Por Redação | Franuí, chocolate Caribe e Rap10. Sabe o que esses produtos têm em comum? Todos eles viralizaram no TikTok nos últimos meses. Isso significa que por algum motivo, capturaram a atenção do público e se espalharam pela internet por meio de vídeos.
Amplamente replicado pelos usuários, esse conteúdo viral ganha o nome de trend e gera tanta repercussão que pode ser sentida até pelo varejo, que muitas vezes é bombardeado por um grande (e inesperado) volume de vendas de um item específico em um curto período de tempo.
Seria mais ou menos o que acontece no verão, quando os ventiladores desaparecem das prateleiras, ou em um inverno bem rigoroso, quando a venda de cobertas e aquecedores dispara e tudo se esgota em poucos dias.
Só que diferente do clima que pode ser facilmente acompanhado por previsões meteorológicas, nas mídias sociais, essas modas podem surgir de qualquer lugar, de qualquer setor e atingir consumidores em todo o mundo. Por isso, pode-se dizer que a capacidade de identificar produtos virais tornou-se uma habilidade importante no dia a dia de um empreendimento.
Tido como um superalimento, o inhame é apontado como um dos melhores remédios para a atual epidemia de dengue. Indicado pelos médicos, o suco do tubérculo ficou famoso no TikTok como suco milagroso. Entretanto, o poder do alimento permeia outras inúmeras postagens com receitas de brigadeiro, creme, pomada cicatrizante, bolo, purê, refogado – tudo feito com inhame. E, claro, já dá para ver a diferença disso no segmento de hortifrúti.
Robson Fernandes, gestor operacional da Superfauna Varejista, rede com quatro supermercados no interior de São Paulo, acompanha essa mudança de comportamento em seu negócio. Acostumado a vender apenas 2 quilos de inhame por semana, o normal agora é vender 100 quilos por semana em lojas que atendem cerca de 3 mil clientes por dia.
“Muitos nem sabiam o que era inhame. Enquanto tínhamos uma banca inteira só para batatas, o inhame dividia espaço com outros seis ou sete alimentos. Agora, não vencemos de tanto vender”, diz.
Mas, como tudo, esse fenômeno tem dois lados. Ao mesmo tempo em que tem o poder de potencializar vendas, Fernandes aponta que o TikTok também pode arruinar o consumo de determinado produto. Um bom exemplo, segundo o empresário, foi a moda das bebidas proteicas. Italac, Danone, Verde Campo, Piracanjuba, Fortifit, Parmalat e 3 Corações são algumas das muitas marcas que lotaram os supermercados com essa opção.
Inicialmente vendidas a R$ 12,99, essas opções se tornaram moda pela praticidade. Entretanto, pouco tempo depois, foram alvo de inúmeras postagens de nutricionistas nas redes que falavam sobre os riscos dos ultraprocessados.
“Hoje, vendo um produto desses a R$ 2,99 porque ele ficou mesmo marcado. Até vendemos em maior volume porque pelo preço os clientes acabam levando, mas em faturamento, perdemos pelo menos 50%”, diz Fernandes.
PÁSCOA DO TIKTOK
Outra previsão difícil de ser feita é a Páscoa. Com o consumidor mais conservador na hora de comprar ovos de chocolate, Fernandes tem apostado cada vez menos no produto, que este ano chegou a ter opções de R$ 120 por apenas 110 gramas de chocolate.
De fato, houve uma baixa nas vendas deste ano. De acordo com o Índice Cielo do Varejo Ampliado (ICVA), o declínio foi de 5% nas vendas durante o período festivo. Mesmo assim, os lojistas que apostaram nos ovos certos se deram bem.
Quem buscou por ovos de Páscoa nas redes sociais, sobretudo no Instagram e TikTok, se deparou com uma enxurrada de publicações sobre dois sabores: Franuí/Framboesa e Caribe.
Pela primeira vez neste ano, o chocolate Caribe, produzido pela Nestlé desde 1986, ganhou formato de ovo. Assim que foi lançado, vídeos citando a nostalgia e o sentimento de ame ou odeie que o bombom desperta se replicaram nas redes sociais. E, novamente, um sucesso.
Duas semanas antes do domingo de Páscoa, o item já estava esgotado nas prateleiras dos varejistas e também na loja exclusiva dentro da fábrica de Vila Velha, no Espírito Santo.
De acordo com um levantamento da consultoria Timelens sobre a data por meio das citações nas redes sociais e buscas no universo digital, o interesse pelo tema Páscoa teve crescimento de 38% em relação ao mesmo período de 2023. A maior busca foi pelo ovo Caribe – em 40 dias, foram mais de 800 mil citações de consumidores, com aumento de 53%, se comparado a janeiro.
“É um jogo de equilíbrio complicado. Ano passado tive de forçar a venda. Esse ano, deixei de vender porque não apostei tanto, mas fiz essa previsão com base nas demandas anteriores e tomo essa decisão em janeiro. Como é que àquela altura eu ia apostar num ovo de banana?”, diz.
HITS DO TIKTOK
Na lista de produtos virais, outro hit no TikTok é o hidratante labial Carmed Fini que esgotou nas farmácias no ano passado – poucos dias após ser lançado – e superou a meta anual em 20 dias – uma receita de R$ 40 milhões. Só no TikTok, em três semanas, os vídeos falando sobre o produto usando a hashtag #carmedfini somaram mais de 200 milhões de visualizações.
A Cimed, farmacêutica brasileira responsável pela produção, precisou acelerar a produção da linha que tem três sabores que reproduzem as balas de gelatina da Fini — Beijo, Banana e Dentadura.
Uma situação comum desses virais é que assim que são anunciados como esgotados, esses produtos entram em um novo ciclo, movimentado um mercado paralelo nos principais marketplaces do Brasil. O Carmed Fini, por exemplo, originalmente vendido por R$ 25,90, começou a ser revendido por até R$ 90 no Mercado Livre, Magazine Luiza, Amazon e Shopee.
Super disputadas, as framboesas congeladas cobertas de chocolate de Bariloche, na Argentina, chegaram ao Brasil ano passado, e sumiram das prateleiras. Trata-se do Franuí, doce que viralizou em 2023 e é fabricado pela Rapanui que produz cerca de 12 milhões de potes ao ano.
Um frenesi que pode ser explicado em uma espécie de linha do tempo:
– Em 2020, uma tiktoker argentina exibiu uma embalagem e disse que era impossível citar três coisas melhores do que o doce. E foram mais de 1 milhão de visualizações em um mês.
– Em fevereiro de 2022, uma tiktoker colombiana se gravou provando pela primeira vez o doce.
– Na sequência, surgiu o primeiro conteúdo brasileiro sobre as Franuí. Tiktokers brasileiras, como Juliana Linhares e Marianna Benassatto, apresentaram o doce a sua audiência, gerando um interesse sem precedentes. Tanto que o termo “Franuí” foi mencionado mais de 80 milhões de vezes no TikTok em menos de seis meses, indicando o alcance global dessa tendência gastronômica.
Ficou tão popular no Brasil que ganhou diversas receitas que tentam replicá-lo, já que 150 gramas de Franuí (uma embalagem) custa em média R$ 40. No auge da trend, era comum encontrar o item por até R$ 59,90. Já hoje, é comum ver ofertas anunciando o produto por R$ 29,90.
TIKTOK COMO PLATAFORMA DE BUSCA
Levando em conta toda essa influência, as marcas podem se aproveitar desse novo hábito e do engajamento da rede social. Além de ser bastante eficaz, o ambiente da rede social traz muita aplicação do uso dos produtos e perspectivas de suas aplicações.
Se nos buscadores tradicionais é possível, por exemplo, encontrar explicações sobre o funcionamento de determinado aparelho, no TikTok o usuário consegue encontrar diversos vídeos de pessoas mostrando como fazer o melhor uso daquilo – uma experiência imersiva e visual.
Um recorte da pesquisa “Using TikTok as a Search Engine”, realizada pela Adobe, mostrou que 64% dos jovens nascidos entre 1995 e 2010 utilizam o TikTok como ferramenta de pesquisa. Ou seja, para além das conexões com amigos, familiares e consumo de entretenimento, as redes se tornaram uma fonte de conhecimento para essa geração.
Entre as motivações para escolher a plataforma chinesa como meio de busca on-line estão:
– O formato de vídeos curtos é mais informativo e fácil de compreender (44%);
– Eu gosto da maneira como contam histórias nos vídeos do TikTok (34%);
– O conteúdo é mais personalizado (31%);
– A informação é mais recente (29%);
– Eu gosto de interagir diretamente com o conteúdo (29%).
Uma vez que as pessoas estão recorrendo ao TikTok para fazer buscas, é preciso que as marcas consigam produzir para essa plataforma. Isso inclui a colaboração com influenciadores e a criação de conteúdo que fomente a interação com a comunidade.
Tal comportamento abre uma janela de oportunidades para as marcas se aproximarem da sua audiência com mais conteúdos que sejam “encontráveis”, inclusive com mais atenção aos termos e palavras-chave já utilizados pelos usuários.
IDENTIFICANDO VIRAIS
Pensando nesse possível aumento significativo nas vendas e na visibilidade das marcas, Lincoln Eloy, diretor comercial da Estoquee, diz ser difícil negar que o TikTok tem o potencial de alcançar um público muito maior do que o marketing tradicional.
Sem a necessidade de um grande investimento em publicidade e também com taxas de conversão mais altas, Eloy explica que por estarem conectadas às redes as pessoas que veem o produto já estão predispostas a estar interessadas nele, graças ao endosso implícito de seus conhecidos que compartilharam o produto.
Isso cria um ciclo de feedback positivo, onde o sucesso inicial do produto gera ainda mais interesse e compartilhamento. Não se trata de uma ciência exata, mas ficar de olho em hashtags populares, por exemplo, pode sinalizar a um varejista quais itens estão em destaque.
Outra estratégia seria explorar plataformas de e-commerce como Mercado Livre, Amazon e AliExpress, além de sites de marketplaces estrangeiros, para saber o que está vendendo bem. Seguir influenciadores digitais que estão frequentemente na vanguarda das tendências também pode ajudar nessa pesquisa, e assim o varejista ganha mais segurança na hora da previsão de estoque.
Por outro lado, produtos virais podem, após o período de maior engajamento, ser esquecidos e se tornar ultrapassados.
“É o efeito TikTok. Na era instantânea e interconectada em que vivemos, perceber o timing exato pode ser a diferença para virar um negócio de sucesso”, diz Eloy.
Fonte: Diário do Comércio