Por Adriana Mattos | Maior empresa de comércio on-line do país, o Mercado Livre prevê investir R$ 23 bilhões no Brasil em 2024, avanço de 21% sobre o ano anterior, e pouco mais que o dobro do desembolsado três anos atrás, em 2021 (R$ 10 bilhões), disse Fernando Yunes, vice-presidente sênior e principal executivo no país.
O foco central de 2024 será a área de logística, segmento em que as plataformas rivais estrangeiras, especialmente Amazon e Shopee, vem ampliando os gastos de três anos para cá.
O Brasil é 53% da receita líquida anual do Mercado Livre e a operação recebe o maior volume de investimento global do grupo, sediado no Uruguai.
Neste montante de R$ 23 bilhões, está prevista a abertura de um centro de distribuição em Pernambuco, em julho ou agosto, para ampliar a estrutura no Nordeste, região ainda com prazos de entrega e nível de serviço abaixo do verificado nas praças do Sudeste. “Poderemos até ter mais um ou dois centros de distribuição neste ano, estamos identificando as áreas e os parceiros”, disse Yunes.
Estados do Centro-Oeste e Sul do país são regiões que podem ser contempladas com novas centrais, a depender das negociações. Se isso avançar, o total de centrais no país passará de 10 para 13 em 2024.
Apesar da melhor medida ser a metragem das áreas das empresas, para efeito de comparação, a Amazon, que, como Mercado Livre, também é 100% digital (sem lojas no Brasil) tem dez centros no país. De 2019 a 2023, ela abriu esse volume de centrais.
Há anos seguidos, os investimentos anunciados pelo Mercado Livre são recordes e incluem também montantes relativos a despesas operacionais — que a empresa chama de “despesas estratégicas”. Isso tende a elevar a soma total.
Investimentos e despesas tem diferentes conceitos contábeis. A empresa não informa a divisão entre esses valores.
“Self funded”
Questionado se essa conta vai ser dividida com a matriz, Yunes diz que recursos vem da própria operação local. “O Brasil é totalmente ‘self funded’. Somos financiamos pela nossa operação porque geramos capital para isso”.
Mesmo num ambiente em que a concorrência enfrenta problemas financeiros, prejuízos recordes e investimentos em queda, o Mercado Livre decidiu aumentar o ritmo de expansão do investimento.
Em 2023, os desembolsos atingiram R$ 19 bilhões, alta de 11,8% em relação a 2022 — e variação superior a um avanço previsto de 21% em 2024.
A cifra anunciada deve ser a maior soma investida por uma empresa on-line no país no ano, superando Magazine Luiza, Amazon e Casas Bahia.
Apesar de essas empresas não informarem suas previsões de desembolsos para 2024, não é esperado pelo mercado um crescimento tão forte em Magalu e Casas Bahia. E os números de 2023 estão abaixo desse patamar.
O Magazine Luiza teve, entre investimentos e linha de despesas operacionais, uma cifra total de cerca de R$ 10 bilhões em 2023, e a Casas Bahia, R$ 8,9 bilhões, calculou o Valor.
Analistas de bancos estimam que Mercado Livre tenha 40% das vendas on-line no país, Magazine, entre 15% e 16%, Amazon, 11% e Shopee, entre 8,5% e 9%. Casas Bahia estaria com 6%. A plataforma, fundada por empreendedores argentinos, “descolou” das empresas brasileiras e da Amazon de dois a três anos para cá.
Yunes conta que, entre os quatro pilares principais de investimento neste ano estão logística, seguido por tecnologia, o braço de fintech do Mercado Pago e o “Mercado Ads”, operação de publicidade digital que a empresa entende que pode trazer mais receita já neste ano.
A venda de serviços de publicidade nas plataformas virou espécie de febre entre as empresas neste ano, em parte, pelo potencial inexplorado, com receita “nova” entrando nessa linha.
O executivo ainda lembra que a empresa pode ampliar a operação dos segmentos de moda e supermercados no on-line, dentro desses investimentos. Em supermercados, o grupo chegou a dar um impulso na venda de alimentos e bebidas em 2020, durante a pandemia, mas depois isso perdeu força.
Sobre o foco em logística, nessa conta está gastos em tecnologia para a distribuição para consumidores e nos serviços prestados aos lojistas, de coleta, armazenagem e entrega. “Ainda não está definido, mas estamos também pensando em alguns avanços na tecnologia dos nossos ‘CDs’, mas não quero adiantar esse tema ainda”, disse Yunes.
Inteligência artificial
Outro ponto tem relação com o uso de inteligência artificial para melhorar a experiência do cliente no site e no “app” — algo que alguns concorrentes andam se destacando, dizem consultores.
Empresas como Shein, AliExpress e Shopee criaram interfaces amigáveis e com mais informações aos consumidores — com fotos e opiniões de clientes sobre os produtos. Isso cria segurança maior na hora da compra.
A Shein chega a dar pontos aos clientes que opinam e põe fotos na área de comentários, e os pontos podem ser revertidos em descontos.
É algo que o Mercado Livre entende que precisa avançar, e na última feira global do varejo, em Nova York, em janeiro, Yunes colheu experiências de outras empresas nesse sentido.
“Já estamos analisando uma personalização maior dos anúncios usando inteligência artificial”, afirma ele.
Em relação a investimentos no Mercado Pago, a empresa acredita que, como fintech, a operação ganhou musculatura, mas considerando todo o mercado financeiro, ainda é um braço pequeno.
Fonte: Valor Econômico