Por Natália Flach | Até março, os gastos domésticos subiram mais do que a renda dos brasileiros. Com o orçamento mais apertado, os consumidores têm comprado menos produtos e dado preferência a mercadorias mais baratas, sem se ater a marcas ou lojistas.
Esse cenário contribuiu para que itens de supermercados entrassem para a lista de indulgências. Também fez com que cerca de um terço das pessoas precisasse recorrer às suas economias para encerrar o mês no azul. As conclusões são do novo relatório ‘O consumidor brasileiro de hoje’, elaborado pela consultoria McKinsey e obtido com exclusividade pelo Valor. Ao todo, foram ouvidos 1 mil consumidores de todo o país.
Cerca de 41% dos respondentes das classes A e B1 reportaram aumento da renda familiar nos últimos três meses, enquanto 63% apontaram avanço nos gastos domésticos. Já 33% das pessoas das faixas B2 a C1 enriqueceram no mesmo período, mas 57% citaram alta nas despesas. A situação é mais delicada entre a população C2, D e E. Apenas 16% tiveram incremento de renda, mas 49% viram as contas ficarem mais caras.
Pedro Fernandes, responsável pelo levantamento, detalha que esse quadro tem levado parte dos brasileiros, em especial das classes A a C1, a planejar melhor os seus gastos. “A mudança de hábito começou na pandemia de covid-19. Até então, os brasileiros deixavam para ir ao mercado quando a despensa já estava quase vazia, não reservando tempo para a pesquisa de preço”, afirma.
Ainda assim, 29% dos consumidores têm lançado mão de suas economias para cobrir suas despesas essenciais. Além disso, todas as faixas de renda têm usado o cartão de crédito com mais frequência para esticar o prazo de pagamento.
Há outros pontos em comum. Cerca de 31% dos consumidores passaram a escolher mercadorias mais baratas; em especial, relacionadas a produtos domésticos, de bem-estar e brinquedos. Esse número é 7 pontos percentuais maior do que o registrado no ano passado.
Já 37% dos respondentes reduziram a quantidade de itens comprados ou deram preferência a embalagens menores — que, em teoria, são mais em conta. “Muitas vezes, as pessoas vão para o mercado com dinheiro contado e querem comprar a maior variedade de itens. Nesse sentido, as embalagens menores são uma alternativa”, explica. “O preço por grama passa batido, pois o que importa é ter aquela mercadoria, mesmo que ela não dure um mês.”
Outra descoberta é que por volta de 40% respondentes estão menos leais aos lojistas, tendo mudado de varejista ou de site de compras em reação ao aumento de preços. Não é para menos que 55% dizem utilizar canais online e offline na busca ou na compra de produtos.
Nesse sentido, pode parecer um contrassenso que boa parte dos consumidores se mantenha otimista em relação à economia. Cerca de 38% dos respondentes creem que o cenário econômico vai se recuperar de dois a três meses e se tornará tão ou mais forte do que antes. “Mas isso não significa que o brasileiro vai sair gastando. Esse otimismo já foi muito maior em outras épocas.” Já outros 44% dizem que a economia será impactada nos próximos seis a 12 meses e poderá ficar estagnada ou até apresentar crescimento lento a partir daí. Apenas 18% se mostram pessimistas.