Por Daniel Teixeira – As taxas de crescimento de dois dígitos que os supermercadistas registraram durante a pandemia começaram a cair para um patamar “mais normal” nos últimos meses.
Em janeiro, as 150 maiores redes do varejo alimentar venderam, em média, 15% mais do que em igual período do ano passado e, em fevereiro, 15,3% mais no estado de São Paulo.
A partir de março, este percentual foi caindo mês a mês até chegar a 4,2% de alta em junho deste ano sobre igual mês de 2022, considerando as mesmas lojas.
A queda na taxa de crescimento era mais ou menos esperada pelo setor à medida que os efeitos da pandemia ficaram para trás. Além disso, a queda da inflação teve impacto no faturamento. Ainda assim, o dado de junho assustou parte dos supermercadistas.
Os dados foram levantados pela Varejo 360, empresa de tecnologia que desenvolve pesquisa de mercado com base em informações de tíquetes de compra de consumidores paulistas.
Se consideradas também as novas lojas, o percentual de aumento de vendas cai de 19%, em janeiro, para 9% em junho, na comparação com o mesmo período do ano passado.
Evidentemente, a inflação no setor de alimentos empurrou para cima o faturamento dos supermercados, assim como a pandemia, já que as lojas permaneceram sempre abertas.
“É normal que as taxas de crescimento diminuam. As comparações mensais eram enganosas com inflação e efeitos da pandemia”, diz Fábio Silveira, sócio-diretor da MacroSector.
No acumulado do primeiro semestre, as vendas do varejo alimentar no estado de São Paulo subiram 9,7%, em média, em relação a igual período de 2022, considerando as mesmas lojas.
O formato de loja que mais cresceu foi o de minimercados (Minuto Pão de Açúcar e Carrefour Express), 15,4%, seguido de supermercados, 11,6%, atacarejos, 7,1% e hipermercados, 6,7%.
Os atacarejos já se destacam quando consideradas também as novas lojas, com alta de 19,4% no primeiro semestre sobre igual período de 2022, como resultado da expansão do setor.
“O varejo alimentar está melhor do que setores que dependem de crédito, mas vive um dos piores momentos dos últimos três anos”, diz Fernando Faro, sócio da Varejo 360.
Consultores de varejo que acompanham o setor dizem que muitas lojas faturaram de fato mais durante a pandemia, mas não necessariamente viram a rentabilidade também crescer.
“Está um sufoco atingir a meta para o mês. O esforço é muito maior, estamos fazendo mais promoções e propagandas na televisão”, diz Hélio Freddi Filho, diretor da rede Hirota.
No primeiro semestre deste ano, diz, a rede, com 18 lojas, vendeu 7,2% mais do que em igual período do ano passado, sem descontar a inflação. “O momento atual está preocupante.”
A venda on-line, que chegou a representar 15% do faturamento da empresa, agora participa com cerca de 2,5%. O que está crescendo, diz, 22%, é o modelo de loja em condomínios.
Atualmente, a rede possui 104 unidades e estão previstas mais dez inaugurações até o final do ano, algumas delas em espaços exclusivamente de escritórios.
Para Silveira, os dados acima revelam que a economia brasileira está começando a voltar à normalidade, exibindo números “mais reais” de desempenho das empresas.
“2023 será um ano de transição, com sinais de que o país pode transitar para um ambiente melhor, com inflação em queda e tendência de redução de taxas de juros”, afirma.
PERSPECTIVAS
Dois outros indicadores importantes para o desempenho do varejo, como pessoal ocupado e rendimento, diz ele, também indicam melhora no ambiente de negócios para este semestre.
De janeiro a maio deste ano, o pessoal ocupado cresceu 2,3% em relação a igual período do ano passado, apesar da elevada taxa de juros. “Com juros menores, estaria crescendo 4%.”
Somente o Bolsa Família, diz, deve colocar nas mãos da população mais carente em torno de R$ 12 bilhões por mês ou R$ 144 bilhões em 2023, 74% mais do que em 2022 (R$ 82,8 bilhões).
O pessoal ocupado deve receber R$ 295,1 bilhões por mês ou quase R$ 4 bilhões no ano. “A massa real de rendimento, incluindo o Bolsa Família, caminha para crescer 6,5% neste ano.”
O crédito, outra ferramenta importante para estimular o consumo, diz, está crescendo mais do que o previsto. Em maio, último dado disponível do BC, a alta foi de 13% sobre maio de 2022.
“Se descontar a inflação, o crescimento real do volume de crédito para o consumidor é da ordem de 8%, o que não é pouco. Só não cresceu mais por causa da inadimplência”, diz.
Mas também no caso deste indicador, diz, a situação já não é tão ruim, pois a taxa nos últimos seis meses está quase estabilizada em 3,8% (atrasos acima de 90 dias), de acordo com o BC.
“Aquela movimentação ascendente da taxa de inadimplência mudou. Não está declinante, mas exististe uma melhora nítida. A economia global, nacional, regional está se redesenhando.”
A partir deste mês, de acordo com Silveira, as condições de temperatura e pressão da economia começam a voltar à normalidade, favorecendo o varejo.
OUTROS NEGÓCIOS
Uma das maiores marcas de tênis do mundo, a Skechers, se prepara para crescer no país, mesmo depois de ver o mercado de calçados esportivos encolher cerca em 2022.
Com 12 lojas no Brasil, a marca, operada por três grupos brasileiros, sob licença, deve abrir pelo menos mais duas unidades neste ano.
“A expectativa é que este semestre será melhor do que o primeiro com a queda de juros e incentivo ao consumo”, afirma Alexandre Santiago, country manager da marca no Brasil.
A perspectiva do mercado de calçados esportivos para 2023, diz, é de um crescimento de 5,5% no volume de vendas e de 14% em faturamento, na comparação com 2022.
No ano passado, o setor enfrentou queda de cerca de 3% em pares e aumento de 7% na receita por causa da inflação. “Só que a alta de preços não cobriu as despesas”, diz.
Os números da Skechers são maiores, diz, porque a marca está em fase de expansão no país, com a previsão de faturar 42% mais neste ano em relação a 2022.
“Acreditamos que na crise é o momento de investir. A marca, com 800 lojas nos Estados Unidos, acredita muito no Brasil”, diz.
Do portfólio mundial de produtos da Skechers, cerca de 10% já estão no Brasil. São 500 itens entre modelos e cores. Metade do que é vendido já é produzido no mercado brasileiro.
Também tem empresários animados em um dos setores que mais sofreram na fase mais dura da pandemia, o de restaurantes.
Um deles é Lalo Zanini, empresário que atua há mais de 30 anos no ramo de gastronomia e sócio dos restaurantes Luce, Vitrô Bistrô, Vianna Bar e outros.
“Tirando os meses de abril, maio e junho do ano passado da base de comparação, já que foram meses muito bons, mantemos a média de faturamento, o que é uma vitória”, diz.
Apesar de muitos restaurantes tradicionais não terem sobrevivido à pandemia ou estarem enfrentando problemas financeiros, Zanini diz que, no seu caso, todos são superavitários.
“A nossa gestão visa lucratividade e é muito agressiva em marketing. Estamos numa fase de expansão dos negócios no país”, diz.
O empresário acabou de inaugurar o Virô Bistrô no shopping Iguatemi, em Campinas, no interior de São Paulo, e também de assumir o Vianna Bar, no bairro de Pinheiros.
A previsão ainda é abrir em agosto outra unidade do Virô Bistrô, em Sorocaba, interior de São Paulo, e o Capanema, na rua Barão de Capanema, especializada em comida kosher.
Com os dados do varejo que saíram até agora, não há dúvida que os setores mais dependentes de crédito, como o eletroeletrônico e o de veículos, são os que estão mais sofrendo.
“De fato a expectativa é de os juros caírem, mas ainda estão muito altos, e esses dois setores são os que mais sofrem com isso”, diz Fábio Bentes, economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio).
Mesmo com todos os indicadores indo na direção de um ambiente mais favorável para o consumo, o país ainda deve crescer pouco, pouco mais de 2% na previsão de Silveira.
Para o varejo, a expectativa, diz, é de um aumento de 1,3% em 2023 sobre 2022. “É pouco, mas cria-se uma expectativa de aceleração para o final do ano e começo de 2024.”
Fonte: Diário do Comércio