Vacinação, transformação digital e reabertura do varejo sopram a favor do franchising em 2021; saiba como se preparar para 2022
Por Claudia Rolli
Se 2020 foi um ano de desafios e incertezas, com a crise causada pelo coronavírus, 2021 mostra ser o de retomada do crescimento e recuperação dos negócios. O avanço da vacinação, a transformação digital e a volta de atividades de varejo e empresas deram fôlego ao franchising, após o faturamento recuar 10,5% em 2020 e chegar a R$ 167,19 bilhões, nível próximo ao de 2017.
Foi a primeira vez que o desempenho financeiro das redes ficou abaixo da inflação (4,52%, pelo IPCA), um reflexo das restrições impostas ao funcionamento do comércio por quase um terço do ano, dependendo da região. Entre abril e junho, o faturamento despencou até 40% sobre 2019.
No 2º trimestre de 2021, o vento mudou. O setor reagiu e faturou 48,4% sobre igual período do ano anterior, segundo dados da Associação Brasileira de Franchising (ABF). Comparado a 2019, no pré-pandemia, já que a base de 2020 é mais fraca, o resultado foi de -4,6% no 2º trimestre de 2021. Apesar do número negativo, a desaceleração no ritmo de queda é comemorada.
“O franchising permite ao empreendedor trabalhar em rede, em um ambiente colaborativo, adotar soluções inovadoras e identificar tendências, novos formatos, além de criar canais próprios de vendas e de conectar suas marcas a marketplaces”, diz André Friedheim, presidente da ABF. “A forma como redes e franqueados reagiram à crise, para manter empregos e lojas abertas, foi e é fundamental para a retomada dos negócios e abre perspectivas positivas para 2021.”
Segmentos como casa e construção e saúde e bem-estar, beneficiados ou por serem considerados essenciais durante o isolamento social ou pelo trabalho remoto, cresceram na pandemia e continuam em expansão.
E os demais já ganham força. O consumo reage, a confiança do consumidor melhora e a demanda reprimida impulsiona as vendas, na avaliação do economista Claudio Felisoni, presidente do Ibevar, instituto que reúne executivos de varejo. Sinais disso foram vistos nos indicadores de vendas das redes em datas comemorativas.
Medidas como a redução de até 70% dos salários e o pagamento do auxílio emergencial (em 2020 com valor superior ao de 2021) impulsionaram o franchising em diferentes regiões, o que explica o faturamento das franquias ter menor retração no Norte (-3,9%) e no Nordeste (-6,8%).
No Sudeste, caiu 14,5% – acima do patamar do país (10,5%). “Nas duas regiões com menores quedas, seis em cada dez famílias receberam, em média, R$ 880 de auxílio emergencial, o que sustentou o consumo”, diz Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo.
Retomada inclui novos espaços em shoppings e fortalecimento do varejo físico
A mudança de hábitos do consumidor, o fim das restrições e o comportamento de autoindulgência devem impulsionar o franchising, que projeta crescer 8% em 2021, segundo a ABF.
A previsão supera a expectativa de aumento do PIB – ao redor de 5%, pelo Boletim Focus, do Banco Central – e do varejo, de 6%, segundo consultores.
A tendência é que um sistema híbrido ganhe força, com vendas presenciais e digitais, avalia Maurício Morgado, coordenador do Centro de Excelência em Varejo da Fundação Getulio Vargas (FGVcev).
“Multicanais de vendas e atendimento, como delivery e WhatsApp, e novas formas de pagamento online vão continuar em expansão. Mas o físico se mantém. Shoppings podem rever seu papel – o mix de lojas funcionar como ponto de retirada e exposição de marcas. Mas se engana quem pensa que espaços assim vão acabar”, afirma Morgado.
Prova disso é que, apesar do crescimento do e-commerce, há um movimento de abertura de espaços. A associação de shoppings prevê sete novos centros no país até dezembro de 2021, além de dois shoppings lançados no 1º semestre. Só a rede BrMalls anunciou a inauguração de 240 lojas até dezembro.
Ainda há pontos de atenção, porém, que podem afetar a economia, como incertezas políticas, crise hídrica e de energia, inflação crescente e efeitos de variantes do coronavírus, com possíveis ondas de isolamento, destaca o economista Gesner Oliveira, sócio da consultoria GO Associados. Mas a previsão é de recuperação dos setores de serviços e varejo: “O sentimento de compensação aquece as vendas de itens que já são incluídos na cesta de consumo, como artigos de luxo, e não só os essenciais”.
Lojas seguem cliente até cidades pequenas, praias e interior
Com o desafio de atender digitalmente o consumidor, as redes identificaram novos bolsões de consumo em cidades menores, antes não atendidas por elas.
“Assim como dark kitchens ganharam espaço na alimentação, surgiram dark stores, sem atendimento presencial, com marcas que usam um espaço físico como um hub de logística para chegar a certas regiões”, afirma André Friedheim, presidente da ABF.
De um lado, ganha o cliente, com prazos de entrega menores e melhor atendimento. Do outro, o empreendedor, que barateia o custo do frete, com esses “minicentros” de distribuição.
Em 2020, as redes ampliaram a presença de suas marcas de forma mais expressiva nas regiões Norte (7,7%) e Centro-Oeste (6,8%).
A lógica da expansão mudou. Se antes o critério era ter lojas em cidades com 100 mil a 150 mil habitantes, as redes passaram a olhar onde está o consumidor – na praia, no interior ou em pequenos municípios.
O franchising está presente em cerca de 50% dos municípios, o que mostra seu potencial para crescer. “O fortalecimento das cidades menores já é uma realidade e mostrou que podemos elevar a qualidade de vida morando no interior sem sacrificar a profissão. Isto vem chamando a atenção das redes, pois é uma oportunidade de expansão, tirando o peso da concentração, até de concorrentes”, diz Maurício Hiromi Matsumoto, consultor do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
Movimentos como a interiorização também permitiram maior abertura de lojas. Depois de o número de unidades cair 2,6% em 2020 sobre 2019, com 4.160 fechadas, o franchising encerrou o 2º trimestre de 2021 com saldo positivo de 2,2% (resultado entre lojas abertas e fechadas).
O total de marcas sofreu retração de 8,6% e passou de 2.918 em 2019 para 2.668 em 2020. O número médio de unidades por marca foi de 55,2 para 58,8, uma alta tida como sinal de amadurecimento do franchising.
“A crise selecionou quem fica e quem deixa de existir, o que tende a fortalecer algumas franqueadoras. Em algum momento, vão aproveitar a oportunidade de incorporar outras. Esse movimento permite que o modelo fique mais forte e seguro para quem quer investir, gerar renda, realizar um sonho e pertencer a uma comunidade”, diz Matsumoto.
Alternativa ao desemprego, microfranquia tende à expansão
Negócios com menor investimento ganharam a atenção, principalmente de quem escolheu empreender como alternativa ao desemprego.
Microfranquias na área de serviços, alimentação e educação e com formato home-based se destacaram e tendem a se expandir com o desenvolvimento de mercados e segmentos pouco explorados.
Entre eles, reaproveitamento de produtos e aluguel de itens que causam menos impacto ambiental. O tema, por sinal, ganha espaço com a criação de um comitê na ABF para discutir práticas de ESG (governança ambiental, social e corporativa).
“Com inflação crescente e juros menores, investir o dinheiro da rescisão de contrato ou do FGTS em uma franquia que exige menos capital é uma opção cada vez mais procurada”, diz Claudio Felisoni, do Ibevar.
Áreas em condomínios, hospitais e parques passaram a ser exploradas, com formatos menores, para chegar ao consumidor.
Estratégias de marketing digital, diminuição do custo da mercadoria e redução de insumos permitiram às empresas ter menos fornecedores e fazer promoções em dias de menor demanda.
Microfranquias em outras áreas também encontraram formas, que vão além do digital, de se aproximar do público. “Malinhas de itens de moda estão disponíveis, os funcionários passaram a telefonar, e não só enviar mensagens aos clientes, e clubes de assinatura surgem com mais produtos. O consumo consciente vai impulsionar os negócios”, avalia Marcelo Cherto, sócio do Grupo Cherto.
Emprego x treinamento
O nível de emprego se recupera de forma gradual, após o setor perder quase 100 mil vagas em 2020 – retração de 7,3% sobre 2019.
As admissões superaram as demissões no 2º trimestre de 2020, quando 1,29 milhão de pessoas estavam contratadas no franchising. A expectativa é ampliar esse total em 5% até o final de 2021, segundo a ABF.
“Algumas redes até enfrentam dificuldades na contratação de profissionais especializados e na área de tecnologia. Mas não temos um cenário de escassez de mão de obra, como o de redes de fast-food nos EUA”, diz Marcelo Cherto, sócio do Grupo Cherto.
O treinamento das equipes está no radar como uma medida necessária para o curto prazo, na esteira da retomada das vendas, segundo pesquisa da ABF.
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Fonte: PEGN