16/03/2015 às 05h00
Por Erin Ailworth e Benoît Faucon | The Wall Street Journal
O oceano de petróleo originado nas formações de xisto dos Estados Unidos levou os preços do produto, na sexta-feira, a seu nível mais baixo nos últimos seis anos. Agora, as petrolíferas americanas afirmam que estão preparadas para provocar outra inundação que impediria os preços de voltar subir por um bom tempo.
A Agência Internacional de Energia reforçou a perspectiva de uma queda prolongada nos preços do petróleo ao informar, na sexta-feira, que a produção americana foi surpreendentemente alta em fevereiro e está enchendo rapidamente os tanques de armazenamento disponíveis. Isso, segundo a agência, pode levar a outra forte queda nos preços, que já caíram cerca de 50% desde meados de 2014.
O relatório provocou a quedados preços ao redor do mundo: o petróleo tipo Brent, a referência global, caiu US$ 2,41, para US$ 54,67 o barril. Já o petróleo de referência nos EUA, o West Texas Intermediate, recuou US$ 2,21, para US$ 44,84, menos de US$0,40 acima da mínima de seis anos registrada no fim de janeiro. Há menos de um ano, os dois tipos eram negociados acima de US$ 100 por barril.
No mês passado a AIE havia previsto que uma recuperação nos preços parecia inevitável porque o boom da produção nos EUA deveria esfriar. O novo relatório, porém, afirma que “a oferta americana, até agora, mostra poucos sinais de desaceleração.
Pelo contrário, continua superando as expectativas”.
As petrolíferas independentes que exploram formações de xisto reduziram seus gastos
com perfuração de poços em US$ 50 bilhões neste ano, comparado com 2014, mas
prometeram elevar a produção ao concentrar a exploração em seus melhores campos.
De fato, a produção total de petróleo dos EUA atingiu um recorde de 9,4 milhões de
barris por dia na semana terminada em 6 de março, segundo dados do governo.
Agora, muitas empresas estão adotando uma nova estratégia que permitirá que
produzam ainda mais petróleo quando os preços começarem a subir. Elas estão
perfurando poços, mas adiando o fraturamento hidráulico, que consiste em bombear
água, areia e químicos em alta pressão para liberar o petróleo das formações de xisto.
O adiamento do fraturamento possibilita às petrolíferas armazenar o petróleo no
subsolo de forma a poder acessar rapidamente as reservas quando desejarem e
inundar o mercado novamente.
Essa estratégia pode impor um limite à alta dos preços do petróleo quando eles se
recuperarem, diz Ed Morse, líder global de pesquisas sobre commodities do banco
Citigroup Inc.
“Estamos em território um pouco desconhecido”, diz Morse.
“É um experimento um experimento bem grande.”
A texana EOG Resources Inc. está perfurando cerca de 285 poços que não entrarão em
operação até que o preço volte à faixa dos US$ 60 a US$ 65 por barril. “Quando os
preços se recuperarem, a EOG estará preparada para voltar a ter um forte crescimento
de dois dígitos” na produção, disse recentemente o diretor-presidente, Bill Thomas.
Alguns outros grandes nomes do petróleo americano também estão atrasando a
entrada em produção de seus poços, como Anadarko Petroleum Corp., Apache Corp.,
Chesapeake Energy Corp. e Continental Resources Inc. Essas quatro e mais a EOG
produziram 312 milhões de barris de petróleo nos EUA em 2014, ou quase 10% de
toda a produção de petróleo bruto do país.
O número de poços nos Estados do Texas e Dakota do Norte que foram perfurados,
mas ainda não estão produzindo, chega a pelo menos 3 mil, estima a RBC Capital Markets.
Esse petróleo guardado no subsolo “proporciona uma reserva que poderia conter altas
fundamentais de preços” nos próximos 12 meses, escreveu Scott Hanold, analista da
RBC, em nota de análise divulgada na sexta-feira. Esse petróleo no subsolo é,
essencialmente, um estoque semelhante ao mantido nos tanques dos EUA. O país
possui hoje 449 milhões de barris de petróleo estocados em tanques, um nível recorde
que equivale a quase 70% da capacidade de armazenamento do país, segundo a
Agência de Informação sobre Energia dos EUA. Mesmo assim, Jim Krane, acadêmico
do setor de petróleo no Instituto Baker de Políticas Públicas da Universidade Rice, em
Houston, questiona se as companhias americanas de petróleo serão capazes de ajustar
a produção com a mesma rapidez que, por exemplo, a Arábia Saudita mostrou no
passado. “Provavelmente teremos mais volatilidade de preços porque, ainda que o
xisto seja ágil, não é tão ágil quanto a Opep”, diz ele, referindo-se à Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
As produtoras de petróleo de xisto “não podem simplesmente ir lá e abrir uma válvula”. Essa discussão não quer dizer que a queda dos preços não tenha afetado a produção nos EUA.
O número de sondas de petróleo em operação caiu em 56 unidades esta semana, para um total de 866, um recuo de 46% desde o início de outubro, quando o petróleo ainda era negociado a cerca de US$ 90 o barril, segundo a prestadora de serviços Baker Hughes Inc. Cortes na produção estão realmente começando a se materializar.
Reguladores de Dakota do Norte informaram, na quinta-feira, que a produção de petróleo caiu 3% em janeiro ante o recorde alcançado em dezembro.
Desde novembro, quando a Arábia Saudita afirmou que continuaria produzindo petróleo em altos níveis para proteger seu mercado, observadores do setor vêm esperando uma queda na produção de petróleo de xisto americano. Alguns membros da Opep afirmaram, na época, que a medida iria forçar os produtores dos EUA a cortar a produção devido a seus custos de extração relativamente mais altos.
As empresas americanas não estão necessariamente procurando ocupar o papel de “produtores de guinada” da Opep, que podem ajustar a produção para ajudar a elevar os preços.
Para muitas petrolíferas, o adiamento da produção de poços já perfurados é uma decisão financeira: completar um poço e colocá-lo em produção representa 60% do custo total do poço. Ao empurrar essa despesa para frente, as empresas esperam ganhar mais com uma alta dos preços quando elas finalmente resolverem extrair e vender o petróleo. Elas também estão prevendo que seus custos vão cair à medida que as prestadoras de serviços começarem a competir pelos seus contratos.
Harold Hamm, diretor-presidente da Continental Resources Inc., sediada em Dakota do Norte, fez tudo que pôde para convencer outras produtoras a adiar o início da produção do maior número de poços possível. A Continental está esperando para ativar 127 poços já perfurados, adiando até US$ 1 milhão em despesas por poço.
“Economize esse dinheiro”, argumentou Hamm recentemente. “Evitem vender a produção num mercado fraco e o custo dos serviços cair antes de completar esses poços. A maioria das pessoas está fazendo isso”, disse.
Valor Econômico – SP