Por Glauce Cavalcanti
O grupo carioca Reserva, há três anos parte da Arezzo, multiplica marcas e negócios. A Ink, plataforma para lojas digitais de camisetas, soma mais de 30 mil empreendedores conectados. Entre as submarcas da Reserva, a Simples — de moda básica e preços mais acessíveis — levanta voo solo. Terá mais de uma dezena de lojas próprias no ano que vem e, em 2025, parte para as franquias.
“A Simples é um negócio talvez maior, em potencial, que o conjunto da obra hoje. Pode ter uma cadeia de 400 a 500 lojas”, estima Rony Meisler, CEO da AR&Co, braço de lifestyle e vestuário da Arezzo&Co, que nunca sai da persona de vendedor.
No segmento, a companhia tentou comprar a Hering, mas ela acabou nas mãos do rival Soma, grupo dono de Farm e Animale. Meisler se diz entusiasmado com a entrada de pessoas com mais de 70 anos em lojas do grupo, cujos vendedores têm em média 20.
A Reserva tem multiplicado suas marcas. Por quê?
Sempre tivemos a tese de submarcas, que se complementam em ocasião de uso ou público-alvo. Começamos com a Reserva. Em seguida, a Reserva Mini. Nosso chefe não sou eu nem diretor algum, é o cliente. É com ele que a gente convive, aprende, escuta, para atender às demandas. Depois veio a Reserva Go (calçados e acessórios).
Nenhuma das iniciativas começou gigante. Tudo começa pequeno para aprender, desenvolver a cadeia de fornecimento, treinar o fornecedor, entender quem é o melhor parceiro. Nas nossas lojas, 50% dos que compram são mulheres. Veio o feminino. Compramos a BAW Clothing para o jovem e criamos a Oficina. Agora temos a Reserva Praia, que terá lojas em hotéis, aeroportos e balneários.
E que tipo de negócio é a Ink?
A Ink não é uma marca, é uma tecnologia. Tem lojas da Ink que vendem R$ 100 mil, R$ 130 mil por mês. É proporcionalmente o negócio que mais cresce. Começou porque muito empreendedor nos procura para mentoria, querendo abrir marca de moda. Então, pensamos: por que não fazemos uma plataforma para essa moçada?.
Tínhamos as impressoras têxteis, que fazem impressão sob demanda para quase todas as nossas marcas. Decidimos abrir isso, e qualquer um consegue montar um site. É full commerce (cobre toda a operação de vendas digitais).
Há mais de 30 mil empreendedores na plataforma. Este ano, aumentamos a instalação no Rio e abrimos uma segunda em São Paulo para diminuir o tempo de entrega. O Botafogo montou sua lojinha na Ink. De forma diferente, somos o parceiro oficial de moda do Flamengo e do Vasco. Há vários times no pipeline. Lá fora, grandes times de futebol têm duas parcerias: uma de material esportivo, como Nike, Adidas. Outra para moda, as roupas de apresentação pré e pós-jogo, de viagens. É o que fazemos.
A Simples, com preços mais acessíveis, cresce com força?
A Simples é um sonho de muitos anos. Uma coisa que sempre me incomodou: apesar dos nossos projetos sociais e ambientais, nosso produto nunca foi barato por um conjunto de motivos. Primeiro, o modelo da multimarcas (lojas revendedoras de peças da Reserva) no meio. Não posso vender mais barato que meu cliente.
Segundo, pela decisão que tomamos quando a companhia tinha três anos de, prioritariamente, produzir nossas coleções no Brasil para gerar renda e emprego. O produto na Ásia é muito mais barato, mas aqui a gente é que fornece. Ao todo, 97% da produção estão aqui.
A venda da indústria direto ao consumidor avança. É um foco?
Faremos 18 anos em 2024, 15 produzindo prioritariamente no Brasil. Repito isso porque se, de um lado, a gente perdeu em competitividade no preço da Ásia, ganhou em conhecimento da indústria, da cadeia, relacionamento com o mercado e volume.
Tem duas formas de ganhar margem: fazer o produto num mercado com leis trabalhistas questionáveis ou sem garantia de conformidade do fornecedor ou crescer no volume e seu parceiro lhe dar o melhor preço.
Na Covid, com fronteiras fechadas — veja como fazer certo dá certo! — estávamos superprotegidos na indústria brasileira. Mas, num modelo de negócio com revenda para multimarcas, é difícil ter preço final mais democrático. Já a Simples é um negócio mais focado no consumidor final.
É outro formato de negócio?
O público alvo da Reserva é (classe) AB+. A Oficina é A. A BAW é A- e B. E a Simples é B. Na B, para fazer o produto democrático, não pode ter uma experiência maravilhosa dentro da loja? Ter uma marca da qual todo brasileiro tem orgulho de ser brasileira? Tem esse espaço no Brasil de, como a Havaianas fez, alguém fazer pelo têxtil.
Esse é o sonho da Simples, prover autoestima para o brasileiro e a brasileira. Nossa cadeia está pronta para isso, mas não começamos com tamanho monstruoso. Abrimos e-commerce. Depois a única loja, no BarraShopping (Rio), com venda por metro quadrado muito próxima às da Reserva no mesmo shopping. E com perspectiva de crescimento de escala enorme.
Como será a expansão?
Focaremos em operações próprias para entender a experiência de venda, ponto, consumidor final. E ter entre dez e 15 lojas próprias no ano que vem. Não serão lojas grandes, não acreditamos no conceito de megastore, terão de 100m² a 120m². Não vão ser autosserviço. Queremos atendimento assistido, serviço acima da expectativa. Não é porque ele (o cliente) tem menos dinheiro na carteira que o produto vai ser pior.
Aí é que está o diferencial, com a qualidade da indústria Reserva. A partir de 2025, começamos a franquear, e continuaremos abrindo lojas próprias, principalmente no Sudeste. A Simples é, com certeza, um negócio muito maior. Talvez maior, em potencial, que o conjunto da obra hoje. Pode ter de 400 a 500 lojas.
A Hering, que a Arezzo tentou comprar, é um ícone como a Havaianas…
É uma grife de 140 anos. Temos um respeito pela Hering monstruoso, é um patrimônio do Brasil. Mas entendo que, assim como em diversos outros segmentos, existe espaço para mais de uma marca com proposta de valor diferente.
Está otimista com a economia?
O ambiente da Reforma Tributária gera uma certeza maior por parte do empresariado. Apesar de achar que serviço e comércio são menos privilegiados que a indústria, simplifica a vida do empresário. Se você me fizesse essa pergunta um ano atrás, eu diria: “Não sei.”
A pior coisa para um empresário é não saber. Sempre que eu não soube o que fazer, seguimos um padrão: investimos em produto bom, marca, incentivamos o time. Quando esses cenários acontecem, tem uma produtividade menor, mas também competitividade menor, e você ganha share (participação de mercado).
Qual o efeito da linha de produtos inclusivos?
Tanto a 3G, para big and tall (pessoas de dimensões acima da média), quanto a Adapt, a linha PCD (para pessoas com deficiência), crescem muito em faturamento. E não são fáceis de desenvolver. Quando lançamos a Adapt, confesso que achava que estava entregando autoestima a essas pessoas pelo produto adaptado de marca.
Só que descobri com o cliente que a gente estava entregando dignidade, autonomia. Estava permitindo que uma pessoa que não conseguia ir ao banheiro sozinha fosse, que não conseguia se vestir de manhã sozinha fizesse isso.
Há contratação inclusiva?
Temos na sede entre 150 e 200 PCDs, de 450 pessoas no total. E todos os corpos. Há uns dez anos, montamos o projeto Cara ou Coroa para ter 20% das lojas com ao menos um profissional com mais de 70 anos. Agora já são mais de 40% das lojas com ao menos um 70+. Começou como projeto de inserção social, mas é um projeto comercial.
A gente tem uma faixa etária média nas lojas de 20 a 22 anos. De repente, entra um senhor ou uma senhora de 75 anos. Rapidamente, ocupam um papel de direcionamento de carreira, produtividade e método, mentoria, aconselhamento. A barra intelectual da loja sobe.
Como está o fim de ano, com Black Friday e Natal?
Entre 30% e 40% do nosso faturamento vêm no quarto trimestre. O consumidor quer cada vez mais serviço, comodidade. Há clara migração para o on-line. Hoje, 55% do nosso faturamento vêm do digital. E temos 200 lojas físicas. Se você não entregar serviço, não vai ganhar essa corrida do varejo.
Fonte: O Globo