma proposta opcional de aceleração da amortização do passivo para credores financeiros e fornecedores, mas exige um maior engajamento deles no processo de reestruturação da companhia.
“Credores financeiros que se habilitarem a participar desta forma de aceleração da amortização destinarão novos recursos ou operações para a recuperanda visando o fomento das suas atividades”, segundo o documento.
Segundo o plano, se aderir à proposta de aceleração da amortização, o credor fornecedor colaborador não ficará sujeito a qualquer desconto no valor de face de seu crédito e receberá o valor em até 90 meses (contra 90% de desconto no valor de face do crédito e pagamento em 120 meses previsto no plano para os credores quirografárias ou fornecedores não colaboradores em geral).
O documento prevê arrendar e realizar a locação dos imóveis da empresa, além da venda de ativos. Para o primeiro ano da recuperação judicial (12 meses subsequentes à data de homologação do plano), foi projetado um volume de faturamento de cerca de R$ 415 milhões (veja mais abaixo).
“O volume projetado de receitas está totalmente de acordo com a capacidade operacional da recuperação e do mercado”, citou a empresa no plano.
Fora do Shark Tank
O empresário João Appolinário, CEO e fundador da Polishop, interrompeu sua participação em programas de TV após a varejista entrar em recuperação judicial.
A pausa ocorreu no momento em que a Justiça começou a receber os primeiros informes sobre a situação financeira da varejista. De janeiro a abril, a companhia acumulou um prejuízo de R$ 66,7 milhões e uma receita líquida de R$ 70,5 milhões – ficou sem caixa para quitar as obrigações.
Reconhecido desde os anos 1990, quando começou a vender dieta de emagrecimento e o grill George Foreman em canal de televendas, o fundador da Polishop está fora do elenco de jurados da próxima temporada do Shark Tank Brasil, reality show com empreendedores exibido pelo canal Sony.
Antes da confirmação da saída de Appolinário do programa, ele chegou a dizer a pessoas próximas que participaria das gravações da nona temporada, como noticiou a Bloomberg Línea em 20 de maio.
“João não estará nesta temporada. O elenco fixo contará com Sérgio Zimerman, Monique Evelle, Carol Paiffer e Carlos Semenzato, além de convidados especiais”, afirmou um representante do Sony Channel.
Entre os convidados especiais da nova temporada, com estreia prevista neste segundo semestre, estão a empresária Alexandra Casoni, sócia da Flormel, fabricante de doces e sobremesas, e Caito Maia, fundador da Chilli Beans, que esteve à frente do programa durante seis temporadas.
Appolinário fez parte do reality desde a primeira temporada, exibida em 2016. Procurado pela Bloomberg Línea, o fundador da Polishop respondeu por meio de sua assessoria.
“Ele estará a frente de novos projetos neste momento. Além disso, a demanda na Polishop e nas empresas das quais ele é sócio e investidor requerem muita atenção neste momento”, disse o CEO da Polishop à Bloomberg Línea em mensagem enviada.
Um dos negócios em que o empresário investe é a DecorColors, fabricante de tintas. Em 2021, o fundador da companhia, Leonardo Arruda, participou do Shark Tank Brasil, e Appolinário ofereceu R$ 10 milhões por 50% do empreendimento, tornando-se parceiro do negócio.
Receitas decrescentes
Um relatório elaborado pela administradora judicial, visto por Bloomberg Línea, mostra que as contas da companhia ficaram no vermelho em 2021 e 2023. De janeiro a abril de 2024, o grupo acumulou prejuízo de R$ 66,687 milhões.
Em 2023, a perda alcançou R$ 155,270 milhões, depois de ter registrado lucro de R$ 28,249 milhões em 2022.
O relatório menciona ainda o prejuízo de R$ 28,249 milhões em 2021, após um lucro de R$ 45,108 milhões em 2020. A dívida tributária está calculada em R$ 42,5 milhões.
Já receita líquida da Polishop sofreu expressiva queda, somando R$ 70,538 milhões de janeiro a abril deste ano, segundo o relatório.
Para efeito meramente ilustrativo (bases diferentes), as receitas ficaram em R$ 1,112 bilhão em 2023 (ano inteiro), R$ 970,283 milhões em 2022 e R$ 878,980 milhões em 2021.
A varejista não possui capacidade de pagamento no curto prazo, segundo o relatório.
“Atualmente a capacidade de pagamento no curto prazo é de 0,51, ou seja, para cada R$ 1,00 de dívida há R$ 0,51 de disponibilidade para quitação. A recuperanda não dispõe de caixa para quitar as obrigações”, disse o administrador judicial.
Em outra frente, o empresário virou alvo de cobrança de uma dívida de R$ 351 mil por causa de um aluguel de uma loja no Shopping Tietê Plaza, na capital paulista.
O caso levou a Justiça a determinar a penhora de bens como duas lanchas e uma moto Harley-Davidson. Ainda cabe recurso.
Na petição de recuperação judicial da Polishop, a defesa de Appolinário chegou a pedir que a lista de bens particulares dele fosse mantida sob segredo de Justiça.
Fonte: Bloomberg Linea