Por Adriana Mattos | A Lojas Marisa chegou a conclusão que é uma rede de moda popular, mas não popular o bastante a ponto de conseguir sair da difícil fase de reestruturação. Em crise de identidade há algum tempo, a cadeia fala agora em voltar ao seu DNA, de rede focada no cliente de renda mais baixa, quase cinco anos depois de ter apostado em coleções com maior qualidade, mas preços mais altos, para melhorar margens.
O comando detalhou a forma como a empresa avançou nessa discussão em apresentação dos resultados do quarto trimestre de 2023, em teleconferência ontem. A varejista percebeu que encerrou lojas no ano passado que, meses depois, na mão dos rivais, deram melhor resultado. Entre os concorrentes do grupo estão redes como Caedu, Pernambucanas e a Torra.
“No quarto trimestre não atingimos as metas e isso fez o conselho repensar o posicionamento de mercado. Por que não temos vendido? […] Vimos que as lojas que fechamos o ano passado foram adquiridas por concorrentes que venderam alguns dígitos acima da Marisa”, diz Andrea Menezes, presidente do conselho de administração, ao lado do novo CEO, Edson Garcia, no cargo desde abril.
A rede fechou 93 lojas de um ano para cá e opera com 237 pontos.
A questão central é que há uma desconexão entre posicionamento de marca e o valor na prateleira. A varejista se vende como uma rede popular e democrática, porém com preços de produtos para classes B e C+. A renda média familiar da cliente Marisa é de até R$ 4 mil por mês, e essa faixa responde por 75% da população na pirâmide social, segundo disse ontem a rede.
Ocorre que, a proposta de valor nos últimos anos mirava um segmento mais restrito de clientes, “mais em B2 e C1”, disse Garcia.
Entre as ações que serão implementadas, testadas em projeto piloto, ficou definido que as lojas terão uma vitrine diferente da atual – na visão de consultores, com menos referências de Riachuelo ou C&A, e mais próximo da Caedu e Leader, com base nas fotos apresentadas na teleconferência.
Há mais peças coloridas e básicas expostas na entrada da nova loja, e com os preços baixos em destaque maior. Haverá 40 mesas espalhadas pelas unidades por lojas e as mesas terão preços destacados e com uma exposição adensada para tentar mostrar variedade.
Na conversa com analistas, um investidor perguntou a razão pela qual, “com tantas decepções nos resultados”, Garcia decidiu entrar na empresa. “A Marisa é uma grande marca, há desafios, há um caminho à frente e os números têm que falar. Eu me senti honrado com o convite”, respondeu.
Duas lojas da Marisa, em São Paulo, passaram pelas mudanças, e, para defender a ideia de que a rede está no caminho correto, Garcia publicou dados sobre melhora nas vendas antes e depois dos ajustes.
A Marisa sugere que a crise que ela atravessa tem mais relação com o crescimento das marcas de baixo preço do que com a expansão das plataformas estrangeiras asiáticas.
A operação on-line de marcas internacionais ganharam 3,5 pontos percentuais de mercado em 2023 diz a Marisa, sem informar o índice de participação. Desse total, 2,7 foram perdidos pelas redes voltadas para a classe de maior renda, e 0,8 ponto pelas cadeias populares.
“Isso ocorre porque a consumidora de classe C e D não pode errar na compra e não pode ficar esperando a mercadoria chegar para ela usar”, disse Garcia.
A varejista publicou o balanço do quarto trimestre na noite de segunda-feira, com recuo de 43,5% na receita líquida, para R$ 417,4 milhões, afetado pelo fechamento de lojas. O canal digital caiu 61%, por conta da estratégia de defender margens.
Ao mesmo tempo, as despesas operacionais caíram 21% após o corte de custos ao longo de 2023, mas menos do que a queda da receita (43%). A rede teve melhora no prejuízo líquido – recuo de 42%, para R$ 169,3 milhões – pelo ganho tributário com imposto de renda e contribuição social de R$ 83 milhões, o que não ocorreu em 2022.
Sobre as vendas menores, ainda houve efeito do fato de a empresa ter sido mais lenta no processo de desenvolvimento de sua coleção junto aos fornecedores, e isso levou a um baixo volume de estoques. Esse cenário impediu que a empresa conseguisse atender as vendas num ritmo normal.
Fonte: Valor Econômico