A Justiça precisa validar a decisão, e, se for contrária a ela, pode determinar a falência da rede
Por Adriana Mattos
Numa estratégia definida em menos de 24 horas para tentar salvar o negócio, a varejista Ricardo Eletro aprovou na quinta-feira o seu plano de recuperação judicial após retirar os bancos do conjunto de credores atingidos pela proposta, apurou o Valor com três fontes.
Apesar desse novo passo, ainda há risco. A Justiça precisa validar a decisão, e, se for contrária a ela, pode determinar a falência da rede. O grupo não tem mais lojas e o site, neste domingo, estava em manutenção, passando por “melhorias”.
A varejista entrou com pedido de recuperação judicial em agosto de 2020. Pelos últimos números, ela vem operando com prejuízo e as vendas até junho caíam 98%, reflexo do próprio encolhimento do negócio e da crise sanitária.
A decisão de excluir os bancos – Itaú Unibanco, Bradesco e Santander – foi tomada porque a empresa foi informada por representantes dos bancos, na quarta-feira, véspera da assembleia, que eles não apoiariam a proposta. Na quinta, os bancos votaram contra o plano – a Machado Meyer Advogados representou as instituições na votação, apurou o Valor.
“Antes disso, a rede já não vinha recebendo retornos favoráveis dos bancos sobre as propostas. [A rejeição] não foi exatamente uma surpresa. Tentou-se negociar ajustes, mas os contatos não avançaram”, diz uma fonte.
Na quinta-feira passada, ocorreu a assembleia de credores e, como forma de buscar uma alternativa à negativa – e numa decisão tomada em poucas horas – a rede incluiu a cláusula que excluía as instituições do plano. Os debenturistas estão na classe três de credores.
Pelo proposto pela cadeia aos bancos, antes da votação, ficariam válidos os termos dos contratos de emissão das debêntures, de 2017, com vencimento em 2024. “É longe do ideal, mas era um jeito de salvar meses de conversas e não adiar mais a votação”, disse uma fonte.
Se o juiz da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, Leonardo dos Santos, for contrário à exclusão dos bancos – e também não existir, no mínimo, um terço de votos favoráveis ao plano na classe três – pode ser determinada a falência.
A rede estuda entrar com recurso se isso ocorrer e analisa alguma estratégia jurídica para isso, apurou o Valor. Caso a Justiça considere que a exclusão é aceitável, o plano é aprovado.
Essas contas estavam sendo feitas pelos advogados e pela administração judicial no fim de semana. O resultado da assembleia deve ser enviado hoje à 1ª Vara. A contagem geral preliminar dos votos na sexta indicava apoio de 75% dos credores, sem incluir os bancos.
Os três bancos e a Geribá Participações (que comprou boa parte desses papéis anos atrás) são debenturistas de uma dívida que, em valores atuais, atinge R$ 1,7 bilhão. O endividamento total superava em maio os R$ 4,6 bilhões – no conjunto, bancos e Geribá são os maiores credores da rede.
No material a ser enviado à Justiça, haverá dois cenários: o resultado da assembleia com e sem os votos dos bancos e da Geribá.
“Os bancos já foram provisionando a perda. As debêntures são conversíveis em ações, mas a rede tem patrimônio negativo e está em crise há anos”, diz um representante próximo às instituições. Desde 2017, a rede vem renegociando dívidas e alongando passivos com fornecedores e bancos.
A decisão de excluir os bancos, como forma de buscar uma saída às pressas, diz uma fonte, foi tomada com base no artigo 45 (parágrafo 3) da lei que regula as recuperações judiciais, de 2005. O artigo define que o credor que não é afetado pelo plano não terá seu voto contabilizado para fins de verificação de quórum. “Foi uma assembleia bem tensa, e a ideia de adicionar o artigo acabou sendo uma forma para avançar com o pagamento da dívida trabalhista”, diz uma fonte.
Segundo documentos do plano, a Máquina de Vendas Brasil (dona da Ricardo Eletro) é controlada pela MV Participações, que por sua vez tem 90,3% de suas ações nas mãos do fundo Reag 90 FIP Multiestrategia. Na descrição do fundo, não aparecem cotistas e ele tem data de abertura de junho de 2020. Procurada, a Reag, gestora do fundo, disse que opera dentro das normas vigentes, tem registro na CVM e não iria comentar o caso da rede.
O plano aprovado tem alguma piora das condições da primeira versão, em relação às opções de deságio dos valores devidos – que chegam a 99,9% – e sobre o excedente de caixa liberado para pagar credores. Na primeira versão, 100% do valor que superar determinado caixa mínimo (usado para a empresa operar) iria para esse pagamento. Isso caiu para 50% em certas classes. Pela análise prévia da votação, a maioria dos fornecedores apoiou o texto.
Procurados, Machado Meyer, Bradesco e Santander não se manifestaram. O Itaú Unibanco não comenta casos específicos.
Fonte: Valor Econômico