Por Liane Thedim | Mesmo com o início do ciclo de afrouxamento monetário, o país ainda não vê melhora significativa na situação das empresas, que amargam queda nas vendas e nas margens de lucro bruto. Estudo do Centro de Estudos de Mercado de Capitais (Cemec-Fipe) mostra que a quantidade de companhias de capital aberto que não conseguem cobrir as despesas financeiras com sua geração de caixa é grande, e os indicadores devem piorar nos próximos meses.
Esse é o efeito de um período de juros ainda elevados. No entanto, diz o levantamento, os gastos com encargos financeiros têm “clara tendência decrescente”, ao mesmo tempo em que a queda nos lucros está menos intensa. Segundo Carlos Antonio Rocca, coordenador do Cemec-Fipe, o cenário deve começar a clarear ainda neste ano.
O quadro atual exibido pelo estudo é difícil: o índice de inadimplência de pessoas jurídicas se manteve em alta, em 3,58% em novembro do ano passado, mais que o dobro do visto no fim de 2020 (1,45%). Consultorias especializadas em restruturação de dívidas apontam que cresceu fortemente a procura de empresas em busca de renegociação com credores, comprador ou sócio ou recuperação judicial. Entre os setores mais problemáticos, os especialistas apontam construção civil, varejo e agronegócio.
“O número de consultas que temos recebido de empresas com endividamento acima de R$ 200 milhões aumentou bastante”, comenta Ricardo Knoepfelmacher, fundador da RK Partners, especializada em reestruturações. Levantamento da consultoria mostra que, na média, as taxas do crédito para capital de giro já caíram em três pontos percentuais de janeiro de 2023 para o mês passado, de 30,3% para 27,3% ao ano, ou seja, ainda patamares bastante altos. Ao mesmo tempo, o mercado de capitais está bastante seletivo depois dos rumorosos casos de Americanas e Light no início do ano passado.
Em linha com o cenário sinalizado pelo Cemec, o estudo da RK revela que, entre as empresas de capital aberto, 27% têm geração de lucro inferior ao que têm de pagar em dívidas neste ano – o maior percentual na série histórica da consultoria, iniciada no primeiro trimestre de 2019. “A queda dos juros demora de 18 a 24 meses para ter efeito nas contas das empresas. Então o ano de 2024 ainda vai ser ruim”, avalia Knoepfelmacher. Segundo ele, 15% delas têm alavancagem acima de seis vezes sua geração de caixa. “Mais do que três vezes já é um patamar muito alto com a Selic neste nível.”
Ricardo Jacomassi, sócio e economista-chefe da TCP Partners, afirma que o caixa das empresas ainda está muito apertado. “O custo aumentou com a alta da Selic e ainda não caiu. Ao mesmo tempo a performance de vendas não melhorou para que a geração de caixa faça frente às dívidas”, diz. Para mudar o cenário, afirma, seria preciso que as receitas voltassem ao patamar de 2019. Relatório da empresa, que acompanha 60 setores, projeta crescimento de 6% nos pedidos de recuperação judicial (RJ) neste ano frente a 2023, quando, segundo dados da Serasa Experian, os pedidos subiram 68,7% e somaram 1.405, o maior valor desde 2020.
Fonte: Valor Econômico