Por Angela Klinke | Curvas das dunas dos Lençóis Maranhenses e contornos das montanhas do Jalapão estão expressas na coleção “I am Breton Brasil” criada pela fabricante de móveis para expor suas origens e conquistar o mercado internacional. A assinatura é em inglês, mas o “Brasil com s para reafirmar a autenticidade do nosso design”, diz André Rivkind, CEO da Breton, fabricante de mobiliário, fundada há 50 anos, em São Paulo.
Há pouco mais de um mês, a empresa familiar abriu uma flagship em Dubai, uma loja monumental numa mansão que pertenceu a um emirati. Nela, exibe seu “manifesto de brasilidade”. Na coleção, há peças desenvolvida para a marca por designers como Carlos e Caio Carvalho, do Rio, assim como do escritório Sá Rivá, dos designers do Cariri, Ceará, Igor Sabá e Assis Saraiva.
Num cubo de vidro de mais de 500 metros quadrados, a vitrine da loja na Al Wasl Road, uma das “avenidas mais luxuosas”, estão peças da premiada arquiteta Fernanda Marques. Feitas com matérias primas nacionais, da madeira certificada ao mármore, foram dispostas numa cenografia com “cara de casa, mas que, ainda assim, comunica(…) o Brasil, seu potencial natural em face da urgente questão da preservação”, definiu a arquiteta.
Este ano a empresa se tornou carbono negativa, segundo relatório da consultoria The Planet, condição básica para conquistar o mercado internacional. “Ser sustentável não é diferencial há muito tempo”, diz Rivkind, que faz parte da terceira geração da família fundadora.
Franquias – 10 lojas em 5 anos
A megaloja de Dubai, em sociedade com um investidor local, é o primeiro passo para o projeto de internacionalização por meio de franquias que prevê 10 lojas em cinco anos, “Começamos por Dubai porque é o lugar mais cosmopolita do mundo, um mercado imobiliário com um crescimento gigantesco.”
Lá, a comunidade multicultural “busca por produtos de qualidade com design. E o design brasileiro está em voga no mundo com sua criatividade, afetividade e conforto”, diz.
Outro fator determinante, é que Dubai funciona como hub de distribuição para toda região. Em dois anos, avalia, o Emirado deve ficar com 10% de sua produção. A Breton conta com indústria própria em Diadema (SP), além de terceirizar linhas com outros fabricantes parceiros.
Assim como no Brasil, os principais clientes são os arquitetos que concebem a decoração da casa toda. A Breton montou um centro de distribuição em Dubai para atender os profissionais, que por uma questão de prazo de entrega, 120 dias em média, têm preferido as peças já em estoque.
“Lembrando que nosso core business é a customização, somos uma alfaiataria de mobiliário.” Hoje o tíquete médio da marca no Brasil é de R$ 30 mil e em Dubai, US$ 30 mil.
Como a Breton, outras marcas de móveis nacionais estão expandindo suas fronteiras com lojas próprias e franquias, reafirmando suas origens, como Ornare e estúdio bola, na Itália; Bell’Art nos Estados Unidos, e Evviva, em especial na América Latina.
Exportações crescem 4,6%
As exportações brasileiras de móveis e colchões cresceram 4,6% em março, em relação a fevereiro, atingindo US$ 59,1 milhões em exportações. No mês, o saldo da balança comercial foi de US$ 35,6 milhões. No acumulado do trimestre, o aumento foi de 0,4% comparado ao mesmo período do ano passado.
O levantamento foi feito pelo IEMI para o Projeto Brazilian Furniture ( com “Z”), uma iniciativa da Abimóvel ( Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário) em parceria com a Apex, que busca promover no exterior a indústria moveleira focada em qualidade, sustentabilidade e design e que, portanto, conquista maior valor agregado.
O aumento mês a mês revela, segundo o levantamento, uma “trajetória ascendente” das exportações ainda mais se levado em conta que nos últimos dozes meses a variação foi negativa, com queda de 7,1%.
Depois de estabelecer mais uma vez um enclave brasileiro no Salon del Mobile Milano este mês, o Projeto promove o design nacional na ICFF (International Contemporary Furniture Fair), de 19 a 21 de maio, em Nova York, a mais importante para o setor nos EUA.
O país é hoje o principal importador de móveis brasileiros, com uma fatia de 31,9% do que foi exportado em 2023. Na missão comercial deste ano na ICFF, 25 empresas brasileiras foram confirmadas.
Entre elas, a estreante Bell’Arte, com uma fábrica de 11 mil m², em Jaraguá do Sul (SC), que já exporta para as Américas do Sul e Central, África do Sul, e que se dedica, agora, a expandir no mercado estadunidense.
A empresa foi criada em 1987 priorizando estofados com design assinado. O engenheiro de produção e CEO do grupo, Crystian Freiberger, é também um dos integrantes do time de designers. No ano passado, a poltrona Wave, criada por ele, recebeu a medalha de ouro no concurso A’Design Award, premiação internacional e referência do setor.
Seu desafio na ICFF é incrementar o número de distribuidores nos Estados Unidos, concorrendo com grifes de 88 outros países que estarão expondo na feira. “Precisávamos alcançar um patamar em termos de qualidade excepcional e ter design reconhecido antes de expormos no exterior. Nossas raízes são brasileiras, mas nosso olhar é para o mundo”, diz Freiberger. Até o fim de 2025, pretende elevar as exportações de 10% para 30%.
A expansão internacional da Evviva, marca de móveis planejados que pertence ao grupo gaúcho Bertolini, passa pelo “espírito do lugar”. Uma das coleções da empresa, assinada pelos designers Nicole Tomasi e Sérgio Cabral, recupera o trançado manual da palha de trigo. É uma trama chamada de Dressa, que foi embutida como detalhe em portas e gavetas de armários e aparadores.
A coleção com peças numeradas resgata a técnica trazida por imigrantes italianos e usada tradicionalmente pelas mulheres de cidades da Serra Gaúcha para confeccionar cestas para a lavoura.
Ela é o atestado de brasilidade mais visível nos showroons que a marca está abrindo na República Dominicana, Panamá, Uruguai e Canadá. No ano passado, a empresa inaugurou duas franquias no exterior em Portugal e no Paraguai. Para dar conta da expansão também no Brasil, onde a marca tem 32 franquias, estão investindo R$ 40 milhões na ampliação do parque fabril.
No recém-inaugurado showroom em Milão, de 450 m² num palacete do século 19, no Quadrilátero da Moda, a Ornare está oferecendo pão de queijo e cafezinho para que os visitantes já identifiquem logo “o jeito de atender, a alegria e a ternura brasileira”, diz Esther Schattan, sócia-fundadora da Ornare.
Com uma presença forte nos Estados Unidos, com sete showrooms e mais três em processo de abertura, a marca finca a bandeira no mais concorrido mercado do mobiliário de luxo, a Itália. “De certa forma, a gente já atendia muitos arquitetos italianos nas lojas dos Estados Unidos, como a de Nova York, e na de Miami. Já temos o reconhecimento internacional, agora é estreitar estes relacionamentos na Europa”, diz Esther.
Com fábrica em Cotia (SP), a Ornare produz e pré-monta seus móveis no país e distribui para o exterior por navio. Inclusive em Dubai, onde abriu um showroom em 2022. Hoje, a empresa exporta 25% de sua produção, mas em até cinco anos pretende chegar a 50%.
Um dos atributos da nova loja de Milão é o acervo de arte exposto, priorizando artistas brasileiros como Jamex, Raquel Pater, Brenda Nicole, Mauro Restife, Rodrigo Matheus, entre outros.
A curadoria é de Marina Conde, em parceria com galerias, que está à frente do projeto “Art All Around” e que será estendido para o showroom da Ornare, na Alameda Gabriel Monteiro da Silva, em São Paulo, este mês.
“Há um encantamento com o Brasil, em especial com a Bienal de Arte de Veneza, que este ano tem um curador brasileiro, o Adriano Pedrosa. A arte não só referenda o design brasileiro, mas o design brasileiro também é uma arte”, diz Esther.
É a ponte entre o produto de nicho e o comercial, que o estudiobola, de São Paulo, pretende replicar quando abrir seu showroom, em Treviso. O designer Flavio Borsato mora na cidade italiana desde 2016 e agora, com as licenças na mão, começa a erguer lá seu projeto de internacionalização.
O estúdio foi criado há 23 anos por Borsato e Mauricio Lamosa focado no design autoral. A proposta era ter uma identidade brasileira num mercado de mobiliário até então monocórdico e europeizado.
Cada peça é desenvolvida em parceria com fabricantes em várias cidades do país, para atender 37 pontos de venda, além das três lojas próprias em São Paulo. Algumas peças atemporais se tornaram ícones, como a poltrona Shell, criada há 20 anos e que permanece à venda até hoje. É com a proposta de lifestyle “despretensioso no universo do alto padrão” que a dupla pretende contar a história do estúdio bola para o mundo.
Fonte: Valor Econômico