Por Carina Rodrigues | Um novo tipo de consumidor emergiu da recuperação pós-pandemia. Referido como o “consumidor eremita”, fica mais em casa, o que tem implicações contínuas para o setor de foodservice.
Há várias razões para acreditar que, de um modo geral, as condições econômicas se tornarão mais favoráveis, em 2024. A inflação global deverá continuar a cair e os problemas da cadeia de abastecimento remanescentes dos anos de pandemia estão a ser resolvidos. No entanto, está a tornar-se cada vez mais evidente que muitos canais de foodservice não estão no caminho da recuperação, como muitos esperavam durante o tumulto inicial da pandemia. De acordo com a consultora GlobalData, a nível global, este setor não voltou a nenhum tipo de normalidade pré-pandemia, durante 2023. As vendas em valor aumentaram apenas 3% desde 2019, com as transações a caírem 3% no mesmo período. A venda de refeições desceu 12% em comparação com 2019, enquanto a receita de take-away aumentou 46%.
“A ideia de uma recuperação pós-pandemia para a indústria de foodservice pressupõe que 2020-2021 foi um ‘blip’ – um evento exógeno e único na vida que interromperia o progresso por um ou dois anos, antes que as tendências normais e o comportamento do consumidor fossem retomados”, afirma Fred Diamond, consultor na GlobalData. “No entanto, durante esse período, algo mudou. Nós mudámos. As pessoas continuam a gastar, e continuam a consumir, mas de uma forma radicalmente diferente. Este novo tipo de consumidor foi denominado ‘consumidor eremita’, dando origem à ‘economia eremita’”.
Mudança comportamental à escala global
A economia eremita sobrepõe-se a conceitos como o de “casulo”, uma palavra usada para descrever o fenômeno das pessoas ficarem mais tempo em casa e focarem-se em melhorar o conforto e a conveniência dos lares, em detrimento de experiências ao ar livre. É exemplo alguém que renuncia a ir comer fora e, em vez disso, usa as poupanças obtidas ao longo do tempo para melhorar a sua cozinha. Conceitos como esse também se sobrepõem aos efeitos da inflação sobre o comportamento do consumidor.
Globalmente, 46% dos consumidores afirma que comerá fora com menos frequência nos próximos três meses e 11% assume mesmo que vai parar completamente, de acordo com a pesquisa da GlobalData efetuada no quarto trimestre de 2023.
“Então, em 2020-2021, as pessoas ficaram mais em casa por causa do coronavírus. Em 2022-2023, por causa dos aumentos de preços. São quatro anos de mudança comportamental à escala global. A ideia de que as coisas podem voltar à forma como as pessoas viam o futuro, do ponto de vista de 2019, tem de ser abandonada e a nova paisagem abraçada”.
Só na Europa Ocidental, as transações de foodservice caíram 9% para as refeições e 23% para o take-away em 2023, em comparação com 2019, enquanto as transações gerais caíram 3%. Tendências semelhantes são observadas na Ásia e na América do Norte. “De certa forma, isso não é surpresa. Os principais beneficiários dos confinamentos, como as plataformas de entrega, obviamente têm como objetivo manter o seu novo domínio. O aumento das ‘ghost kitchens’, que são estabelecimentos de foodservice apenas para delivery, também serviu para cimentar esse novo cenário. Mas esta não é simplesmente uma mudança igual do ‘dine-in’ para o take-away. Em muitas regiões, como a Ásia e a Europa, o mercado de foodservice caiu em relação aos níveis de 2019”.
Oportunidades
A inovação em termos de produto é algo que deve ser sempre considerado quando se enfrenta o duplo desafio da queda da afluência e da redução da despesa. Limitar o tempo em que os novos itens no menu ou ofertas estão disponíveis pode criar uma escassez artificial e levar os consumidores a saírem e a gastarem enquanto o produto que despertou a sua atenção ainda está disponível. No processo, os consumidores estarão suscetíveis a novas influências da marca, o que poderá ajudar a fidelizar o cliente.
Por outro lado, prossegue a GlobalData, apelar a conceitos como autenticidade e patrimônio pode também ter um forte impacto junto dos consumidores. Em todo o mundo, os consumidores estão a tornar-se céticos em relação a produtos que parecem “produzidos em massa” ou que não são originais. Os estabelecimentos também precisam de se apoiar nos seus laços com a comunidade que servem e isso pode ser conseguido através do fornecimento de ingredientes localmente, refletindo a cultura local na comida servida. De facto, 75% dos consumidores globais diz que a autenticidade é “essencial” ou “agradável de ter” ao decidir qual o produto a comprar, de acordo com a GlobalData.
Por último, os operadores que não dispõem de uma opção de take-away ou de entrega ao domicílio têm de a introduzir. Uma maneira de o fazer é aderir a uma aplicação de entrega de terceiros.
“Antes de tentar reduzir ainda mais os preços, os operadores precisam de ter em mente que os consumidores já têm a capacidade de escolher opções de alimentos mais baratas. É por isso que existem conceitos como ‘fakeaways”’. De facto, os take-aways reais têm sido historicamente mais baratos do que uma experiência de jantar. Portanto, para atrair o consumidor eremita de volta aos pontos de venda, os operadores devem concentrar-se em transmitir que têm boas porções, ao mesmo tempo em que destacam os melhores ingredientes que têm a oferecer, contrastando com o que os consumidores podem encontrar em alternativas mais baratas”.
Fonte: Grande Consumo