Por Adriana Mattos
Os tão aguardados números sobre o desempenho da Americanas, após o anúncio do escândalo contábil em janeiro, começam a aparecer, e mostram tombo na operação digital, lojas perdendo vendas, saída de vendedores do “marketplace” e soma de caixa equivalente a um terço do ano passado.
Os dados são do relatório circunstanciado do administrador judicial da empresa, publicado ao mercado na noite de quarta-feira.
Chama a atenção a situação de caixa ainda bem difícil: se não fosse a entrada de recursos do financiamento da modalidade “DIP”, em fevereiro, a empresa fecharia o mês com pouco mais de R$ 210 milhões em caixa disponível. O comando da varejista já disse ao Pipeline, site de negócios do Valor, que deve recorrer a novo DIP de R$ 500 milhões, a ser novamente liberado por meio de empréstimos do trio de acionistas de referência.
Segundo o relatório do administrador judicial da Americanas, as vendas transacionadas pelo marketplace (o chamado “GMV”) caíram em fevereiro para menos da metade da média mensal de 2022, atingindo pouco menos de R$ 1,1 bilhão — cerca de R$ 400 milhões a menos que em janeiro. O montante inclui venda de itens da empresa e de lojistas parceiros. Em 2022, de março a dezembro, a média mensal foi de R$ 2,4 bilhões.
Apenas pelos vendedores (“sellers”) da empresa, foram R$ 286,7 milhões vendidos em fevereiro, e com queda no número total desses lojistas na plataforma — eram 127 mil em fevereiro, versus 149 mil em setembro de 2022.
Esse GMV dos lojistas no mês passado representa quase R$ 1 bilhão a menos que a cifra apurada num mês mais normalizado, como março de 2022, por exemplo, e R$ 800 milhões abaixo de abril e maio do ano passado. Consultorias acreditam que Mercado Livre, Amazon e Magazine Luiza avançaram sobre esse mercado que Americanas foi deixando escapar com a forte crise que abalou a rede.
As informações financeiras obtidas pelo administrador, o escritório de advocacia Zveiter, foram passadas à equipe pela própria rede. Ainda nesse relatório, a Americanas informou que, no dia 29 de março, divulgará apenas uma prévia não auditada das demonstrações financeiras de 2022.
Em nota enviada ao Valor na noite desta quinta-feira (23), a Americanas observou que as comparações realizadas com os dados do relatório da administração judicial “estão sob efeito de sazonalidade entre os meses comparados, número menor de dias úteis entre os meses citados e ainda pelo fato de a recuperação judicial ter suspendido a antecipação de recebíveis de cartão de crédito, com efeito direto no caixa”.
A companhia acrescentou, na nota, que a divulgação do relatório “foi requisitada pelo juízo da recuperação judicial para oferecer o máximo de informações e garantir transparência aos credores na tomada de decisão”. Afirmou também que o relatório foi construído com informações de diversas fontes e que os dados financeiros de janeiro e fevereiro ainda não estão auditados.
O relatório do administrador judicial mostra que o total de itens vendidos nas plataformas do grupo caiu de 2,8 milhões em janeiro para 1,2 milhão em fevereiro, um recuo de 54% — a média de 2022, de março a dezembro, foi de 4,4 milhões de itens. Nas lojas, a redução foi de 85,9 milhões de itens para 67,7 milhões no mesmo intervalo — a média de 2022 foi de 111 milhões.
No quarto trimestre do ano passado, a receita bruta das lojas e do site atingiram R$ 8,57 bilhões. Ao se incluir a unidade de importações, a soma alcança R$ 8,84 bilhões.
A receita bruta mensal da Americanas (lojas físicas e site) caiu 35% em fevereiro em relação a janeiro, para R$ 1,1 bilhão. Apenas no braço digital, o principal motor do grupo até a crise financeira, o recuo foi de 70%, com a receita bruta digital caindo de R$ 474,8 milhões em janeiro para R$ 141,4 milhões em fevereiro.
Em relação às unidades da Lojas Americanas a receita bruta caiu quase 22% sobre janeiro, para R$ 944 milhões.
Os números vão na contramão de declarações recentes da diretoria da Americanas, de que lojas físicas não vinham sofrendo queda nas vendas após início da crise, e que a retração havia sido sentida no on-line. A empresa disse nesta semana que a demanda nas lojas seguia “resiliente”.
Ao fim de fevereiro, o caixa final disponível na empresa, já incluindo entrada e saída de recursos, era de R$ 1,2 bilhão, 57% acima de janeiro, mas 30% abaixo de um mês mais normalizado, como março do ano passado.
Essa soma só foi melhor que a de janeiro porque fevereiro já inclui o aporte de R$ 1 bilhão do “DIP”, o financiamento de urgência feito à rede pelo trio de sócios de referência da empresa. Sem o DIP, a empresa provavelmente fecharia o mês com uma entrada superior a saída de caixa de R$ 210 milhões.
Em fevereiro, os saldos de disponibilidades de caixa, saldo bancário, aplicações, títulos e valores mobiliários somavam R$ 1,55 bilhão. Isso é apenas R$ 260 milhões acima de janeiro e equivale a um terço do valor médio mensal de 2022, em R$ 4,5 bilhões.
Fonte: Valor Econômico