Além das compras online, tivemos mudança para o banco digital, e a telemedicina, que agora tem apoio regulatório e adoção por parte do paciente e dos médicos
Por Gustavo Brigatto
Umas das frases mais faladas ao longo da pandemia – depois de “novo normal”, “fica em casa” e “você está no mudo” – foi que houve uma aceleração na transformação digital de pessoas e empresas. Para os mais otimistas, o salto chegaria a uma década. Mas o número mais preciso é de cerca de 3 anos. Essa, pelo menos, é a leitura feita pelo pessoal do Atlantico, fundo de investimento early stage liderado por Julio Vasconcellos.
Na edição mais recente do Latin America Digital Transformation Report, seu estudo anual sobre tendências e transformação digital, a gestora mostra, por exemplo, que o comércio eletrônico no Brasil está hoje em um patamar que só seria alcançado daqui 2,5 anos, representando na casa de 7% de tudo que o que se vende no país. E isso depois de ter recuado um pouco, já que no auge da pandemia a fatia passou de dois dígitos.
“Além das compras online, tivemos mudança para o banco digital, e a telemedicina, que agora tem apoio regulatório e adoção por parte do paciente e dos médicos”, diz Julio. Em entrevista ao Startups, ele explica que o movimento detectado na América Latina difere do que acontece nos EUA e na Europa. No hemisfério norte, depois do boom registrado durante a pandemia, houve uma volta aos hábitos anteriores, e o uso de serviços digitais retornou ao seu padrão de crescimento histórico.
A explicação para esse sobe e desce é que, como boa parte da população já conhecia e estava habituada ao uso de tecnologia antes, quando veio o relaxamento das medidas de isolamento, não havia uma mudança de hábitos para acontecer.
Já na América Latina, como a penetração era baixa antes da pandemia, muita gente teve contato pela primeira vez com os serviços online. E quem nunca comeu melado, quando come, se lambuza. “Quem usa banco online e telemedicina uma vez, não pega mais fila, não quer voltar ao que era antes”, avalia Julio.
Seguindo adiante, ele diz não saber a velocidade com que o avanço da adoção vai acontecer, mas a tendência é que seja um ritmo que ele considera mais natural, ou próximo ao que vinha sendo registrado pré-pandemia.
Transformação digital
Com 200 páginas de extensão, o estudo traz dados sobre o mercado de venture capital na região, trabalho remoto e uma seção especial que analisa o desenvolvimento de cripto e Web3, as fintechs e a digitalização das pequenas empresas na América Latina.
Sobre o mercado de venture capital, a leitura é que o momento é de cautela, mas que as perspectivas são otimistas. É que apesar de o volume de investimentos ter caído cerca de 40% nos primeiros 6 meses de 2022 na comparação com o mesmo período do ano passado, ainda há capital disponível para investimento.
Além disso, o nível atual continua acima de qualquer outro ano na história, o que reforça as perspectivas positivas. A avaliação é que a região tem um potencial de geração de riqueza que pode chegar a US$ 1 trilhão na medida que as companhias digitais cresçam e passem a representar uma fatia mais da economia. Hoje esse percentual está em 1,5% para a região e 3% para o Brasil. No EUA, ele chega a 50%. Na China, é 20%.
State of venture
Um fato interessante chama a atenção na avaliação do mercado de venture capita. Os investidores estrangeiros estão tirando dinheiro da região em uma velocidade maior que os investidores locais. Entre janeiro e junho, foram 58% menos verdinhas gringas que irrigaram os cofres das startups latinas. Já os investidores da região desaceleraram a assinatura de cheques em 34%.
Com menos disponibilidade de capital, as empresas precisaram se adaptar. E isso passa por esticar o caixa. Sendo assim, a maioria das empresas passou a buscar pelo menos 1,5 ano de recursos para sobreviver, uma ampliação de cerca de 6 meses nos planos. Já quem já olhava um horizonte de 1,5 ano de reserva, passou a pensar em até 30 meses.
Para chegar lá, diversas medidas foram tomadas. No topo da lista está o congelamento das contratações, seguido de redução nos gastos com marketing, foco em unit economics e renegociações e mudanças de fornecedores. Já as demissões, ficaram apenas em 5º lugar.
Em 80% dos casos, os cortes ficaram abaixo de 10% do quadro. Já em 15%, o patamar foi de 10% a 25% do pessoal. A área mais afetada foi de operações, seguida de vendas, pessoas, produto, tecnologia, serviços aos clientes, finanças e, por último, marketing.
Fonte: Startups