Por Isabela Fleischmann e Filipe Serrano
A Rappi acaba de comprar a startup brasileira Box Delivery, em sua maior aquisição desde que foi fundada em 2015 na Colômbia. Os valores não foram divulgados. O objetivo é unificar a operação dos entregadores das duas empresas para atender a demanda de restaurantes no Brasil, algo que se tornou possível, segundo a Rappi, depois que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) restringiu acordos de exclusividade do iFood com esses estabelecimentos em fevereiro.
O acordo anunciado nesta manhã de segunda-feira (10) envolve o pagamento de parte em dinheiro e, principalmente, parte em ações e representa a entrada da Aliansce Sonae (ALSO3), investidora da Box Delivery, como sócia minoritária da Rappi. O negócio está sujeito à aprovação do Cade.
“Provavelmente vamos ser uma das maiores empresas focadas em servir esse segmento de entregadores”, disse Sebastian Mejia, cofundador e presidente da Rappi, em entrevista à Bloomberg Línea. Ele não abriu números sobre o novo tamanho da startup colombiana no Brasil, mas diz que “ainda é muito cedo” e que há oportunidades para seguir crescendo no país, o que justifica a aposta no mercado.
Essa é a maior aquisição que a Rappi já fez e representa uma exceção, e não uma nova estratégia de crescimento inorgânico, segundo Mejia, que disse fusões e aquisições “não fazem parte do DNA”.
“Não temos construído a Rappi fazendo aquisições. Simplesmente não é a nossa história. Esta é a única maior aquisição”, disse Mejia.
Segundo o PitchBook, a Rappi comprou participações no Payit em fevereiro de 2019, na Riogrande, em maio de 2020, e adquiriu a Avocado, do Brasil, em junho de 2020. A empresa também teria feito uma joint venture com o Banorte em um acordo de US$ 15 milhões em junho de 2020, além de participar com um investimento na Série A de US$ 24 milhões na fintech Slope em abril de 2022.
A Box Delivery, fundada em 2016, é uma startup de entregas da chamada last mile (última milha), isto é, o transporte final de refeições (ou mercadorias) até a casa do consumidor. A empresa tem cerca de 150 mil entregadores cadastrados e atua em 250 cidades brasileiras, em 18 estados mais o Distrito Federal. Agora, os 450 funcionários da Box Delivery vão se somar aos cerca de 10,4 mil funcionários da Rappi.
A empresa realiza cerca de 1,7 milhão de entregas por mês e teve faturamento aproximado de R$ 200 milhões no ano passado.
Para o fundador da Box Delivery, Felipe Criniti, em entrevista à Bloomberg Línea, o acordo representa um próximo passo para manter a operação e buscar crescimento depois que a startup não conseguiu captar sua Série B em um momento em que o mercado se fechou para investimentos de empresas em estágio mais avançado.
Enquanto a Rappi opera em um modelo de atendimento direto ao consumidor e também tem sua remuneração vinda em parte das taxas dos estabelecimentos, a Box tem como clientes as empresas, tanto de e-commerce como de restaurantes e lanchonetes. A sua plataforma tem integrações com aplicativos de captura de pedido como o Rappi, além do concorrente iFood, entre outros pontos de venda como a Quiq, plataforma que une redes como Outback e McDonald’s. No ano passado, a startup gastou R$ 35 milhões para comprar a Vuxx, um marketplace de transporte de cargas de peso médio.
Aliansce como sócia
A Aliansce Sonae, que fez uma recente fusão com a brMalls, decidiu permanecer e passa a ser investidora da Rappi com uma participação minoritária. “Bem minoritária, não é relevante”, disse Renato Floh, diretor de digital e omnichannel da Aliansce Sonae, em entrevista à Bloomberg Línea.
Embora não divulgue valores, o executivo disse que a transação com a Rappi garantiu um retorno financeiro “bem interessante” para a Aliansce.
“Do ponto de vista financeiro, também foi um um movimento interessante. Eu não posso dar valores nem ordens de grandeza aqui. Mas foi interessante sobre dois aspectos, estratégico e financeiro”, disse Floh.
A Box recebeu US$ 5,6 milhões em um acordo liderado pela Aliansce Sonae em junho de 2021, dentro de uma estratégia de corporate venture capital (CVC), que, segundo a empresa, permitiu ampliar a capacidade operacional para entregas de mercadorias nas regiões do entorno dos shoppings no mesmo dia.
Segundo a Aliansce, desde o investimento, ou seja, em pouco menos de dois anos, a Box elevou o número de entregas de 400 mil para 1,7 milhão ao mês. O faturamento aumentou 222%, chegando a aproximadamente R$ 200 milhões em 2022.
A Box Delivery também apoiou a implementação de hubs logísticos em 20 shoppings da Aliansce.
“Nosso grande objetivo é apoiar varejistas, seja de alimentação ou de mercadorias, para que vendam o máximo possível independentemente do canal”, disse Floh, sobre o objetivo de garantir estrutura logística aos varejistas por meio de parcerias para entrega, para que possam entregar mais rápido as mercadorias, com custo menor por causa do volume.
Embora passe a ser sócia da Rappi, a Aliansce disse que pretende manter seu vínculo com o concorrente iFood, que tem hoje seis hubs em shoppings da Aliansce.
“Não temos vínculo com a Rappi do ponto de vista de exclusividade ou obrigação. No fim das contas [o iFood] é mais um player com que estamos nos relacionando. E estaríamos de qualquer forma até porque não somos relevantes como investidor lá dentro [da Rappi]”, disse.
“Nem esperamos que tenhamos essa obrigação também do outro lado. O iFood continua conosco e nós inclusive continuamos olhando outras alavancas de crescimento com eles. Se houver novas oportunidades para aprofundarmos, vamos fazer, além de criar novas formas com outros players.”
Box Delivery: fundador explica o negócio
“A Box chegou a um patamar para o qual o mundo de captação hoje está fechado. Tem dinheiro para pré-Seed, Seed, até uma Série A, mas, para o tamanho que seria o cheque que iríamos buscar [segundo o PitchBook, para esse estágio de captação são valores da ordem de US$ 10 milhões], o mercado está fechado. Ficar esperando uma nova janela não fazia sentido. Surgiu essa oportunidade, resolvemos aproveitar”, disse o fundador da Box Delivery.
Criniti contou que as conversas com a Rappi começaram no segundo semestre do ano passado, enquanto ele procurava uma nova captação. “Em 2022, nós partimos para a captação, mas o mercado se fechou e, consequentemente, não houve uma janela para nós aproveitarmos”, disse.
“A Box já estava em um momento de breakeven [equilíbrio entre receitas e despesas] e o dinheiro que captamos em 2021 era suficiente para manter as operações e continuar crescendo, mas eu entendi que era um ciclo que fazia sentido. E agora começar outro como executivo da Rappi”, disse Criniti.
“A empresa gera Ebitda, mas não alto o suficiente para crescer na mesma proporção que crescemos de 2020 para 2021 e para 2022. Precisamos de capital e fluxo de caixa″, disse o fundador da Box Delivery sobre a alternativa de dar o próximo passo com a Rappi. A startup deu um salto na pandemia, de 12 para 100 cidades, quando os restaurantes precisavam do delivery para sobreviver.
“Hoje nada muda, não temos uma visão do que vai ser o amanhã, eu nem sei o que tem lá do outro lado, eles não sabem o que tem aqui, acho que tudo é novo para todo mundo. Vamos sentar para entender quais são as estruturas e aí pensar em plano futuro de integração”, disse Criniti sobre sinergias.
Investidores da Rappi
A Rappi levantou em sua última rodada US$ 108,6 milhões em Série F com CrossWork, Opera Ventures e Atman Capital Partners em setembro de 2022, com valuation pre-money da empresa a US$ 5,25 bilhões. A Atman Capital Partners, do fundador da ONEVC, vendeu uma participação na empresa para um comprador não revelado. Antes disso, a FJ Labs também vendeu sua participação na empresa.
Hoje, o SoftBank é um dos investidores da startup, que também é apoiada por grandes nomes de venture capital do mundo como T.Rowe Price, Sequoia Capital, Tiger Global e Andreessen Horowitz.
– Colaborou Daniel Salazar Castellanos.
Fonte: Bloomberg Línea