Por Redação | Petz e Cobasi, gigantes do mercado pet, anunciaram um plano de fusão que tinha “chance zero” de sair, segundo fontes do setor. Se seguir adiante, vai resultar em um negócio de R$ 6,9 bilhões em faturamento e 483 lojas.
Correndo por fora, a Petland parece não se intimidar com a companhia que pode surgir dessa combinação. Nascida na Mooca há 10 anos em um ambiente de lojas físicas, que consolida a expansão do seu modelo de negócio baseado em unidades menores e proximidade, mas bem localizadas (são 161, em 17 Estados), via conversão de bandeira, essa rede de pet shops não para de crescer.
Tendo como chamariz a personalização, a conveniência de comprar perto de casa, e os serviços de banho e tosa com opção de plano de assinatura e agendamento via app, a Petland busca “transformar um comprador eventual em um cliente fiel.”
“Tentamos nos diferenciar de outras redes com um atendimento próximo, que nos ajuda a formar uma comunidade de clientes. Faz toda a diferença, por exemplo, que o funcionário conheça o dono e chame o pet pelo nome”, afirma Rodrigo Albuquerque, CEO da Petland.
O motivo da estratégia, que iniciou em sentido oposto ao resto do mercado e se mantém, segundo o executivo, foi uma pesquisa realizada com clientes perguntando fatores que os faziam consumir em uma megaloja ou no e-commerce.
Primeiro, segundo ele, foi a percepção de preço, pois acham que vão encontrar de tudo, além da comodidade de ter estacionamento na porta. Segundo, o fator preço, puxado pelo conceito da prateleira infinita, e o prazo de entrega.
Mas ao perguntar para o mesmo cliente por que comprar em um pet shop de bairro, as respostas são diversas: quero que conheçam meu pet pelo nome, quero personalização no atendimento, quero consumir serviços no meu bairro, e quero um veterinário local como um “médico da família”, conta.
“Esse cliente diz: vou porque é perto da minha casa; vou pelo serviço porque é conveniente para mim”, diz Rodrigo. “Quando entendemos essa diferença, posicionamos claramente a rede como de lojas de bairro, uma ferramenta para empoderar o pequeno lojista”, completa.
Daí a estratégia de franquear a rede via conversão de bandeira, ou seja, transformando pets de bairro em lojas Petland, cujas unidades respondem por mais de 50% da rede. O modelo deve contar com mais 10 lojas até o fim do ano, para ganhar espaço onde grandes varejistas do mercado pet não estão (ou não estavam), e onde está distribuído o consumo do setor. “A maior parte, de longe, está nos bairros”, reforça.
Dados do Instituto Pet Brasil apontam que os pet shops de pequeno e médio portes dominam esse tipo de varejo, e representaram quase 50% do faturamento do setor em 2023. Por outro lado, as grandes lojas responderam por cerca de 9%.
Mas há uma reviravolta a caminho. Caso realmente seja firmada e aprovada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), a combinação entre Petz e Cobasi, que deve gerar um Ebitda (indicador financeiro que mostra o potencial de geração de caixa da empresa) estimado em R$ 464 milhões, ao mesmo tempo que transformará a nova companhia em líder de mercado, pode acender um sinal amarelo para os pequenos negócios do setor.
Uma das estratégias comunicadas quando do anúncio da possível fusão é a expansão em bairros, em um mercado hoje pulverizado e que movimentou quase R$ 70 bilhões de janeiro a setembro do ano passado, segundo o Instituto Pet Brasil.
Mas, aparentemente, a Petland não parece estar preocupada com a concorrência que se avizinha. Na avaliação de Rodrigo Albuquerque, apesar dos inegáveis ganhos de escala, a nova empresa acabará reforçando um modelo de negócios de megalojas, com foco quase exclusivo na venda de produtos, o que contrasta com uma movimentação de todo o varejo no mundo, que é o de diminuir o tamanho de lojas e de incluir serviço, destaca.
“É uma questão de escolha: se quero atendimento personalizado, serviço e conveniência, vou no bairro; se quero preço e passear, vou nas megalojas. São coisas diferentes com propósitos diferentes, e fazemos assim porque se encaixa perfeitamente ao perfil de cliente que nos procura, que é o que prioriza conveniência, experiência e personalização.”
ALTA FREQUÊNCIA
Além desses atributos mais sensoriais, há diferenciais entre uma megaloja e uma loja compacta Petland, diz o CEO. Somado aos serviços, há um pacote de funcionalidades para o lojista – como sistema de agendamento próprio com CRM integrado, e ferramentas tecnológicas para gerenciar essa agenda, “sempre cheia.”
Por mês, segundo a rede, são realizados mais de 170 mil atendimentos de banho e tosa, contratados via plano, pacote ou de forma avulsa. Mais de 30% do faturamento das lojas têm origem no serviço que, combinado com outros, pode chegar a 200 mil.
Com pacote de serviços avulsos ou assinatura e preços que variam de R$ 89 a R$ 230, em média (dependendo do porte do animal), o cliente pode contratar quantos banhos quiser no mês.
Puxados por essa facilidade, assinantes de planos consomem 20% a mais em serviços adicionais, e compram 30% mais produtos na comparação com não assinantes, explica o CEO.
“Com os planos, que dão direito a determinado número de banhos por mês, e descontos em outros serviços e produtos, estreitamos o relacionamento com os clientes, estimulamos a recorrência e recompensamos os mais fiéis”, completa.
Falando em produtos, a rede conta ainda com uma linha exclusiva da marca com mais de mil itens, como as linhas de higiene, tapetes, areia, ossinhos, snacks, brinquedos, caminhas e coleiras, entre outros.
Pet Choice: marca exclusiva tem mais de mil itens, de linha de higiene a brinquedos e snacks
Ainda que o DNA do modelo de negócio seja o banho e tosa, com direito à escola de formação de tosadores, a linha de produtos exclusivos, segundo Rodrigo, permite à rede se diferenciar e fidelizar o cliente oferecendo mix de preços agressivos e alto nível de prestação de serviços.
“A frequência é alta pois é um modelo em que o cliente está sempre na loja, comprando produtos e desenvolvendo uma relação única pois tem menos problemas com o pet – o que gera rentabilidade com a experiência. É um ganha-ganha entre cliente, franqueado e lojista.”
Além do portfólio de produtos e serviços, 70 unidades da Petland espalhadas em 12 Estados oferecem atendimento veterinário, nas clínicas Dra.Mei.
A rede também acaba de lançar um novo formato de loja para chegar ainda mais perto do consumidor: a Eco Box, uma loja de 24 m² confeccionada em polipropileno reciclado inspirado no modelo contêiner, com custo acessível (R$ 195 mil), e que pode ser instalada em condomínios, supermercados e postos de gasolina. A expectativa para 2024 é vender 30 unidades do modelo.
E-COMMERCE, CONCORRÊNCIA E IA
Mesmo tendo e-commerce desde 2019, a estratégia da Petland neste momento não contempla o setor. Segundo Rodrigo Albuquerque, além de a participação desse canal de vendas ser muito pequena, assim como no mercado pet, que não passa de 10% como um todo, focar em e-commerce iria contra a atividade principal, já que, em suas próprias palavras, “não existe banho on-line”.
Além de contrastar com o que a marca faz no momento, os planos são ganhar maturidade para voltar a investir nesse canal em algum momento. E é preciso reforçar, afirma: a Petland não vende pela internet, mas “usa a internet para vender”, com softwares de CRM, site, redes sociais e aplicativos.
“Todos os franqueados são ativos nas redes sociais da empresa, temos um Instagram por loja, são 161. Isso só é possível fazer em uma rede de franquias: falar diretamente com alguém de São Paulo ou de Minas Gerais de maneira personalizada, seja com um bairro ou um Estado.”
Falando especificamente de CRM, uma ferramenta digital “super importante”, em sua avaliação, ela ajuda a trazer clientes que não voltam na loja por determinado período e assim manter a recorrência. Sem contar que 70% dos negócios passam pelo Whatsapp em algum momento da jornada. “Isso é usar a internet para vender: focar na jornada digital, e não só no que entra na plataforma e enche o carrinho.”
Além disso, Rodrigo considera o e-commerce uma modalidade impessoal, que favorece a guerra de preços. “Na minha leitura, hoje, as grandes – Petz, Cobasi, Petlove – não têm 15% do mercado on-line. Mas ainda tem Mercado Livre e Amazon, e todos brigam pelas mesmas coisas: preço e prazo de entrega. Já para a loja de bairro, que tem maior fatia do mercado, ninguém está olhando.”
Mas já começaram: a Petz, líder em vendas do setor e a única listada na B3, anunciou no início do mês que deve implementar em breve microfranquias de serviços nas lojas próprias com serviços de banho e tosa e veterinária – estratégia já em andamento, independente da futura sinergia com a Cobasi.
E marcas pet nativas digitais, como Petlove e Zee.Dog, acabam de anunciar movimentação nesse sentido. A primeira, com modelo de franquia para lojas de bairro entre 250 e 300 m², no estado de São Paulo.
Já a segunda, adquirida pela Petz em 2021, planeja incursão no ambiente de lojas físicas com o Zee.Now, app de entrega “ultraexpress” da marca, para abrir quatro unidades em bairros paulistanos.
Independentemente dos movimentos da concorrência, a Petland se mantém firme nas convicções. Sem divulgar valores, o modelo fez a rede crescer cerca de 40% em receitas nos últimos dois anos, e a perspectiva é ampliá-la entre 25% e 30% em 2024, “em linha com o imaginado”, afirma.
No momento, diz, mesmo com a venda do novo modelo Eco Box, o foco é mais qualidade e menos quantidade: afinal, abrir menos lojas não significa crescer menos em receitas. “Em 2022 abrirmos quase 80, mas em 2023 e 2024, no indicador mesmas lojas, as receitas continuaram crescendo bastante.”
Agora, diz o CEO, o foco é olhar para dentro da empresa, revisitar processos para ganhar eficiência, e “pôr a IA para trabalhar” já neste trimestre: além de “usar para tudo”, de mapear problemas e organizar dados para diminuir tempo de execução de tarefas e vender melhor, de criar leiaute de lojas a bônus para colaboradores, esse passo do varejo em relação à tecnologia já não é mais uma opção, afirma.
“Todo mundo está caçando eficiência, as margens apertadas são maiores que a média. Não se aprofundar em IA é deixar essa eficiência na mesa e ganhar menos. Ou perder dinheiro”, finaliza.
Fonte: Diário do Comércio